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Pacote anticorrupção

Penhora de bens antes da condenação "é claramente" inconstitucional, diz Bacelar Gouveia

20 jun, 2024 - 19:30 • Pedro Mesquita , João Pedro Quesado

Constitucionalista avalia como "positivo" o pacote de medidas apresentado pelo Governo, e aponta que regulamentar o lóbi pode ajudar a clarificar "situações um pouco nebulosas".

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SEX JORGE BACELAR GOUVEIA entrevista Foto: Maria Abranches/Público
Ouça a entrevista a Jorge Bacelar Gouveia

O constitucionalista Jorge Bacelar Gouveia considera que uma das 30 medidas de combate à corrupção apresentadas esta quinta-feira pelo Governo "é claramente" inconstitucional. Em causa está o "novo mecanismo de perda alargada de bens", que inclui a penhora dos bens sem necessidade de condenação em algumas situações.

"Levanta aqui um problema, que é a possível ofensa do direito de propriedade. Vamos imaginar que, no fim, a pessoa que está a ser investigada, que foi acusada e pronunciada depois é absolvida no julgamento final, tem que voltar a ter os seus bens", afirma o ex-deputado do PSD.

Bacelar Gouveia diferencia "congelar os bens e até poder usar enquanto o processo está a decorrer" de "pura e simplesmente privar definitivamente dos bens a pessoa que depois, no fim, vem a ser absolvida", e prevê que "o Estado não vai devolver aquilo que já penhorou ou aquilo que já transferiu para o seu setor de propriedade".

Na Agenda Anticorrupção, divulgada esta quinta-feira, o Governo de Luís Montenegro anuncia a intenção de "aprofundar" o mecanismo de perda de bens, e prevê que "em determinadas condições se possa dispensar o pressuposto de uma condenação por um crime do catálogo".

Na conferência de imprensa de apresentação das medidas, Rita Júdice, ministra da Justiça, referiu que a "perda alargada de bens" se pode aplicar mesmo com o arquivamento do processo.

As medidas apresentadas incluem um regime de transparência do Código de Conduta para tentar regulamentar o lóbi, o que Jorge Bacelar Gouveia assume que "vai diminuir consideravelmente o campo de aplicação do crime de tráfico de influência".

"Às vezes nós vemos certos processos em que, só pelo facto de o empresário ter jantado com o ministro, que isso já é um crime de tráfico de influências. Isso não é nada", aponta Bacelar Gouveia, acrescentando que "o tráfico de influência não tem a ver com transparência ou não transparência, tem a ver é com o uso que depois o decisor político faz, ou com o uso que o empresário faz, do desvio da função que tem, de interesse público, para um interesse particular".

O registo das reuniões significa que "o próprio político também fica prevenido, uma vez que sabe que o encontro ficará registado, também fica prevenido da cautela que tem de ter para usar o seu poder, quando for decidir naquele caso", constata o constitucionalista.

Bacelar Gouveia argumenta que "isso acaba por contribuir para clarificarmos aqui um conjunto de situações que estão um pouco nebulosas, na fronteira entre aquilo que é uma mera pressão, um interesse político legítimo, e aquilo que já entra no domínio do tráfico de influência".

O professor catedrático avalia o pacote de medidas apresentadas como "positivo", mas admite que estranha não existir referência ao "assunto da prescrição de certos crimes e também o assunto do aumento das penas", mesmo que apenas para dizer "que não é necessário, que não se justifica ou que é preciso ponderar".

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