Siga-nos no Whatsapp
A+ / A-

ENTREVISTA LAURENTINO GOMES

Historiador brasileiro diz que falta pedido de desculpas de Portugal pela escravatura

14 ago, 2021 - 14:41 • Lusa

“Eu sei que o Presidente Marcelo Rebelo de Sousa, que eu respeito muito, não considera essa hipótese”, afirmou Laurentino Gomes.

A+ / A-

O historiador brasileiro Laurentino Gomes considera que Portugal deveria pedir desculpas formais pela escravatura e tráfico negreiro aos povos africanos, na sequência do que fizeram outros países europeus e antigas colónias como o Brasil ou os Estados Unidos.

“Um pedido de perdão em relação à escravatura seria muito bom seria muito benéfico para Portugal porque seria libertador, seria um passo importante de reconciliação” com a sua própria história, afirmou à Lusa Laurentino Gomes, autor do livro “Escravidão”, agora editado em Portugal.

“Eu sei que o Presidente Marcelo Rebelo de Sousa, que eu respeito muito, não considera essa hipótese”, acrescentou o historiador.

Lamentando que Portugal não faça também o seu encontro com o passado esclavagista, à semelhança do que fez o Brasil, Gomes recordou que “o Presidente [brasileiro] Luiz Inácio Lula da Silva foi ao Senegal e pediu formalmente desculpas pela escravidão em nome da elite brasileira, na ilha de Gore”, um dos portos de escravos mais simbólicos de África e que já teve cerimónias semelhantes de outros políticos.

Portugal “deveria pedir desculpas” pela escravatura, mas isso “não significa que se deva seguir chicoteando, é apenas uma questão de enfrentar o passado, as dores do passado e reconhecer que houve injustiças grandes”, porque “o perdão é o primeiro passo para a reconciliação”, afirmou o autor, recordando que Lisboa tem hoje um “interesse estratégico” em relação a África que seria favorecido com uma decisão desse tipo.

“Mas eu percebo assim que existe um certo temor em reconhecer as culpas do passado por causa das consequências futuras para Portugal em ter que indemnizar os países africanos”, admitiu o autor.

Ao contrário do Brasil, que tem problemas raciais por resolver na sua estrutura social, Laurentino Gomes considerou que a situação em Portugal é menos relevante, também por razões históricas.

“Embora tenha existido escravidão em Portugal e a população negra em Portugal seja importante, não se compara ao Brasil”. Por isso, “a escravidão foi basicamente brasileira e a dor e consequência da escravidão é mais brasileira do que a portuguesa”.

Nesse sentido, o debate histórico sobre a escravatura tem mais relevo no Brasil enquanto, em Portugal, essa discussão tem uma dimensão mais historiográfica.

“Nós temos um clima de acerto de contas, de enfrentamento a respeito da escravidão, porque é uma dor mais nossa do que a portuguesa”, afirmou o autor brasileiro.

Apesar disso, Portugal deve fomentar mais estudos sobre a história da escravatura e levar esse debate à praça pública, porque “nada é mais libertador para um povo do que olhar a sua história de uma forma um pouco mais madura e de uma forma um pouco mais correta: não adianta construir mitos e ilusões porque isso complica muito a jornada em relação ao futuro”, avisou Laurentino Gomes.

A escravatura portuguesa era mais marcada pela miscigenação, por comparação com outros países, como os Estados Unidos da América (EUA), mas isso não significa que existisse menos violência.

Esse passado de “assimilação” étnica e cultural representa “uma riqueza importante, o que não significa que a escravidão no Brasil tem sido melhor do que os Estados Unidos”.

Hoje, no século XXI, “chegou esse momento de fazer essa reflexão” e aceitar o que nós fizemos “no passado”. “Brasil e Portugal foram os dois maiores nos impérios escravista do hemisfério ocidental na história moderna”.

O livro “Escravidão”, editado pela Porto Editora, contém vários episódios sobre a história da escravatura no Brasil, com documentos sobre o tráfico negreiro e as memórias do comércio de pessoas no Atlântico Sul e em Portugal.

Comentários
Tem 1500 caracteres disponíveis
Todos os campos são de preenchimento obrigatório.

Termos e Condições Todos os comentários são mediados, pelo que a sua publicação pode demorar algum tempo. Os comentários enviados devem cumprir os critérios de publicação estabelecidos pela direcção de Informação da Renascença: não violar os princípios fundamentais dos Direitos do Homem; não ofender o bom nome de terceiros; não conter acusações sobre a vida privada de terceiros; não conter linguagem imprópria. Os comentários que desrespeitarem estes pontos não serão publicados.

  • Cidadao
    15 ago, 2021 Lisboa 19:42
    "Um pedido de perdão em relação à escravatura seria muito bom seria muito benéfico para Portugal..." Era benéfico para Portugal em quê? Na avalanche de pedidos de indemnização de todo o mundo e arredores, que se ia seguir a esse pedido de desculpas-não sei-do-quê? Até parece que a escravatura não existia já no Brasil e em África, antes de Portugal lá chegar. Nós, nem tínhamos de reduzir ninguém à escravatura: limitavamo-nos a comprar escravos aos naturais, que eles sim, capturavam e faziam escravos nas tribos inferiores. Desculpas em prol duma "reconciliação"? Ganhe juízo, homem. E espere deitado por essas "desculpas", que sentado vai arranjar calos.
  • Ivo Pestana
    15 ago, 2021 Madeira 13:09
    Não podemos passar a vida com desculpas. O que é preciso é combater a xenofobia e as desigualdades. O Brasil não respeita os de cor escura, não é exemplo. Verdade ou mentira?
  • Nuno Pereira
    15 ago, 2021 São João da Madeira 00:20
    Caro colega, ganhe juízo. Da história aprendem-se lições. Não se pedem desculpas.
  • Bruno
    14 ago, 2021 aqui 15:24
    O senhor historiador devia saber as pessoas são mais filhas do seu tempo do que filhas dos seus pais.

Destaques V+