15 nov, 2024 - 19:03 • Carla Fino
O número de denúncias de abusos sexuais em crianças e jovens está a aumentar, segundo a presidente da Comissão Nacional de Promoção dos Direitos e Proteção das Crianças e Jovens (CNPDPCJ ). Apesar de ainda não haver números concretos, Ana Isabel Valente revela que "o número de denúncias tem aumentado", assim como os de casos que são sinalizados.
As declarações foram feitas à margem da apresentação do livro "O Abuso Sexual - Proteger Crianças Compete a Tod@s", que reúne um conjunto de artigos de vários especialistas que combatem o abuso sexual de crianças, além de reunir testemunhos de vítimas de abusos.
A presidente da CNPDPCJ defende que há mais caminho a percorrer na defesa das vítimas de abuso sexual: a recolha do testemunho da criança abusada é um desses casos. Defende, por isso, que o testemunho "tem de ser numa fase muito precoce e preferencialmente uma vez", porque, explica "muitas vezes ela não é afastada do agressor que a manipula".
E, segundo Ana Isabel Valente, "quando chega à oitava pessoa a quem está a contar a sua história, aí a narrativa já é diferente" adianta. "No tribunal são as provas que contam e a produção de prova é feita desta forma."
A criação de mais comissões — semelhantes às que foram criadas para os abusos sexuais na Igreja — não está descartada pela CNPDPCJ. Até porque não é só na Igreja que existem casos de abusos. Ana Isabel Valente diz que "podem ser feitos novos levantamentos e já estamos a trabalhar no desporto, com as entidades competentes". Sem se pronunciar muito sobre a situação na Igreja, e sobre o anúncio do alargamento do prazo para as compensações, a presidente lembra que "foi detetado o problema e se (a Igreja) considera que com o alargamento do prazo podem aparecer mais casos, indica que pode não ter um fim tão datado quanto isso", remata.
Já para o fundador da Associação Quebrar o Silêncio, é preciso um plano eficaz para perceber a realidade e o contexto em que decorrem os abusos. "É preciso perceber onde é que os abusos acontecem. Nós já sabemos, é só desocultar a realidade portuguesa e depois começar um plano no combate à violência sexual contra crianças."
Ângelo Fernandes defende que a prioridade tem de passar pela prevenção, porque "é isto que nos falta". "Não temos códigos de conduta para profissionais, por exemplo. E como foi dito aqui, o silêncio só beneficia os abusadores e não as vítimas", adianta.
O caso dos abusos na Igreja é, para o responsável da Quebrar o Silêncio, uma questão de Direitos Humanos. Ângelo Fernandes defende uma intervenção do governo para uma resolução mais imparcial e transparente: "Vivemos num Estado Laico. Não podemos estar dependentes nem reféns das decisões da Igreja. Está na altura do Governo tomar a decisão de enfrentar este caso, não só na Igreja, porque não é só aqui que existem abusos sexuais nas crianças. Deve, por isso criar, uma comissão verdadeiramente independente para resolver este flagelo de uma vez por todas", desabafa.
A apresentação do livro, que decorreu no Auditório da Polícia Judiciária em Lisboa, contou com vários testemunhos de especialistas que dedicam o seu trabalho à luta contra o abuso sexual de crianças, e também com o testemunho emotivo da atriz Melânia Gomes, vítima de abuso.
De acordo com os mais recentes dados internacionais, apresentados nesta sessão, em todo o mundo, uma em cada cinco crianças é vítima de abuso sexual.