30 jul, 2022 - 04:54 • Lusa
Numa altura em que se mantêm os constrangimentos nas urgências de obstetrícia, a Associação Portuguesa pelos Direitos da Mulher na Gravidez e Parto escreve uma carta aberta dirigida à ministra da Saúde, Marta Temido, onde considera "difícil de encarar" a situação da obstetrícia, no país, aludindo à morte de dois bebés, um deles ma semana passada, no hospital de Santarém, e outro em junho, no Hospital das Caldas da Rainha, no distrito de Leiria.
A associação afirma que na passada quarta-feira "após consultar o portal do Serviço Nacional de Saúde (SNS) para saber a que unidade de saúde se devia dirigir, uma mulher em trabalho de parto percorreu mais de cem km até Santarém, após verificar que o serviço de urgência de Ginecologia e Obstetrícia do Hospital de Abrantes, na sua área de residência, estava fechada. À chegada, constatou-se que o bebé se encontrava morto. Em junho passado, uma grávida perdeu o bebé, após ter sido atendida no Hospital das Caldas da Rainha, onde, no momento, a urgência de obstetrícia se encontrava encerrada".
Dois casos que levaram a alertar a possibilidade de consulta no portal online do SNS da informação relativa aos serviços de urgência de ginecologia/obstetrícia e bloco de partos "não resolve as insuficiências no atendimento nesta especialidade", afirma a Associação, defendendo que o problema "só se resolve com uma rede real e efetiva de serviços de saúde pública e de qualidade, que garanta o acesso de todas as pessoas a cuidados de saúde de excelência".
Sublinhando que as grávidas e respetivas famílias precisam do livre acesso aos cuidados de saúde a que têm direito, a Associação lamenta que atualmente, "nem o acesso aos cuidados de saúde esteja garantido" e que em Portugal se morra "no parto tanto como há 38 anos atrás".
"Quantas mulheres e bebés terão ainda de morrer, senhora Ministra? Por ser agosto, pelas férias, por falta de médicos e meios? Pelo desinvestimento sucessivo no nosso Serviço Nacional de Saúde? Pelas desculpas de uma pandemia que já passou, mas que serviu e continua a servir para adiar e cancelar consultas, exames de diagnóstico e ilibar os decisores políticos de olhar de frente para o colapso que se está a desenrolar diante dos nossos olhos", questiona a associação na carta divulgada esta sexta-feira.
Aludindo às diferenças entre as grávidas que podem recorrer a serviços de saúde privados e aquelas que não têm possibilidades de o fazer a associação faz notar que "o fosso entre as que podem e as que não podem alarga-se, com consequências graves para a populações mais vulneráveis, e nada se faz".
Considerando que a Obstetrícia em Portugal enfrenta "um problema estrutural e profundo, que não se vai resolver quando os obstetras voltarem de férias", a Associação recomenda ao Governo a mobilização imediata de meios pelo Estado, à semelhança do que aconteceu durante a pandemia, para resolver a crise nas urgências de obstetrícia, "evitando mais situações potencialmente fatais na assistência às parturientes, seja através do reforço da contratação por entidades públicas seja pela articulação - temporária e com caráter provisório - com os serviços privados, para atendimento das populações sem acesso a urgências públicas de obstetrícia".