29 jun, 2023 - 07:06 • Tomás Anjinho Chagas , Helena Pereira (Público)
Ricardo Leão, autarca socialista em Loures, não poupa nas críticas ao Governo pela forma como não cumpriu as promessas feitas para resolver os problemas no Hospital Beatriz Ângelo.
Em entrevista ao programa Hora da Verdade, da Renascença em parceria com o jornal Público, o presidente da autarquia assume que, com o fim da parceria publico-privada (PPP), o hospital teve resultados "muito piores".
Em Março, o ministro da Saúde, Manuel Pizarro, comprometeu-se a dar, no prazo de um mês, uma resposta à situação do Hospital Beatriz Ângelo (HBA) através da abertura de um concurso para a contratação de mais profissionais de saúde. O ministro da Saúde cumpriu a palavra?
Não, não cumpriu com o compromisso que assumiu comigo e com todos os outros presidentes de câmara servidos pelo HBA, Mafra, Sobral de Monte Agraço e Odivelas. Nesse mês, o ministro da Saúde prontificou-se a arranjar uma solução temporária para que as urgências pediátricas do HBA pudessem reabrir no horário diurno ao fim-de-semana.
O HBA serve mais de 300 mil pessoas. À época, o ministro da Saúde mostrou-se disponível para encontrar todas as soluções, mesmo que atípicas e temporárias, para que essa urgência pudesse reabrir. Os meses passaram, lamento e estou desiludido com o não-compromisso do ministro.
Que explicação lhe deu o ministério?
O ministério explicou que não há médicos para garantir essa reabertura. Volta tudo à questão salarial. Houve um concurso que abriu e fechou e tivemos poucas vagas preenchidas no concelho de Loures.
De facto, não ficamos satisfeitos e estamos muito desiludidos neste caso em concreto porque houve um compromisso e temos que honrar os compromissos que assumimos. É o que eu faço todos os dias e, se não o faço, explico porquê. Não havia médicos, mas nós, municípios, estávamos disponíveis para sermos parceiros num projecto atípico.
Há três semanas, formámos uma comissão intermunicipal composta por estes quatro presidentes de câmaras para que possamos todos ter uma só voz e como forma de pressão. Fizemos já um pedido de reunião, que ainda não foi respondido, ao ministro, mas também passa por nos reunirmos com a ARS, ACES. O problema, infelizmente, não é só a urgência pediátrica, há outros problemas relacionados com a saúde que nos preocupam a nós, presidentes de câmara, relacionados com o Hospital Beatriz Ângelo.
Neste caso em concreto, a palavra que mais descreve o meu sentimento relativamente ao ministro é desilusão pelo não honrar esse compromisso que assumiu connosco.
Acha que foi um erro o Governo ter acabado com a PPP?
Acompanhei de perto este processo com preocupação com o dia seguinte [ao fim da PPP] e todos os meus receios concretizaram-se. Mas devo dizer que não foi só por culpa do Governo que a PPP não se manteve.
Depois da pandemia, a entidade privada não se mostrou disponível para continuar. Ao fim de ano e meio, dois anos, do HBA como empresa pública, os resultados são muito piores do que os dados que havia com a PPP. O que tenho transmitido ao ministro é que se deve colocar acima de tudo os interesses da população.
Se não se dá mais liberdade aos gestores hospitalares públicos na contratação e na autonomia financeira, pode vir o melhor gestor do mundo e não vai conseguir fazer rigorosamente nada. Ou se faz uma nova PPP ou dê-se mais liberdade às administrações hospitalares.
O ministro da Saúde disse-nos, numa reunião recente que tivemos, que vai optar pela criação das unidades locais de saúde (ULS). Vai deixar de haver conselho de administração e vai passar a haver uma ULS no Beatriz Ângelo. Querem fazer isto no início do próximo ano. Será na mesma estatal, mas com mais liberdade de actuação e autonomia orçamental.
Isso vai tornar o processo mais simples?
Não sei, mas se o caminho que o Governo quer seguir é dar mais liberdade e autonomia ao gestor hospitalar no HBA desta forma, eu agora quero ver para crer.
O terreno onde foi construído o hospital foi cedido pela Câmara de Loures de forma gratuita. Estava avaliado, à época, em 40 milhões.
É com redobrada insatisfação que vemos que o hospital não está a servir aquilo para que deveria servir. Espero que o HBA recupere a credibilidade que perdeu em diversas áreas. E espero que haja médicos para as novas USF que vamos abrir no concelho.
[esta é a primeira parte da entrevista de Ricardo Leão ao Hora da Verdade. Pode ler a segunda parte, sobre os problemas no planeamento da JMJ aqui. E pode ler a terceira parte aqui, onde o autarca de Loures diz acreditar que António Costa vai remodelar o Governo quando ninguém estiver à espera]