30 ago, 2021 - 16:19 • Redação, com Lusa
Uma parte da Lei do Cibercrime foi esta segunda-feira declarada inconstitucional. A decisão do Tribunal Constitucional (TC) foi tomada por unanimidade.
Em causa está uma norma que permitiria ao Ministério Público (MP) o acesso a comunicações eletrónicas ou emails sem autorização de um juiz de instrução criminal.
Num comunicado lido pelo presidente do TC, João Caupers, os juízes entenderam que as normas resultariam numa “restrição dos direitos fundamentais à inviolabilidade da correspondência e das comunicações e à proteção dos dados pessoais no âmbito da utilização da informática, enquanto manifestações específicas do direito à reserva de intimidade da vida privada, em termos lesivos do princípio da personalidade”.
Paralelamente, a decisão, elaborada pela conselheira Mariana Canotilho, indicou ainda estar em causa uma “violação do princípio da reserva de juiz e das garantias constitucionais de defesa” na esfera do processo penal.
O Tribunal Constitucional apreciou o pedido de fiscalização abstrata preventiva da constitucionalidade de parte do artigo 17.º da Lei do Cibercrime, apresentado pelo Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, no dia 4 de agosto deste ano.
Marcelo Rebelo de Sousa pretendeu, assim, "clarificar o modelo de apreensão de correio eletrónico e da respetiva validação judicial".
O chefe de Estado começa por referir que “o legislador aproveitou a oportunidade para alterar normas não diretamente visadas pela diretiva” europeia.
Lei do cibercrime
Presidente da República lembra que “a apreensão de(...)
É o caso da alteração ao artigo 17.º da Lei do Cibercrime, que, segundo o Presidente, aproveita “o ensejo para ajustar o artigo cujo teor tem gerado conflitos jurisprudenciais que prejudicam a economia processual e geram dúvidas desnecessárias. Este ajustamento tem como propósito clarificar o modelo de apreensão de correio eletrónico e da respetiva validação judicial”.
Marcelo Rebelo de Sousa lembra que “a apreensão de mensagens de correio eletrónico ou de natureza similar está sujeita a um regime autónomo, que vigora em paralelo com o regime da apreensão de correspondência previsto no Código de Processo Penal”.
Mas a lei aprovada em julho pelo parlamento prevê que o Ministério Público pode ordenar ou validar a apreensão de comunicação "sem prévio controlo do juiz de instrução criminal".
Uma alteração, conclui o Presidente no pedido enviado ao TC, que “não constitui um mero ‘ajustamento’, mas a uma mudança substancial no paradigma de acesso ao conteúdo das comunicações eletrónicas, admitindo-se que esse acesso caiba, em primeira linha, ao Ministério Público, que só posteriormente o apresenta ao juiz”.
A proposta do Governo sobre a Lei do Cibercrime que facilita o acesso do Ministério Público a comunicações privadas foi aprovada com os votos de PS, Bloco de Esquerda e PAN.
Contudo, José Magalhães, deputado do PS, congratula-se com o chumbo e diz que este dá agora oportunidade para "pôr ordem no pântano".
"Temos agora oportunidade de pôr ordem no pântano. O que acontece é que o digital não é só o presente, é o presente e o futuro e a obtenção de prova digital vai ser cada vez mais importante. Não pode a norma constitucional, que garante aos cidadãos a máxima proteção, decorrente da autorização judicial, ser espezinhada no que diz respeito às autorizações de acesso à correspondência privada, seja ela qual for", afirma.
[Notícia atualizada às 19h30]