06 ago, 2021 - 18:00 • Pedro Mesquita João Malheiro
Veja também:
O coordenador da" task-force" da vacinação contra a Covid-19, vice-almirante Gouveia e Melo, mostra-se, em entrevista à Renascença, favorável à vacinação da faixa etária dos 12 aos 15 anos.
Gouveia e Melo apela a que as autoridades de saúde tomem uma decisão "rapidamente".
O responsável da "task-force" volta a referir os 85% de população vacinada como o número-chave para a imunidade de grupo e questiona a necessidade da administração de uma terceira dose, como tem sido sugerido pela Pfizer e a Moderna.
Consegue compreender a indefinição, neste momento, para não se estar a vacinar os jovens dos 12 aos 15 anos?
Nós estamos a acabar de vacinar os jovens mais velhos do que dos 12 aos 15, mas, mal acabemos de vacinar esses jovens, é preciso vacinar, na minha modesta opinião, a faixa etária mais nova, o mais rapidamente possível, para retirar espaço de manobra ao vírus.
Ou seja, já não há tempo para mais estudos e estudos até uma decisão? Já vimos o Presidente da República irritado com esta demora. É mesmo momento de aprovar a vacinção entre os 12 e os 15?
Como em tudo na vida, há um tempo de prudência, de reflexão, e, depois, há um tempo de decisão. Nós já chegamos ao tempo de decisão.
Deve ser agora?
Tem de ser nos próximos dias, mas muito rapidamente.
Consegue compreender, então, o incómodo que está a sentir o Presidente da República?
Eu não posso comentar, como é evidente, as palavras do Presidente da República. Eu posso é comentar o incómodo que todos nós sentimos quando vemos aproximar o período que temos de decidir e a decisão tem de existir.
Há dias, a Renascença falou com o Diretor-Regional da Saúde da Madeira, onde já se avança na vacinação dos 12 aos 15, e ele criticava a lentidão das decisões no Continente. A frase era "os vírus adoram países com muitos peritos". É o que sente que está a acontecer no Continente?
O que sinto é que há alguma cautela e isso protege o público, em geral. No entanto, a cautela não pode ser eterna. A cautela tem que depois dar uma decisão e essa decisão tem de ser o máximo esclarecida possível, para ser boa. Essa decisão está a acontecer neste momento. Tenho a certeza absoluta que, enquanto falamos, há pessoas que a estão a tomar. Portanto, a decisão vai ser revelada dentro de muito pouco tempo e nós vamos continuar com a nossa vida.
Está a dizer que neste momento já está a ser preparada pela DGS a autorização das vacinas dos 12 aos 15?
Eu estou a dizer é que vai haver uma decisão. Se sim ou se não, não posso adiantar, porque é a DGS que vai dizer.
Não conseguiria compreender que fosse não?
Eu não sou um técnico de saúde, mas tudo o que leio face à epidemia e ao recrudescimento da epidemia, tenho uma forte inclinação pela vacinação. O vírus é muito oportunista e, com a variante Delta, a imunidade de grupo já não faz sentido aos 70% da população, mas a uma percentagem mais elevada que obriga a incluir a vacinação das crianças.
E por outro lado, não há maneira de alguma população fugir ao vírus durante uma pandemia, por isso as crianças vão ser atingidas ou pelo vírus ou pela vacina. Qual é que é a melhor?
Por aquilo que está a perceber, onde é que situa a verdadeira imunidade de grupo?
No mínimo, essa imunidade de grupo só se atingirá a partir dos 85%. Portanto, nós precisamos de vacinar uma grande parte dos nossos jovens para atingir a imunidade.
E vamos ter, então, os 85% quando?
Os 70% estamos a alcançá-los, neste momento, como estava previsto. 85% só atingiremos, em primeiras doses, entre fins de agosto, e início de setembro.
Ainda a propósito da vacinação, tem havido algumas queixas dos maiores de 18 anos que têm dificuldades em conseguir vacinar-se e que sentem que estão a ser ultrapassados pelos jovens com 16 e 17 anos. O que é lhes responde?
Nestas faixas etárias entre os 16 e os 25 anos, têm todos praticamente o mesmo risco. Portanto, nós consideramos que é uma grande faixa etária. Estamos a vacinar o mais possível de forma paralela a toda essa faixa etária.
Tem-se levantado a questão da necessidade de uma terceira dose. A França avançou para essa terceira dose para as pessoas "mais idosas e mais frágeis",segundo Macron. O vice-almirante para já não vê evidências científicas, mas isso também se pode comparar ao caso da vacinação dos 12 aos 15. Devia haver ou não terceira dose, sendo certo que já há muitos surtos de pessoas idosas que foram vacinas e mesmo assim contrairam a Covid?
Eu não confirmo esses dados, nem científicos ne estatísticos, da necessidade de uma terceira dose e de haver muitos surtos.
Números da DGS falavam em 51 surtos.
Mas 51 surtos em quantos milhares de pessoas que tiveram em contacto com o vírus? Isso é que é importante. Há quatro meses atrás, quando o processo de vacinação estava no início e essa faixa etária ainda estava muito pouco vacinada, a percentagem de morte era elevadíssima e agora é praticamente inexistente. A vacina tem um grande efeito. Mas a vacina não protege a 100%, protege na ordem dos 96%. Muitas pessoas podem estar a morrer por outras razões, estando também infetadas. Não quer dizer que morreram por infeção.
Mas não havendo evidência científica da necessidade da terceira toma, também não é propriamente prejudicial. Seria quase uma defesa para situações mais críticas.
Sim, nessa perspetiva sim. Agora, o que é curioso e que também é um facto, as duas vacinas da mRNA subiram os seus preços no momento em que se disse que se ia dar uma terceira toma às populações mais idosas.
Já apareceu a Pfizer a defender uma terceira toma, depois foi a Moderna. Acha que há razões comerciais para essas empresas estarem a tentar a insistir numa terceira toma?
Razões comerciais existem sempre.
Sim, mas acha que é esse o leitmotif?
Não estou a dizer que seja unicamente esse, mas existe e faz parte da equação.
Não há prova científica ainda da necessidade da terceira dose. Muita da prova que se faz ou da expetativa é a medição de anticorpos das pessoas. Quando não há anticorpos, dizem que é preciso uma terceira dose. E depois vão ter que dar uma quarta dose, uma quinta dose, etc... Porquê? Porque naturalmente, os anticorpos desaparecem quando não estão em contacto com o vírus. O que o corpo faz é ter a memória da defesa do vírus nas células B e nas células C do corpo. E só quando entra outra vez em contacto com o vírus é que essas células produzem anticorpos.
Por isso, se só estivermos a medir anticorpos, podemos ter falsos resultados. Porque pensamos que a pessoa já não têm defesas, quando têm todas as defesas. Para que a pessoa esteja sempre com anticorpos estaríamos sempre a injetar novas doses, o que não significa que estaria a melhorar a defesa da pessoa. Pode não fazer mal, mas pode também não ser necessário.