09 jun, 2022 - 01:12 • Lusa
O acesso à cirurgia oncológica degradou-se entre 2017 e 2020, com cada vez mais intervenções a ultrapassarem os tempos máximos de resposta garantidos, concluiu o Tribunal de Contas (TdC) numa auditoria divulgada esta quinta-feira.
Os auditores constataram que, naquele período, o crescimento da atividade cirúrgica no Serviço Nacional de Saúde (4,8%) “não foi suficiente” para fazer face ao acréscimo da procura (6%), assinalando também “assimetrias geográficas significativas”.
No acesso a rastreios oncológicos para os cancros da mama, do colo do útero e do cólon e reto, “não foram atingidos os objetivos de cobertura geográfica e populacional” previstos para 2020.
Na área da cirurgia oncológica, a pandemia de covid-19 teve como principal impacto a diminuição de necessidades cirúrgicas.
Segundo o TdC, as novas inscrições de utentes para a realização de cirurgia diminuíram 4,3% em 2020, face ao ano anterior, o que se sentiu particularmente em abril (41,2%) e em maio (35%).
“Também os rastreios oncológicos foram fortemente afetados pela pandemia em 2020”, lê-se no documento, em que se recorda a suspensão dos rastreios especialmente em março, abril e maio.
Especialista alerta
Vítor Rodrigues foi presidente da Liga Portuguesa (...)
“As taxas de adesão dos utentes mantiveram-se estabilizadas, face a anos anteriores, pelo que a diminuição da atividade resultou da menor oferta do SNS”, de acordo com o TdC: “O número de utentes convidados a realizar rastreio em 2020, face a 2019, foi inferior em 46% no cancro da mama, em 54% no cancro do colo do útero e em 38% no cancro do cólon e reto”.
O Tribunal recomendou, entre outros procedimentos, a adoção de um plano para quantificar e calendarizar a recuperação da atividade não realizada.
Durante a Auditoria de Acesso a Cuidados de Saúde Oncológicos no SNS 2017 - 2020 foram identificadas falhas relacionadas com “o não desenvolvimento ou a não substituição atempada” dos sistemas de informação de suporte.
“Assim, permanecem por apurar e monitorizar vários indicadores relativos ao acesso a cuidados oncológicos, nomeadamente os tempos e listas de espera nas primeiras consultas hospitalares na doença oncológica, bem como noutros cuidados de saúde essenciais neste contexto, como exames de diagnóstico e terapêutica específicos. No acesso à cirurgia oncológica, verificou-se uma tendência de degradação dos resultados entre 2017 e 2020, com uma cada vez maior proporção das cirurgias a ultrapassar os Tempos Máximos de Resposta Garantidos”, refere-se no relatório.
A auditoria teve por objetivo examinar se o SNS garantiu, entre 2017 e 2020, o acesso atempado a cuidados de saúde na área oncológica, incluindo durante a disrupção no funcionamento em 2020, o primeiro ano da resposta à pandemia da doença Covid-19.
A dificuldade no acesso aos rastreios oncológicos durante a pandemia vai ter efeitos na mortalidade daqui a três, quatro ou cinco anos, admite o antigo presidente da Liga Portuguesa contra o Cancro (LPCC). O alerta é feito na Renascença por Vítor Rodrigues.
Segundo o atual presidente do Núcleo do Centro da LPCC, "existem bastantes pessoas que começaram a chegar aos hospitais, nalguns casos, com metástases que, vulgarmente, não existiam. Se falha a simbiose entre diagnóstico precoce e tratamento precoce, a consequência não é boa e vai levar a alguma diminuição da sobrevivência e a algum aumento da mortalidade".