10 dez, 2021 - 11:50
Muito se tem dito e escrito sobre a vacinação anti-Covid nas crianças dos 5 aos 11 anos. Num assunto técnico (e apenas político quanto à decisão e timing), alguns organismos corporativos não se coíbem de instalar ruído e contribuir para aumentar a confusão entre os pais e cidadãos, como a Ordem dos Médicos ou a Ordem dos Enfermeiros (esta, então, nem se compreende porque opina sobre um assunto que não é da sua competência. Enfermeiros, por muito que devam ser admirados, não são médicos nem cientistas de laboratório!). Politizou-se e, pior, partidarizou-se a questão. A mal das crianças.
Já dei muitas vezes a minha opinião: sou a favor da vacinação. “Sem espinhas”. Por um lado, porque, apesar de o número de casos “moderados” ou “graves” nas crianças não serem frequentes, eles existem e podem vir a determinar internamentos e lesões mais graves, e prolongar-se pelo “long-covid syndrome” que se manifesta por episódios ondulatórios de cansaço, falta de memória, etc.
Depois, porque as crianças são, neste momento, as principais transmissoras, o que era de supor uma vez que o “muro” tem sido construído com a população adulta e a excelente taxa de vacinação a que os portugueses sempre nos habituaram... mas ainda há brechas que importa colmatar, até para permitir às crianças conviverem mais e com normalidade.
Covid-19
Leia aqui o que diz o parecer dos peritos da Comis(...)
Sendo verdade que o vírus pode colonizar um vacinado, também é verdade que a capacidade de replicação é muito pequena e a de transmissão de enorme carga viral idem, e as crianças podem e devem estar com os mais velhos e com as pessoas doentes, sendo que estas, por mais doses que façam, podem não desenvolver uma imunidade adequada, dado que têm as suas funções orgânicas, entre as quais o sistema imunitário, muito depauperadas.
Finalmente, é altura de acabar com a “cena” de: “O Manel está com covid, vai a turma toda para casa”. Se o Manel está com covid e os outros estão vacinados, só serão testados se tiverem sintomas, e só irão para casa se acusarem positivo para covid (ou estiverem doentes, como já acontecia antes com qualquer doença).
Os efeitos secundários da vacina de que se fala, como as pericardites e miocardites, não são maiores do que na população em geral, só que estes são registados (por estarem associados à vacinação) e os outros não, ou andam “tresmalhados”.
Finalmente, é altura de a DGS vir a terreno dizer, “preto no branco”, que a vacina não causa infertilidade futura nas meninas ou outros efeitos secundários propalados pelos “anti-vax” nas redes sociais. Basta de mentiras, muitas vezes apoiadas através do silêncio ou conivência das tais “vozes avulsas” com agendas próprias, como as Ordens ou o Conselho de Ética.
Creio que com este passo, tal como por exemplo em Espanha, continuaremos a ser líderes na vacinação. Quem deseja o contrário?
Mário Cordeiro é pediatra, professor aposentado de pediatria e de saúde pública da Faculdade de Ciências Médicas de Lisboa. Foi presidente da Secção de Pediatria Social e Comunitária e da European Society for Social Paediatrics, fundador e presidente da Associação para a Promoção da Segurança Infantil e de muitas outras organizações relacionadas com a promoção da saúde e dos direitos das crianças e adolescentes. Membro das Comissões Nacionais de Saúde da Mulher e da Criança, Direitos da Criança e Boas Práticas em Lares. Dirigiu o Observatório Nacional de Saúde.