26 ago, 2022 - 12:41 • Lusa
A Inspeção Geral da Saúde (IGAS) admite que a médica de ginecologia/obstetrícia que assistiu a grávida que em junho perdeu o bebé no Hospital das Caldas da Rainha pode ter "violado os deveres funcionais” e recomendou um processo disciplinar.
Em comunicado, a IGAS diz que, devido à natureza do vínculo laboral da médica (contrato individual de trabalho) não tem essa competência e , por isso, recomendou ao Conselho de Administração do Centro Hospitalar do Oeste (CHO) E.P.E. a abertura de um processo disciplinar.
Contudo, explica:
"A peritagem médica realizada pelo médico especialista nomeado pela IGAS não conclui, de forma clara e segura, pela existência de possível nexo de causalidade entre a atuação da médica assistente hospitalar e o desfecho que veio a ocorrer."
A Inspeção Geral da Saúde diz ainda que abriu um processo disciplinar à trabalhadora que, de início, entre as 01:00 e as 01:15 do dia 09 de junho, recusou a inscrição da grávida “sem ter solicitado ao médico em funções como ‘chefe de banco’ a avaliação do estado clínico da utente”.
“A mesma só seria admitida e observada no Serviço de Urgência, na sequência de uma intervenção dos trabalhadores do CODU [Centro Operacional de Doentes Urgentes] realizada à 01:44 junto desse responsável”, acrescentou a IGAS.
Da análise que fez, a IGAS conclui que no CHO trabalham 10 médicos com a especialidade de ginecologia/obstetrícia. Destes, apenas oito têm uma parte do seu tempo de trabalho afeta ao serviço de urgência e, destes oito, apenas um deles realiza trabalho de urgência diurno e outro apenas o efetua com uma periodicidade quinzenal.
Para assegurar a escala do Serviço de Urgência de Ginecologia/Obstetrícia na unidade hospitalar das Caldas da Rainha, o CHO recorre à contratação de trabalho médico em regime de prestação de serviços, explica.
Todos os hospitais de Setúbal e Lisboa estavam ind(...)
A IGAS acrescenta que no dia 09 de junho, tal como no dia anterior, o CHO não conseguiu completar a escala de Ginecologia/Obstetrícia, que tal era do conhecimento do conselho de administração, mas este órgão “não procedeu à elaboração de um plano de contingência para assegurar a continuidade deste serviço, não definiu uma estratégia de comunicação interna, nem comunicou à população a existência de restrições”.
Adianta que a presidente do Conselho de Administração comunicou, em 03 de junho de 2022, à Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo (ARSLVT) que havia insuficiência de médicos para assegurar o funcionamento do Serviço de Urgência de Ginecologia/Obstetrícia.
Perante isto, continua, “a ARSLVT, I.P. fez diligências para garantir que as utentes que se dirigissem a esse serviço fossem transferidas para os hospitais de referência da rede materno-infantil, no entanto, "não procedeu à análise dos planos de contingência para garantir que os mesmos estavam elaborados de acordo com o previsto para as redes de referenciação”.
A IGAS considera ainda que a diretora clínica do CHO, enquanto responsável pela coordenação da assistência prestada aos doentes e a qualidade, correção e prontidão dos cuidados de saúde,”não só não definiu procedimentos de atuação claros, como emitiu orientações contraditórias relativamente à admissão e triagem”.
“Além disso, não deu o devido conhecimento destas orientações a todos os trabalhadores afetos ao Serviço de Urgência, designadamente ao chefe de banco’”, acrescenta.
Perante estas conclusões, a IGAS recomenda a redefinição da estratégia de comunicação interna do CHO, E.P.E. para “assegurar a articulação entre as chefias e os trabalhadores e entre os diversos serviços”.
Recomenda ainda uma comunicação atempada à população, por parte do CHO, sobre os constrangimentos no funcionamento do serviço de urgência, sobretudo quando esses constrangimentos implicam o seu encerramento, e uma avaliação das áreas de risco” neste centro hospitalar, “designadamente na prestação de cuidados de saúde e a elaboração de planos de contingência”.
Além da instauração do processo disciplinar à medica assistente hospitalar que assistiu a mulher grávida, a IGAS recomenda à ARSLVT a avaliação dos planos de contingência das entidades hospitalares, para verificar se estes identificam os riscos potenciais e se as medidas previstas “respeitam o definido nas redes de referenciação, os normativos legais e a política de saúde, asseguram a articulação entre entidades e promovem o acesso e a equidade dos cuidados de saúde”.