26 mar, 2022 - 08:00 • Liliana Monteiro
O diagnóstico está há muito feito, “pior que o défice de magistrados é o défice de funcionários da justiça, as coisas não têm seguimento e trabalha-se muito com espírito de missão e de colaboração que se pede para além do razoável e exigível”, afirma o recém-empossado vice-Procurador-Geral da República.
As últimas contas apontam para um défice de 150 a 200 magistrados o que leva naturalmente à acumulação de serviço nas investigações e não só.
Faltam também peritos que ajudem a descodificar e a tornar mais transparente a nova e cada vez mais complexa criminalidade.
“Há défice nas perícias, a Procuradoria-Geral da República (PGR) tem um Núcleo de assessoria técnica com 17 especialistas em áreas de economia, gestão, contabilidade, informática, urbanismo e precisaríamos muito mais”, revela Carlos Adérito Teixeira que aponta também uma importante falta de recursos à Polícia Judiciária, PSP e GNR (órgãos de Polícia Criminal) com quem o Ministério Público trabalha tantas vezes.
Ainda nestas declarações à margem do XII Congresso dos Magistrados do Ministério Público a decorrer em Vilamoura, no Algarve, o Vice PGR mostra-se bastante preocupado com o futuro na justiça, “temo que se possa gerar uma avalanche de prescrições e isso será um indício de rotura, isso já aconteceu em 1996/ 98 com crimes ligados a fundos comunitários e aí houve prescrições, como foi o caso UGT”, salientando que o sector ciclicamente vai passando por momentos destes.
Quando se espera que possa acontecer tal avalanche de prescrições? “Espero que não ocorra”, o número dois da Procuradoria-Geral da República revelou que tanto a PGR como o Conselho Superior da Magistratura (CSMP) têm apostado numa tentativa de redistribuição de serviço. “Temos de perceber que um magistrado de Mértola não tem o mesmo serviço que um Departamento de Investigação Penal (DIAP) de Lisboa ou Sintra, Porto, etc... Precisamos sempre de redistribuir serviço ou pessoas”.
Carlos Adérito Teixeira levantou dúvidas sobre as utilidades muitas vezes da separação de processos e deu mesmo o exemplo do caso de João Rendeiro condenado em três processos relacionados com o colapso do BPP, onde a justiça determinou que o arguido subtraiu 13,61 milhões de euros.
“É muito difícil saber onde se deve fracionar (os processos) há casos onde não correu bem, casos de Vale e Azevedo, João Rendeiro, há três processos, são três condenações e as coisas complicam-se porque não há uma pena única, mas sim condenações parcelares que agora podem gerar problemas”. Recorde-se que das três condenações apenas uma transitou em julgado, nessa o antigo banqueiro terá de cumprir cinco anos e oito meses de prisão.
As autoridades sul-africanas receberam, esta sexta-feira, o processo de extradição de João Rendeiro.
Em particular na criminalidade financeira Carlos Adérito Teixeira defende a suspensão provisória como uma solução que por vezes traz mais benefícios.
“Torna-se mais eficaz, talvez seja melhor, implica a reparação do dano, a imposição de medidas ou injunções e às vezes até altas, por exemplo no DCIAP o valor que se terá recuperado nos últimos 10 anos, foram mais de 180 milhões de euros, não sei se isso seria possível caso fosse para julgamento", concluiu.