18 jan, 2023 - 07:00 • André Rodrigues
No dia em que o Governo e os sindicatos dos professores regressam às negociações para discutir o modelo de recrutamento dos docentes, Eduardo Marçal Grilo apela a um entendimento entre as partes, para pôr fim à sucessão de greves que está a marcar o início do segundo período de aulas.
Em declarações à Renascença, Marçal Grilo, que foi ministro da Educação entre 1995 e 1999, critica o método e a forma como os sindicatos têm levado a cabo estas paralisações e avisa que “o movimento sindical está a perder uma boa oportunidade para se afirmar pelas boas razões e está a afirmar-se de uma forma enviesada. Por parte do Governo, penso que tem de avançar para estas negociações, sobretudo, com boa-fé, com verdade e com um espírito aberto”.
O ex-ministro admite que o Executivo parte para este diálogo com a desvantagem das “limitações financeiras”, mas defende que os sindicatos “têm de compreendê-las”.
Marçal Grilo espera, por isso, que “não se transforme esta negociação numa espécie de braço de ferro com características muito políticas e um pouco populistas”, sob pena de se ter “um ano letivo perdido”.
“Tivemos dois anos e meio de pandemia, que introduziram uma enorme perturbação nas escolas e, quando parecia que este letivo 2022-2023 ia ser um ano para recuperação de aprendizagens e recuperação da estabilidade das escolas, estamos a assistir a este espetáculo muito pouco edificante para todas as partes”, lamenta.
Marçal Grilo é particularmente crítico da postura das novas estruturas sindicais, o STOP e o SIPE, que, segundo diz, “combatem as posições dos dois sindicatos que têm dominado o panorama sindical na educação (FENPROF e FNE)”.
“Estes movimentos inorgânicos são muito perigosos. Eu não sei se a greve intermitente é ou não é ilegal. Não sou jurista. Mas uma greve destas é, pelo menos, muito atípica” e, segundo o ex-titular da Educação, pode “alastrar a outros setores”.
Se as negociações entre o Governo e sindicatos dos professores falharem, Marçal Grilo antecipa “um reforço dos radicais e isso é o pior que pode acontecer ao país”.
Leitura diferente tem António Couto dos Santos, antigo ministro da Educação entre 1992 e 1993, no segundo governo de maioria absoluta de Cavaco Silva.
“O perigo não virá por aí, porque estes sindicatos dão um safanão no esmorecimento que existia”, defende.
Em entrevista à Renascença, Couto dos Santos lembra que, “durante os governos da geringonça, a FENPROF não apareceu na rua como aparece agora” e considera que, independentemente das estruturas sindicais que convocam estas greves, “os professores unem-se sempre”.
Em véspera de uma nova ronda negocial entre o Mini(...)
Apesar de não ter “muita confiança em resultados muito positivos” nesta ronda negocial, este antigo ministro diz que “a melhor maneira que o Governo teria de estabelecer um diálogo frutuoso com os sindicatos era apresentar um dossier com todos os problemas que tem pela frente e, então, estabelecer um calendário nos próximos tempos, para que haja estabilidade no sistema educativo”.
Muitos dos problemas identificados no setor da Educação, e que fundamentam os protestos dos docentes têm, em alguns casos, mais de 30 anos.
É o caso do “Estatuto da Carreira Docente, que tem 36 anos. Era preciso rever as carreiras a partir do zero e isto não se faz com uma negociação rápida e imediata”, exemplifica.
Se a reunião desta quarta-feira não servir para estabelecer um calendário com compromissos negociais, “o que vai acontecer é que vão chegar a acordo sobre alguns pontos, mas, daqui a seis meses, terão outros sobre a mesa e o problema nunca mais acaba”.
No entanto, Couto dos Santos identifica outras reivindicações dos professores que poderiam ter resposta mais célere e menos dependente dos condicionalismos financeiros do Executivo: “o acesso à profissão, o sistema de ensino, a questão da indução dos novos professores. São custos muito baixos e que poderiam dar uma resposta definitiva. Por outro lado, a questão da colocação de professores; aí, poderá ser encontrada uma fórmula que facilite o resultado. Mas o que me parece que não é bom é discutir um ponto, dois pontos ou três pontos quando temos muitos mais pontos que têm cerca de 20 anos”.
Couto dos Santos defende, por outro lado, um acordo alargado entre os partidos sobre as questões prioritárias no setor da Educação.
Rejeitando a expressão ‘Pacto para a Educação’, este antigo ministro declara-se “chocado” ao ver que, nos anos do Governo de ‘geringonça’, “nem Bloco de Esquerda nem Chega, nenhum dos partidos, falou sobre educação. E agora vão para as manifestações apresentar-se?”.
Couto dos Santos lembra que “a educação não é para ganhar votos, é para resolver problemas dos professores e dos jovens. Por isso, os partidos, em vez de irem para as manifestações, sentem-se na Assembleia da República. Não é ouvindo o ministro que os problemas se resolvem”.