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Há trabalhadores a fazer "turnos seguidos". Soflusa garante que segurança não está em causa

30 jun, 2022 - 15:50 • Ana Carrilho

O coordenador da Comissão de Trabalhadores (CT) diz que há quem faça dois e até três turnos e esteja quase um mês sem folgas, pondo em causa a segurança. À Renascença, a Soflusa garante que todos os trabalhadores fazem trabalho suplementar voluntariamente.

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Há vários meses que a ligação entre o Barreiro e Lisboa, garantida pela Soflusa, se fazia com menos carreiras, mas com cortes pontuais num ou noutro dia da semana. Nos últimos dois meses, as supressões passaram a ser sistemáticas, em todos os dias úteis.

Dos avisos semanais, a empresa passou para os quinzenais e em junho, um valeu para todo o mês. Em média, oito-nove carreiras diárias em cada sentido.

No entanto, esta semana a situação agravou-se: passou para 12 ou 13 carreiras suprimidas, abrangendo a manhã, logo a seguir ao almoço e a tarde/fim do dia.

As supressões devem-se à falta de maquinistas, diz à Renascença o coordenador da Comissão de Trabalhadores, e confirma também a Soflusa.

Paulo Rodrigues diz que esta é uma situação para a qual alertou a Administração e que se arrasta há cerca de quatro anos, com alguns dos maquinistas a atingir a idade de reforma.

O quadro devia ter 24 maquinistas práticos de 1ª classe, mas atualmente, a empresa tem que fazer as carreiras apenas com 13-14.

Ao pedido de esclarecimentos feito pela Renascença, o gabinete da presidente da Transtejo/Soflusa, Marina Ferreira, respondeu que neste momento há cinco maquinistas com baixa médica e faltam outros cinco devido à cessação dos contratos de trabalho em 2021.

“A necessidade foi acomodada no Mapa de Pessoal de 2022, aprovado pelo Ministério do Ambiente e da Ação Climática”. Refere ainda que o pedido de recrutamento de maquinistas feito no dia 2 de maio, aguarda autorização do Ministério das Finanças.

Apesar da empresa ter no site um anúncio de recrutamento, até avançar com a seleção, vai tardar algum tempo para que os novos eventuais contratados assumam as funções em pleno, já que precisam de fazer uma formação de quatro semanas.

Soflusa admite recurso ao trabalho extra, mas garante que a segurança nunca foi posta em causa

Para conseguir cumprir o máximo de carreiras, sem, no entanto, o garantir integralmente, a empresa tem recorrido ao trabalho suplementar.

O coordenador da CT diz que há trabalhadores a fazer dois e até três turnos seguidos. Ou seja, a trabalhar dezasseis ou mais de vinte horas seguidas e muitos, sem folgas durante um mês. Afirma ainda que há vários casos em que as 150 horas de trabalhado suplementar anuais permitidas por lei já foram ultrapassadas.

Paulo Rodrigues alerta que, apesar dos esforços dos maquinistas, ao fim de tantas horas de trabalho e sem tempo de descanso suficiente, a segurança a bordo pode ser posta em causa.

“E se há trabalhadores que não se importam e até se oferecem para fazer esse trabalho extraordinário para ganharem mais dinheiro ao fim do mês, também há um assédio constante da empresa sobre outros para aderirem a esta prática”.

Situação que a Soflusa nega: “a segurança do transporte público fluvial de passageiros nunca foi posta em causa”. Acrescenta ainda que, por lei, o trabalho suplementar é uma forma de fazer face a situações excecionais com que as empresas se deparam e que “no caso da Soflusa, tem obtido o acolhimento dos trabalhadores, de forma voluntária, quando implementado”.

Alegadas dívidas relativas aos “variáveis” agravam descontentamento

Paulo Rodrigues diz que há uma “situação anímica” dos trabalhadores, face à falta de pagamento de verbas relativas a subsídios diversos, horas extraordinárias, trabalho em dia de descanso, os chamados “variáveis”. “Uma situação de fraude em que incorreram várias empresas de transportes, desde 1996 e a Soflusa é uma delas”.

A questão foi para tribunal. No Tribunal da Relação a empresa perdeu, recorreu para o Supremo Tribunal de Justiça, que confirmou a primeira decisão, obrigando a Soflusa a pagar os montantes em dívida aos trabalhadores. Segundo Paulo Rodrigues, oscilam entre 5 e 30 mil euros.

No entanto, o coordenador da Comissão de Trabalhadores acusa a administração de querer “dividir para reinar”, ao fazer um acordo com um dos sindicatos. “Paga a alguns trabalhadores e a outros, não. O que está a criar alguma revolta e tumulto entre os trabalhadores”.

À Renascença, o gabinete de Marina Ferreira diz apenas que os processos judiciais intentados estão em diferentes estágios, “alguns aguardam decisão, outros terminaram”. A empresa garante ainda que tanto a Transtejo como a Soflusa pagaram todas as quantias em que foram condenadas em sede de sentença transitada em julgado.

Greves vão continuar

Paulo Rodrigues garante que reconhece os esforços da administração que, depois da intervenção da troika, recebeu uma empresa completamente descapitalizada, com barcos parados por falta de manutenção. “Isso foi ultrapassado, temos barcos a operar, mas falta-nos a massa humana e sobretudo, trabalhadores motivados”.

Apesar das críticas à empresa, reconhece que depende das autorizações, nomeadamente do Ministério das Finanças, para fazer novas contratações. E para aumentar os salários. À semelhança do que acontece com outras empresas pública o aumento proposto para este ano é de 0,9%, o que os sindicatos consideram inaceitável.

Em reação, os trabalhadores responderam com vários dias de greves parciais, que provocaram forte impacto junto dos passageiros, já que o Tribunal Arbitral determinou apenas a realização da primeira carreira do dia em cada sentido (cerca das 5 da manhã). Na véspera de Santo António, a greve foi 24h, a um domingo, “para penalizar o menos possível quem trabalha”, justifica Paulo Rodrigues.

Mas o coordenador da CT não tem dúvidas que as greves na Soflusa vão continuar.

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