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Guerra na Ucrânia

Do reencontro com o avô à nova vida em França. Família de refugiados deixa Portugal

03 jun, 2022 - 09:56 • Filipa Ribeiro

A família de Natalya fechou um novo ciclo. Após dois meses em Portugal, voltou a fazer malas para tentar a sorte em Estrasburgo. Com eles, desta vez, já levaram o avô que conseguiu sair da Ucrânia nas últimas semanas.

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Depois de dois meses de encontros, a família de Natalya e de Tatyana Ignateva não conseguiu abrir a porta de casa para receber a Renascença. Mudaram-se com as crianças e o avô para Estrasburgo, em França, deixando Lisboa no dia 25 de maio – dez dias depois de o avô da família, Sergiy, ter chegado a Portugal.

É na cidade francesa junto à fronteira com a Alemanha que estão os amigos que tinham em Odessa e a madrinha de Natalya. A família está a viver com as três crianças (Dmytro, Diana e Olessya) e com as duas cadelas (Santa e Uma) num hotel. “Agora a família está feliz, por estar junta e segura”, conta Natalya.

A ida para França fez com que a família desse vários passos para trás e voltasse a repetir um ciclo já vivido em Portugal: estão novamente a passar por um processo de registo, para depois voltar a procurar casa, trabalho e escola para as crianças.

“É muito cedo para falar em adaptação. Estamos com amigos ucranianos e esperamos que isso nos ajude a adaptar à vida em França”, diz Natalya, avançando que a família já está a receber ajudas do Governo francês.

“Em Estrasburgo, temos os nossos amigos de Odessa”

Em Estrasburgo, a família sente-se mais aconchegada pelos amigos e família que fugiram de Odessa e que vivem na cidade francesa há várias semanas. Apesar de estarem novamente a viver numa bolha com contactos e amigos próximos, a família continua a sentir falta de casa – Odessa, na Ucrânia. De acordo com Natalya, “três meses não são suficientes para que alguém se consiga adaptar à mudança de vida”.

Cem dias depois de terem deixado a Ucrânia, a família não consegue prever como vai estar daqui a uns meses. “Não sabemos o que vai acontecer amanhã ou se as nossas casas vão sobreviver”, diz Natalya.

“Sentimos falta da Ucrânia e queremos ir para casa”

Três meses depois de deixarem a cidade onde cresceram, as saudades começam a apertar. Mas a incerteza sobre quando vai ser o fim da guerra, faz com que esta família não faça planos por muito tempo. “Talvez vivamos em França, talvez voltemos para casa... a guerra não nos ajuda a fazer planos por muito tempo”, lamenta Natalya.

A mãe de Diana, Dmytro e Olessya diz que as crianças estão felizes em Estrasburgo por terem a família reunida. O pai e marido de Natalya continua a trabalhar em alto mar. As cadelas – Santa e Uma – também se estão adaptar bem à nova cidade: “comem, dormem e passeiam várias vezes por dia”, diz Natalya.

A avó Tatyana voltou a ter a companhia do marido Sergiyv que, quase três meses depois do início da guerra, conseguiu sair do país.

Da linha de combate para Portugal. Reencontro com o avô

“Estava em casa muito triste”, começa por contar Sergyiv, que ainda não esqueceu o toque das sirenes que tocavam e das bombas que caíam constantemente em Odessa.

O avô da família tem 57 anos e era médico.

Quando a família saiu da Ucrânia, foi obrigado a ficar pela lei marcial. Durante três meses, foi um dos nomes na lista de militares das forças ucranianas. Não se quis alongar sobre o que viveu em Odessa. Infelizmente, ou felizmente, passou por problemas de saúde nos últimos meses na Ucrânia – problemas que lhe garantiram um atestado médico e uma autorização para sair da Ucrânia. Sergiy foi operado ao coração e, com o estado de saúde a deteriorar-se, foi internado no hospital de Odessa, no início do mês de maio. Os médicos acabaram por lhe passar um atestado que lhe permitia sair da Ucrânia.

Assim que conseguiu o atestado, Sergiyv meteu pés ao caminho para vir ter com a família a Portugal. Em apenas três dias, conseguiu deixar Odessa, passar a fronteira e chegar a Lisboa. O reencontro com a família aconteceu no dia 15 de maio.

“Cheguei a Portugal, normalmente. Estou feliz por estar novamente com a minha família”

Para trás, Sergiy deixou a casa e os bens que a família mantém em Odessa. “A nossa casa estava intacta”, diz Sergiy, recordando o rasto de destruição na cidade que descreve como “perturbador”.

De acordo com o avô, as pessoas que ficaram em Odessa “viviam com medo dos ataques que aconteciam de minuto a minuto”. Ainda assim, apesar de ter assistido à destruição, Sergiyv tem esperança de poder voltar ao seu lar.

Muitas famílias não se conseguem adaptar a Portugal

Volodymyr Nikulin é ucraniano e vive em Portugal há 22 anos. Tem dado apoio a várias famílias refugiadas e foi o principal apoio de Natalya em Portugal. Uma semana depois de a família ter ido embora de Lisboa, ainda não consegue compreender o porquê de terem desistido de Portugal.

“Muitas famílias conseguem adaptar-se, mas outras não conseguem mentalizar-se e não estão preparadas para esta vida. Neste caso, não consegui compreender o porquê de terem ido embora, porque os filhos deles já estavam seguros”, diz Volodymyr, recordando que Dmytro, Olessya e Diana estavam já integrados em escolas junto à casa onde viviam.

De acordo com este apoio da família, Natalya e os filhos ainda procuraram uma outra casa em Portugal, com mais espaço para os cães. “Estiveram à procura durante três dias”, diz. Foi durante o curto período em que procuravam casa que foram contactados pelos amigos e família que estava em Estrasburgo e a decisão de sair de Portugal foi tomada rapidamente.

Volodymur Nikulin reconhece que muitos ucranianos não se estão a adaptar e estão a optar por viajar pra outros países ou até mesmo para a Ucrânia.

“Os portugueses sabem receber bem os refugiados”

Volodymyr afasta a possibilidade de a culpa ser dos portugueses. Vive em Portugal há mais de 20 anos e reconhece que o país sabe acolher todos os que chegam.

“Os portugueses recebem bem, trabalho com refugiados que estão espalhados por todo o país e o acolhimento é bem feito em todas as partes”, conta Volodymyr. Ainda assim, este ucraniano reconhece que a adaptação pode ser mais difícil nas grandes cidades. Nos meios mais pequenos, fora de Lisboa e do Porto, é dada mais atenção aos casos dos refugiados, diz Volodymyr, dando o exemplo da cidade de Coimbra, que visitou recentemente.

“No interior, há mais capacidade para integrar as pessoas”, explica este voluntário, que não esconde a tristeza por a família de Natalya ter deixado o país.

Natalya, Tatyana, Sergiy, Dmytro, Diana e Olessya estão a começar do zero, pela segunda vez. O novo capítulo vai ser escrito em língua francesa ainda com a incerteza de se algum dia vai ser possível terminar a viagem em casa, em Odessa.

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