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reportagem

Médicos esgotados. “O último Natal foi há dois anos. E dói”

04 out, 2023 - 10:21 • Isabel Pacheco

Miguel Reis Costa está no início de carreira. Helena Terleira no topo. São médicos no Hospital de Viana do Castelo e apresentaram a indisponibilidade para mais horas extras.

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Miguel Reis Costa está no último ano do internato em medicina interna no hospital de Viana do Castelo. Tem um horário de 40 horas semanais, mas só no papel.

“A maior parte das vezes acabo por trabalhar 50 horas ou mais”, conta o jovem médico à reportagem da Renascença.

“A verdade é que nem contabilizo. Faço de propósito senão seria pior para mim”, desabafa.

Entre a preparação das consultas e o acompanhamento dos pacientes, o interno, natural da Póvoa de Varzim, garante que é impossível sair a horas.

Com a rotina de trabalho para lá do horário têm de lidar a família e a noiva, com quem vai casar no próximo ano: “Quando falam que a nossa vida pessoal é muito afetada por fazer noites e fins de semana. É verdade. Mas quando escolhi medicina já contava com isso. A minha família e a minha namorada é que não."

“O problema é aquilo com que eu não posso contar. Esse é o principal peso na minha vida”, admite Miguel Reis. “É saber que tenho um horário até às seis da tarde, mas não posso dizer à minha namorada que vamos jantar às oito. Eu nunca posso dizer isso. Eu não sei se vou estar lá”.

“Eu não posso planear a minha vida pessoal”, garante o jovem de 31 anos que, pelo menos, para já, diz ter adiado a decisão de ter filhos. “Sinto que tendo a vida que tenho seria inviável ter um filho neste momento”.


Com três filhos já criados, Helena Terleira , médica no hospital de Viana, está no topo da carreira. Beneficia da redução de horário para profissionais acima dos 50 anos. Tem 36 horas semanais a cumprir, mas, na realidade, faz em média mais 10h.

“Saio de casa às 7h da manhã e chego por volta das 6h em dias normais. Às 9h da noite se for em dia de urgência”, conta a assistente graduada no Hospital de Viana do Castelo.

“Nunca faço menos de 45 ou 46 horas semanais. E quando tinha de fazer as 40 horas, normalmente fazia 60 horas semanais. Foi assim durante vinte anos”, conta.

Em 35 anos de profissão, Helena Terleira recorda a dificuldade em estar presente na vida dos filhos. “Era um corre-corre para conseguir encaixar. Era muitas vezes fazer noite para poder ir, no dia seguinte, às festas das crianças”, lembra.

“Foram muitos fins de semana, muitas festas de aniversario que falhei, muitos Natais. O último Natal foi há dois anos. E dói”, confessa.

Helena Terleira e Miguel Reis Costa são dois dos cerca de 1500 médicos de todo o país que se recusam a fazer mais horas extraordinárias do que as 150 legalmente previstas na lei.

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