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​Exclusivo Renascença

Combate à corrupção. Ministra da Justiça admite “organismo autónomo” para fiscalização "mais ativa" das autarquias

09 dez, 2024 - 07:00 • Pedro Mesquita

Em entrevista à Renascença, Rita Alarcão Júdice anuncia uma revisão da orgânica do MENAC, o Mecanismo Nacional Anticorrupção. No primeiro semestre de 2025 poderá avançar o confisco de bens que resultem de atividades de corrupção. O diploma do governo deverá ficar concluído até ao final de janeiro.

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Ouça a entrevista à ministra da Justiça

O governo prepara um modelo de fiscalização ao estilo da antiga IGAL, a Inspeção-geral da Administração Local, para garantir uma resposta "mais ativa e mais focada" à “perceção de alguns fenómenos corruptivos na área das autarquias”.

A ministra da Justiça, Rita Alarcão Júdice, admite, em entrevista à Renascença, a constituição de um “organismo autónomo”, visando a fiscalização "mais activa", e anuncia, igualmente, uma revisão da orgânica do MENAC, o Mecanismo Nacional Anticorrupção.

A IGAL foi extinta durante a Troika e, desde então, a fiscalização das autarquias é assumida pela Inspeção-geral das Finanças (IGF), organismo que, segundo Rita Júdice, não tem vocação para tal. Perante a dimensão das denúncias - “quase metade das denúncias apresentadas ao MENAC reportam-se à atuação das autarquias” - o governo admite entregar a tarefa a um organismo autónomo.

“Estamos neste momento a discutir o que vamos fazer... Se será um organismo autónomo ou se será através de um reforço de competências orgânicas na IGF, que possam dar uma resposta mais ativa e mais focada a esta matéria. É o que está, neste momento, em discussão”, indica.

Noutro plano, Rita Júdice avança que pretende rever a orgânica do MECAC, o Mecanismo Nacional Anticorrupção, criado há três anos. A ministra da Justiça argumenta que os resultados ficaram aquém das expectativas.

“Preparámos um decreto-lei, que está concluído. Vamos submetê-lo ao Conselho de Ministros, assim que possível, para rever a orgânica do Mecanismo Nacional Anticorrupção”, revela.

"O Mecanismo Nacional Anticorrupção tem as competências concentradas num presidente e gostaríamos de ver estas competências atribuídas a um órgão colegial”, acerscente a ministra.

Quanto ao futuro do atual presidente - António Pires Henriques da Graça - ainda nada está definido: “É um tema que ainda não está em discussão. Vamos primeiro aprovar o diploma e depois conversaremos, naturalmente, com o presidente do MENAC."

Nesta entrevista exclusiva à Renascença, a ministra da Justiça admite, por outro lado, que já no primeiro semestre de 2025 poderá avançar o confisco de bens que resultem de atividades de corrupção. O diploma do governo deverá ficar concluído até final de janeiro.

O Mecanismo Nacional Anticorrupção (MENAC) completa agora três anos, foi criado em finais de 2021. Que balanço faz do trabalho desta entidade?

Confesso que, passados três anos, as expectativas que eu tinha eram um pouco mais altas. E não eram só as minhas. Também o próprio presidente do MENAC reconheceu na Assembleia da República, recentemente, que o MENAC ficou um pouco atrás, quer na sua eficácia quer na capacidade de ação. Ficou aquém do esperado e eu partilho, também, dessa opinião.

O que é que não está a funcionar?

No Mecanismo Nacional Anticorrupção tem havido, ao longo destes três anos, alguma inação, o que se reflete numa baixa perceção da sua existência e da atividade do próprio instituto.

Perante esse balanço nada positivo, como me diz, o que é que o governo vai fazer?

Preparámos é um decreto-lei, que está concluído. Vamos submetê-lo ao Conselho de Ministros, assim que possível, para rever a orgânica do Mecanismo Nacional Anticorrupção. Vamos propor a criação de um órgão colegial. Atualmente, o Mecanismo Nacional Anticorrupção tem as suas competências concentradas num presidente e nós gostaríamos de ver estas competências atribuídas a um órgão colegial.

Queríamos dar também mais condições, através da criação de um quadro próprio, que é um dos temas de que o próprio Mecanismo Nacional Anticorrupção tem vindo a queixar-se. E queríamos, também, rever a própria duração dos mandatos. É um único caso que temos com um mandato de seis anos. É muito longo. Vamos propor que os mandatos passem a ser de quatro anos, renováveis por uma vez, em linha com outras entidades, como entidade das contas e da transparência, por exemplo.

