29 out, 2021 - 16:57 • Filipe d'Avillez , Pedro Mesquita
“É pior a emenda que o soneto”, diz o constitucionalista Paulo Otero sobre a nova proposta da lei da eutanásia, que vai ser votada na quinta-feira, 4 de novembro, na Assembleia da República.
Depois de uma versão inicial ter sido chumbada, por causa da indefinição do termo “lesão definitiva de gravidade extrema”, os deputados proponentes modificaram o texto, na esperança de poder ultrapassar esse obstáculo.
A nova versão, a que a Renascença teve acesso, inclui um artigo só com definições onde esse conceito é explicado em mais detalhe.
Assim, na alínea E do artigo 2.º, lê-se. “Lesão definitiva de gravidade extrema: lesão grave, definitiva e amplamente incapacitante que coloca a pessoa em situação de dependência de terceiro ou de apoio tecnológico para a realização das atividades elementares da vida diária, existindo certeza ou probabilidade muito elevada de que tais limitações venham a persistir no tempo sem possibilidade de cura ou de melhoria significativa”.
Para Paulo Otero “o texto agora apresentado ainda é, em termos jurídicos e em termos constitucionais, mais imperfeito que o anterior que o Tribunal Constitucional disse ser inconstitucional.”
“Em primeiro lugar a terminologia utilizada é formalmente incorreta. É pleonástica, é redundante, repete na definição o que se pretende definir”, diz, dando como exemplo o facto de a definição de “Lesão definitiva de gravidade extrema” começar precisamente com “lesão grave, definitiva”.
Eutanásia
O novo texto da proposta de lei da eutanásia inclu(...)
De resto, a definição é “perigosamente excessiva e também inadequada, violando o princípio da proporcionalidade”, afirma o constitucionalista, indicando como exemplo o facto de, segundo este texto um doente em hemodialise ou uma vítima de AVC que tenha perdido a capacidade de andar sozinha, estando por isso dependente de terceiros. “Por outras palavras, a definição diz mais do que aquilo que deveria dizer”, afirma.
Por fim, Paulo Otero critica o facto de a lei apelar a “um juízo de certeza ou de probabilidade que no domínio medico-científico nunca é um dado adquirido. Aquilo que hoje é incurável amanhã pode ser curado e por isso mesmo a noção padece de um erro grosseiro no âmbito das ciências médicas.”
Estas três razões levam o especialista a manifestar-se incrédulo quanto à possibilidade de a lei passar caso seja aprovada no Parlamento e posteriormente analisada pelo Tribunal Constitucional.
“Não acredito, porque esta densificação do que é uma lesão definitiva de gravidade extrema é incorreta, é formalmente indevida e é excessivamente ampla e inadequada”, diz.
[Notícia corrigida às 19h42]