28 set, 2022 - 14:30 • Beatriz Lopes
Portugal vai enfrentar consequências "muito graves" depois de Espanha ter interrompido a transferência de água do Douro para Portugal, acordada nos termos da Convenção de Albufeira, alerta o especialista Adriano Bordalo e Sá.
Em declarações à Renascença, o professor e investigador do Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar (ICBAS) afirma que estão em causa consequências a vários níveis: desde a falta de produção hidroelétrica, a uma possível subida do preço da água e ainda consequências ambientais.
"O nosso potencial hidroelétrico está instalado no Douro, são dez grandes barragens que produzem hidroeletricidade. Se não vem água de Espanha, a produção vai ser reduzida ao máximo e, numa situação de penúria energética, que é aquela em que estamos agora, isto vai ser muito complicado".
Adriano Bordalo e Sá alerta ainda para uma "deterioração da qualidade da água", tendo em conta que "a água vai passar a estar mais tempo nas albufeiras e já vem de Espanha com problemas, com falta de oxigénio e com fertilizantes".
Com a região do Grande Porto a ser essencialmente abastecida pela albufeira Crestuma-Lever (rio Douro) e com Portugal sem alternativas de abastecimento, o hidrobiólogo garante que a água para consumo humano "vai continuar a ser de boa qualidade", "só que o tratamento vai ser mais caro e, certamente, isso vai refletir-se no preço da água para o consumidor e numa situação de crise não é agradável", alerta.
Adriano Bordalo e Sá sublinha que está na altura de Portugal exigir que Espanha forneça caudais que vão para lá dos mínimos, como estabelece a Convenção de Albufeira, tendo em conta que "já assobiamos há 20 anos".
"Não havendo fluxo de água, agora só podemos esperar que chova. Claramente o que temos de ter é força política para lembrar a Espanha que a foz do Douro não é em Miranda do Douro, mas sim entre Porto e Gaia, que o Tejo não termina na fronteira, mas perto de Lisboa. O Guadiana também e o Minho também. É preciso haver essa vontade política, mas nós não podemos continuar a assobiar para o lado."
No entendimento do professor do ICBAS, Portugal tem mecanismos europeus para resolver esta "forte dependência" de Espanha, nomeadamente "através da Diretiva Quadro da Água", mas "tem faltado vontade política".
Para já, a redução das descargas de água de barragens espanholas da bacia do Douro não vai afetar a navegabilidade do rio em território nacional, garante à Renascença Nuno Araújo, presidente do conselho de administração da Administração dos Portos do Douro, Leixões e Viana do Castelo (APDL).
"Isto não tem qualquer tipo de impacto na navegabilidade. As condições de segurança não estão em causa, os afluentes portugueses são suficientes para manter o nível de caudal necessário para a navegabilidade no Douro e, se por alguma razão, isso não viesse a acontecer, poderíamos ativar o Plano de Emergência e Socorro do Douro, que funciona, por exemplo, no caso de cheias."
Nuno Araújo sublinha que "os navios que andam no Douro têm caudais muito diminutos" e que "neste momento, não há qualquer tipo de motivo para alarme", garantindo que a APDL faz uma permanente monitorização do rio Douro.