31 jan, 2024 - 18:18 • Lusa
Os interrogatórios aos três detidos há uma semana numa operação por suspeitas de corrupção na Madeira ainda não começaram no Campus de Justiça, em Lisboa, tendo durante a manhã desta quarta-feira decorrido a comunicação dos elementos do processo.
À saída do Tribunal Central de Instrução Criminal, o advogado Paulo Sá e Cunha, que defende o ex-presidente da Câmara Municipal do Funchal, adiantou que esteve a ser feita a comunicação dos elementos do processo aos arguidos durante a manhã, pelo que os interrogatórios ainda não começaram.
Após sete dias detidos, Pedro Calado, que formalizou na segunda-feira a renúncia ao cargo de presidente da maior câmara da Madeira, Custódio Correia, principal acionista do grupo ligado à construção civil Socicorreia, e Avelino Farinha, do grupo AFA, continuam assim a ver os seus interrogatórios adiados desde sábado.
"Estamos numa fase preliminar aos interrogatórios que é a comunicação dos elementos do processo aos arguidos, é isso que estamos a fazer", disse Paulo Sá e Cunha.
Questionado se iria avançar com o "habeas corpus" [para que seja reposta a garantia constitucional de liberdade] devido à morosidade dos procedimentos, e não havendo por parte do Ministério Publico sensibilidade para os detidos aguardarem em liberdade, Paulo Sá e Cunha disse que não poderia avançar com o pedido.
"Não é do ponto de vista legal admissível nestas circunstâncias, quando há uma detenção validada judicialmente, dentro do prazo de 48 horas essa detenção é legal, o que se pode discutir é se se pode prolongar demasiado no tempo, mas essa reação não é através do "habeas corpus", qualquer que seja está votado ao insucesso", sublinhou.
O advogado disse ainda aos jornalistas que a questão "não foi descurada" e "já foi discutida na perspetiva das defesas de que os arguidos devem ser restituídos à liberdade", mas que não é esse o "entendimento que tem prevalecido por parte de outros sujeitos processuais".
"Temos de nos conformar com isso ou reagir por via do recurso às medidas que são tomadas", salientou.
Sem mencionar diretamente este caso, a Ordem dos Advogados emitiu hoje um comunicado em que constata "com preocupação a existência de detenção de cidadãos/ãs para serem submetidos a primeiro interrogatório judicial, ficando detidos/as por vários dias sem que o interrogatório seja concluído num prazo razoável e proporcional".
"Independentemente dos entendimentos jurídicos que possam existir quanto a esta matéria, não é aceitável que este tipo de atuação se torne frequente e banalizada, seja em casos mediáticos seja em processos contra o/a cidadão/ã anónimo/a", pode ler-se no comunicado.
Questionado pelos jornalistas sobre uma alegada transferência de 7.500 euros que aparece no processo, Paulo Sá e Cunha afirmou, perentoriamente, que o seu constituinte "nunca fez nenhuma transferência a favor do Dr. Miguel Albuquerque, isso é falso".
"O que é encontrado, ou não, é matéria do processo", frisou.
O recomeço dos trabalhos no tribunal está marcado para as 14h15, de acordo com fonte judicial, devendo terminar pelas 17h00 devido à greve dos funcionários judiciais às horas extraordinárias.
Os três homens foram detidos em 24 de janeiro, na sequência de cerca de 130 buscas domiciliárias e não domiciliárias efetuadas pela Polícia Judiciária (PJ) sobretudo na Madeira, mas também nos Açores e em várias zonas do continente.
A operação também atingiu o presidente do Governo Regional (PSD/CDS-PP), Miguel Albuquerque, que foi constituído arguido e oficializou na segunda-feira a renúncia ao cargo, que tinha anunciado na sexta-feira.
De acordo com documentos judiciais a que a Lusa teve acesso, o Ministério Público refere que o presidente do Governo Regional da Madeira, Miguel Albuquerque (PSD), o ex-presidente da Câmara Municipal do Funchal Pedro Calado (PSD) e o líder do grupo de construção AFA, Avelino Farinha, estabeleceram, "ao longo do tempo, uma relação de particular proximidade e confiança" que terá beneficiado aquele grupo empresarial "ao arrepio das regras da livre concorrência e da contratação pública".
Entre os contratos alvo de investigação criminal, de acordo com os documentos judiciais estão a concessão de serviço público de transporte rodoviário de passageiros na ilha da Madeira, a concessão do Teleférico do Curral das Freiras, o projeto da Praia Formosa e o Funchal Jazz 2022-2023.