26 fev, 2022 - 13:00 • Liliana Carona
Na Rua Frei Joaquim Santa Rosa de Viterbo, em Viseu, próximo de um centro de saúde, estão as instalações da Liga Portuguesa Contra o Cancro, onde sob a sua alçada, funciona o movimento Vencer e Viver.
É ali que, todas as quintas-feiras de manhã, o som da campainha se faz ouvir com mais insistência, no horário de atendimento às mulheres mastectomizadas que procuram o movimento Vencer e Viver.
Felisbela Batista tem 75 anos. A comerciante aposentada é uma das voluntárias que abre a porta. Tinha 53 anos quando também ela teve de ser submetida a uma mastectomia. Hoje diz “estar tudo bem” e “atende as pessoas que tiraram o peito para dar apoio e o material que precisam”.
“Damos o melhor que podemos dar, levam o que precisam e estamos aqui para servir as mulheres quando vêm do hospital. O hospital aqui em Viseu oferece sempre a primeira prótese e o primeiro soutien e damos carinho e apoio e uma palavra amiga”, garante Felisbela assumindo que o cancro é “um trauma para o resto da vida, estamos sempre com medo que apareça noutro sítio.”
Outra das voluntárias do Movimento Vencer e Viver, em Viseu, é Conceição Videira, 62 anos, antiga escriturária, que numa espécie de provador, vai ajudando as mulheres mastectomizadas a encontrar a melhor solução estética e de conforto.
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“É muito importante, eu sou mastectomizada bilateralmente. Uma pessoa sem peito fica desconfortável e estes produtos ajudam”, observa, registando que há dois tipos de próteses: uma mais leve e outra mais pesada. Cada uma se ajusta como se sente melhor. Os preços dos produtos disponíveis variam, entre os 10 e os 50 euros e se não puderem pagar a Liga Portuguesa Contra o Cancro também ajuda, mas todo o material que vendemos aqui é muito mais barato do que lá fora”.
E há outro tipo de artigos para quem ainda se encontra no processo de tratamento. Conceição Videira revela que “há lenços, perucas, turbantes”.
A voluntária tenta sempre transmitir o seu exemplo “para que se sintam encorajadas, porque isto é uma situação muito má, a pessoa cai mesmo”.
Conceição é otimista, mas sem esconder o peso que a doença lhe deixou. “Ainda hoje não gosto de olhar para mim, ainda recordo a primeira vez que me deram banho depois da mastectomia e me disseram para eu não olhar para o meu peito. Quando tive o meu primeiro tumor, aos 40 anos, foi quando nasceu a minha filha, é uma situação muito complicada”, salienta.
Nessa altura, Conceição recebeu uma chamada da Liga Portuguesa Contra o Cancro. “Telefonaram-me para me informar que iam abrir este movimento em Viseu e perguntaram-me se podia ser elemento desse movimento”, recorda, enaltecendo que “havendo este serviço em Viseu, as mulheres não precisam ir a Coimbra ou Porto”.
Voluntária, mas também utente deste serviço, Dulce Fernandes, 71 anos, diagnosticada com cancro da mama há 21 anos, escolhe um novo soutien, frente ao espelho e descreve o impacto de uma mastectomia.
“Eu, por acaso, não fiz reconstrução, mas já me arrependi, porque tenho dias em que o desconforto de usar a prótese é tão grande, é uma prótese exterior, o nosso peito está dentro da pele, chego ao final do dia, o soutien magoa, é um desconforto total, e estas próteses têm de evoluir mais”, nota, sublinhando que até a posição do braço é diferente, porque aqui não tem carne”, aponta.
Professora do primeiro ciclo, aposentada, Dulce elogia o apoio do marido. “Nunca me escondi, sempre me despi à frente do meu marido”. Antero Picado, 77 anos, iluminam-se os olhos ao admirar a coragem da mulher com quem está casado há mais de 30 anos. “Se sentimos a dor delas, imaginem elas que sofrem muito mais. Acompanhei-a sempre e hei de acompanhar sempre”, conclui.
Os soutiens trazem uma bolsa, onde Dulce Fernandes coloca a nova prótese. “Vemos o peito e verificamos o tamanho da prótese, experimentando até acertar e saímos com outro conforto e estética. Este gabinete garante privacidade e a mulher pode estar aqui o tempo que quiser, para experimentar, tem de se sentir bem”, ressalva.
A preocupação estética é um acompanhamento que não encontram nas unidades hospitalares e que as mulheres mastectomizadas agradecem. “Nem disto, nem de outros temas como a sexualidade, nos hospitais não nos falam de nada disto”, lamenta Dulce Fernandes.
Vencer e Viver é um movimento de entreajuda que visa o apoio a todas as mulheres, familiares e amigos desde o momento em que é diagnosticado um cancro da mama.
Teve origem em 1953, nos EUA, por iniciativa de Teresa Lasser, uma mulher a quem foi diagnosticado um cancro da mama e que iniciou visitas hospitalares a outras mulheres também sujeitas ao mesmo tipo de diagnóstico.
Em Portugal, o movimento é promovido e financiado pela Liga Portuguesa Contra o Cancro, através dos seus Núcleos Regionais e teve início em 1981.