Disse-me que gostaria que o Mecanismo Nacional Anticorrupção passasse a ser um órgão colegial. E o seu presidente - António Pires Henriques da Graça - manter-se-á?

O presidente... É um tema que ainda não está em discussão. Vamos, primeiro, aprovar o diploma e, depois, conversaremos, naturalmente, com o presidente do MENAC.

Não é uma garantia ainda de que ele fica?

Não, ainda não discutimos esse tema.

Uma das medidas previstas na Agenda Anticorrupção, anunciada em junho, era o confisco de bens, fruto de atividades de corrupção. Quando é que esta nova lei vai conhecer a luz do dia?

Até 31 de janeiro de 2025, contamos ter o diploma, que, depois, terá de ser aprovado e será submetido à Assembleia da República para discussão e aprovação.

Quando é que poderá estar em ação este plano?

Sendo otimista, acredito que durante o primeiro semestre de 2025 estará concluído.

A corrupção não é apenas um fenómeno da Administração Central, também afeta as autarquias. O governo está a pensar em algum reforço da fiscalização da corrupção também no poder local?

Nós temos presente de que existe a perceção de alguns fenómenos corruptivos na área das autarquias. Também sabemos que quase metade das denúncias que são apresentadas ao MENAC reportam-se à atuação das autarquias. Nessa medida, queremos atuar também nessa vertente.

Não sei se todos têm presente, mas existia, no tempo da Troika, um instituto, que era o IGAL, o Instituto-geral das Autarquias Locais [Inspeção-geral das Autarquias Locais], que fazia o acompanhamento e fiscalização da atividade das autarquias. Esse instituto foi extinto e todas as competências foram atribuídas à Inspeção-Geral de Finanças). E o que é que vemos que tem acontecido? Vemos que estas competências atribuídas à IGF não estão a ser plenamente cumpridas, na medida em que a IGF, a sua própria vocação, não é para este controlo da administração, numa perspetiva da própria contratação pública ou do acompanhamento preventivo da atuação das autarquias.

Para nós, é muito importante colmatar essa necessidade. Estamos, estou em conversas, quer com o ministro da Coesão quer com a Presidência do Conselho de Ministros, e todos reconhecemos a importância de atuar nesta matéria, principalmente se tivermos presente que estamos a aumentar a descentralização, dando maiores poderes às autarquias.

O que é que pretende fazer?

Deveremos criar as condições para dar uma estrutura de apoio, maior, também às autarquias. Estamos a discutir o que vamos fazer, se será um organismo autónomo ou será através de um reforço de competências orgânicas na IGF, que possam dar uma resposta mais ativa e mais focada a esta matéria. o que está, neste momento, em discussão.

Está a admitir a possibilidade de ser criada uma nova instituição...

...uma nova IGAL? Nós queremos e estamos também a trabalhar nisso. O governo tem trabalhado muito no sentido oposto, ou seja, no sentido de diminuir os organismos e tornar a Administração Pública mais magra, mais eficiente e mais eficaz. Por isso, não temos necessariamente de criar um novo organismo. Temos é que dotar, procurar a solução que melhor responda a esta necessidade que o governo identifica e que as próprias autarquias também identificam.

Sei que também está prevista a criação de uma lista negra de fornecedores do Estado. A lista não existia já?

Uma "lista negra", não. Existe uma lista facultativa de fornecedores do Estado. O que estamos a trabalhar, também com o Ministério das Infraestruturas e Habitação, é na maior otimização dessa lista, criando mais mecanismos que possam dar mais informação ao Estado e maior transparência sobre os seus fornecedores. Não existe uma lista com a dimensão de que gostaríamos que tivesse e sobre a qual ainda estamos a trabalhar.

Vai haver, portanto, uma lista mais concreta, mais efetiva e mais eficaz?

É isso. É esse o nosso propósito, é para isso que estamos a trabalhar.

Portugal caiu uma posição no índice de perceção da corrupção em 2023, que é o índice da Transparência Internacional. Este índice sugere melhores leis em matéria de "lobby". Admite avançar com legislação nesse sentido?

O grupo parlamentar do PSD já apresentou uma proposta de lei, que será agora discutida em sede parlamentar. Não é um diploma do Governo. Nesse sentido, é um diploma que tem que ser aprovado pela Assembleia da República. Havia muito trabalho já feito nessa nesse campo. Aquilo que o Governo entendeu, relativamente à regulamentação do "lobby", foi dar espaço aos partidos políticos para continuarem a dar seguimento a esse tema. Isso será discutido e julgo que no próximo ano haverá condições de ser aprovado.

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