21 set, 2022 - 07:43 • Ângela Roque com redação
Numa altura de aumentos generalizados dos preços e, consequentemente, das despesas das famílias, várias instituições que apoiam quem mais precisa enfrentam vários desafios. Segundo o presidente da União das Misericórdias Portuguesas (UMP), um desses desafios é a própria sustentabilidade destas instituições.
Para Manuel Lemos, a inflação e a crise energética – consequências diretas da guerra – vieram complicar ainda mais as contas. “Sem ovos não se fazem omeletas. Nos últimos anos temos tido um aumento contínuo do salário mínimo, que é justíssimo para as pessoas, mas que tem implicação nos nossos custos. Este ano, os combustíveis, a energia e os bens alimentares. Nós não conseguimos fazer repercutir no preço o aumento de custos que tivemos”.
Em declarações à Renascença, Manuel Lemos lamenta que o Estado não acompanhe este esforço que está a ser feito pelas Misericórdias. “Temos, todos os dias, pessoas para ajudar, para pagar, com diferentes credos e vários tipos de rendimento. As necessidades vão mudando, não são só os idosos, também são as crianças".
O presidente da União das Misericórdias lembra a contribuição destas instituições na gratuitidade das creches e assegura que, “sem o setor social não teria sido possível ao Governo montar este sistema. Tudo isto obriga a que o Estado nos preste atenção e considere um parceiro indispensável e inalienável da organização social em Portugal”, sublinha.
Questionado sobre se o Estado tem reconhecido este contributo, Manuel Lemos responde: “Se reduzirmos isto só a dinheiro, não tem, porque o Estado tem apoiado bastante, mas não o suficiente. A outra coisa é o reconhecimento da nossa seriedade, competência, dignificação, e isso tem-no feito”. Mas, faz também questão de sublinhar: "não podemos ficar pendurados no subsídio. Temos de fazer alguma coisa por nós próprios", para continuar a dar resposta eficaz e adequada às necessidades que vão surgindo.
Nestas declarações, o mesmo responsável defende ainda ser urgente aprofundar a ligação da Segurança Social e da Saúde, e repensar o modelo de apoio domiciliário. “É um enorme desafio", diz, porque "hoje mais de 50% dos apoios domiciliários que as instituições têm – não só as misericórdias, mas também as IPSS e as mutualidades – são cinco dias por semana, e não funcionam se for feriado".
Manuel Lemos dá como exemplo um episódio de há uns anos, quando houve uma sucessão de dias no Natal que impediram que o apoio se concretizasse normalmente. “Encontrei uma família com dois idosos acamados há mais de quatro dias e que ninguém ia, sequer, lá dar de comer, quanto mais lavá-los e limpá-los! Também temos de mudar isto e as novas tecnologias vão ajudar-nos. Às vezes, mais do que o dinheiro, é a organização, a abertura e a disponibilidade para fazer melhor”.
Todos estes desafios vão ser analisados no ciclo de conferências que arranca esta quarta-feira e se repete a 28 de setembro e a 4 de outubro, e em que vão ser divulgadas seis publicações sobre temas estruturais que a União das Misericórdias ultimou durante a pandemia.
O primeiro debate vai centrar-se na “Atualidade das Obras de Misericórdia” e na liderança feminina. “Temos hoje mais de 60 senhoras que são provedoras, e a chegada destas mulheres à gestão das misericórdias também traz um olhar novo, porque são diferentes dos homens. Pedimos a cada uma delas que nos dissessem porque é que aceitaram ser presidentes e o que estão a sentir. Numa altura em que se fala tanto de igualdade de género é importante que as misericórdias também deem provas da sua modernidade", explica Manuel Lemos.
Dia 28 vai falar-se de envelhecimento, e dia 4 de outubro o destaque irá para a experiência das instituições durante a pandemia. "È preciso fazer memória do trabalho fantástico que muitos provedores fizeram ao longo de dois anos", sublinha o presidente da UMP.
As conferências vão decorrer na sede da União das Misericórdias Portuguesas, em Lisboa.