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Direito à reparação. Indústria eletrónica tem de "assumir compromissos de durabilidade"

27 mai, 2022 - 19:49 • Fábio Monteiro

A adaptação das empresas portuguesas a um paradigma de “fabricar para durar” pode não ser fácil. “Geralmente, tudo que seja reparações acarreta triagens, muito trabalho manual, processos que não são standardizados e têm custos mais elevados”, aponta Ana Carvalho, docente no Instituto Superior Técnico. Já Gonçalo Lobo Xavier, diretor-geral da Associação Portuguesa de Empresas de Distribuição (APED), diz que faltam “artistas” das reparações em Portugal.

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O fabrico de equipamentos eletrónicos reparáveis, a disponibilização de peças sobresselentes e de manuais tem de ser uma das prioridades das empresas portuguesas nos próximos anos, tendo em conta as mudanças que podem chegar, em breve, com o pacote legislativo do “direito à reparação” que será discutido em Bruxelas durante o verão.

Em declarações à Renascença, Gonçalo Lobo Xavier, diretor-geral da Associação Portuguesa de Empresas de Distribuição (APED), diz que os distribuidores e “produtores de marca própria” têm mesmo de “assumir responsabilidades do ponto de vista da reparibilidade e garantia dos produtos”.

“A indústria tem também aqui um papel muito importante. Tem de assumir compromissos de durabilidade. E aí é preciso que as peças para reparação sejam disponibilizadas pelos fabricantes, sejam eles nacionais ou importadores ou mandatários, por um período mínimo que seja interessante, do ponto de vista do consumidor, exigir a sua reparação, num eventual problema dos equipamentos”, explica.

A adaptação das empresas portuguesas ao paradigma de “fabricar para durar”, contudo, pode não ser fácil, alerta Ana Carvalho, coordenadora da formação “Economia Circular - Metodologias para a Transição nas Empresas” e docente no Instituto Superior Técnico de Lisboa.

“Nós não temos sistemas preparados para a questão da reparação - por vários motivos. Os designs dos produtos não acompanham essa possibilidade. Para que isso seja possível, tem de haver um ecodesign, os produtos que saem no mercado tem que começar a sair de outra forma, produzidos já a pensar no fim de vida. E isso é uma realidade que pouco acontece”, diz à Renascença.

Segunda a especialista, muitas empresas não estão interessadas em avançar no sentido de criar uma economia circular. Porquê? Não é viável financeiramente. “Geralmente, tudo que seja reparações acarreta triagens, muito trabalho manual, processos que não são standardizados e têm custos mais elevados”.

Por isso mesmo, Ana Carvalho aponta: “Enquanto não existir efetivamente legislação que obrigue as empresas a mudar para de paradigma.”

A reinvenção (necessária)

Em 2019, a APED foi uma das entidades que emitiu um parecer relativo a quatro projetos de lei – do PCP, PAN, PEV e BE -que pretendiam aplicar medidas no campo da obsolescência programada, desenho ecológico e direito à reparação. Na época, a associação manifestou-se contra as iniciativas propostas.

“Quaisquer medidas neste âmbito que se venham a desenhar a nível nacional irão conduzir à criação de barreiras à livre circulação bens no espaço europeu e fragmentação do mercado, colocando as empresas nacionais numa situação de desvantagem competitiva face a outros mercados”, argumentou no parecer.

Segundo Gonçalo Lobo Xavier, a APED, em 2019, manifestou algumas “preocupações” relativamente a medidas que já “estavam a ser discutidas ao nível europeu”.

“Muitas vezes, em Portugal, a tentação de se querer ir mais longe [que a Europa] por questões de discussão política e de alguma notoriedade de certos grupos parlamentares. Para terem algum destaque nos jornais, muitas vezes lançam medidas que não têm adesão ou aderência à realidade”, diz.

Oportunidade?

A resposta de Portugal às mudanças impostas pelo pacote legislativo em discussão em Bruxelas podem ser uma oportunidade para criar negócios e novos postos de trabalho – no campo da reparação.

Em Portugal, “temos uma escassez de recursos humanos para tratar destas matérias. O consumidor sabe que é cada vez mais difícil encontrar artistas para a reparação de alguns equipamentos”, diz Gonçalo Lobo Xavier.

Ana Carvalho vê também com bons olhos o mesmo cenário. Até porque “muitas das vezes não faz sentido uma empresa fazer este tipo de negócio, não tem a competência”. Aquelas que optem por oferecer serviços de reparação terão de repensar o seu modelo de negócio.

“As empresas passam de um modelo de negócio em que vendem produtos para vender serviços. E nesse modelo aí sim, por autoiniciativa delas, começam a fazer os produtos de forma a quem consigam fazer a manutenção dos mesmos. E repará-los”, aponta.

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