13 dez, 2023 - 00:46 • Lusa
Os casos de maus-tratos a pessoas detidas pela PSP e GNR persistem ao longo do tempo, alerta um relatório do Conselho da Europa que pede investigações eficazes como fator dissuasor para os agentes envolvidos.
De acordo com o documento do Comité para a Prevenção da Tortura e das Penas ou Tratamentos Desumanos ou Degradantes (CPT) do Conselho da Europa, divulgado hoje e que contém as conclusões da visita a Portugal realizada em 2022, estes "alegados maus-tratos envolveram principalmente bofetadas, socos, golpes com bastão e pontapés no corpo depois de a pessoa ter sido controlada".
A delegação desta comissão registou também "uma série de casos de algemamento excessivamente apertado", realçando que "a prática de algemar pessoas a móveis em instalações policiais persiste".
A CPT realizou, entre 23 de maio e 03 de junho de 2022, a visita a vários postos da PSP e GNR, nos distritos de Lisboa, Porto e Coimbra, e entrevistou também várias pessoas em prisão preventiva em estabelecimentos prisionais de todo o país e no Campus da Justiça de Lisboa, que tinham sido detidas recentemente pela PSP, pela GNR e pela Polícia Judiciária (PJ).
Num dos relatos, um homem denunciou ter sido esmurrado em ambos os olhos por agentes da PSP quando já estava algemado e de ter sido novamente agredido depois de manifestar vontade de apresentar queixa pelos maus-tratos.
"Aparentemente, não lhe foi oferecido atendimento médico, apesar de um pedido nesse sentido", pode ler-se no relatório sobre um caso ocorrido em Lisboa, acrescentando que, depois de este homem ter sido transferido para outra esquadra da PSP, no relatório de admissão constava "nada a relatar" quanto a lesões físicas.
Quando presente a juiz, "apesar de apresentar lesões visíveis e explicar a sua origem ao seu advogado, nem o juiz nem o advogado tomaram qualquer atitude" e posteriormente, quando transferido para o Estabelecimento Prisional Central de Lisboa, foram "constatadas nódoas negras faciais, descritas num relatório de lesões", com estas a serem visíveis na fotografia de identificação tirada no momento da admissão.
A CPT sublinhou que, após as visitas em 2016 e 2019, comunicou às autoridades portuguesas que as conclusões sobre os maus-tratos, destacando a "gravidade destas constatações e a sua persistência ao longo do tempo".
Esta comissão defendeu investigações eficazes sobre alegações de maus-tratos, que serviriam como um importante fator dissuasor para os agentes envolvidos em atos de maus-tratos e instou as autoridades portuguesas a encomendarem "uma revisão independente do seu atual sistema de investigação de alegações de maus-tratos por parte de agentes policiais".
"No entanto, o sistema de investigação de tais casos continua disfuncional. Por exemplo, as provas de potenciais maus-tratos policiais detetadas na entrada de uma pessoa na prisão muitas vezes não são rapidamente transmitidas ao Ministério Público e/ou a outros órgãos de investigação. Mesmo depois de os casos serem transmitidos, não são tomadas medidas rápidas para iniciar uma investigação", frisou.
Na resposta à CPT, o Governo frisou que a Direção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais está ciente da relevância do seu papel na prevenção e combate aos maus-tratos contra os reclusos, perpetrado não apenas pelo seu próprio pessoal, mas também por membros das forças policiais.
O combate deve ser feito "através da recolha e denúncia expedita de situações de suspeita de maus-tratos quando os presos ingressam no sistema prisional com a intervenção de polícias", destacou, referindo sobre os atrasos identificados pela delegação da CPT na comunicação de situações de lesões alegadas ou visíveis, que as normas preveem comunicação imediata.
A tutela sublinhou ainda que a Inspeção-Geral da Administração Interna (IGAI) propôs um protocolo entre a própria, a Direção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais e a Inspeção-Geral para os Assuntos de Justiça, assinado em 23 de março de 2023, que criou grupo de inspetores "para que o recluso que apresenta sinais de maus-tratos seja ouvido por um inspetor menos de 48 horas após" a comunicação do caso.
A tutela referiu ainda, na resposta ao relatório, que, em 19 de outubro de 2023, o Governo aprovou uma proposta de lei que "determina que casos de ataques cometidos por ou contra policiais no exercício das suas funções deve ser processado com urgência", referiu.