21 dez, 2024 - 08:00 • José Pedro Frazão
Um total de 59% dos inquiridos no Barómetro sobre Imigração, da Fundação Francisco Manuel dos Santos (FFMS), consideram que os imigrantes que residem legalmente em Portugal devem poder votar como os portugueses. Mas o caminho é longo para chegar aos direitos políticos, desde logo na capacidade de transformar um milhão de imigrantes, segundo os números oficiais, em eleitores.
Pedro Góis, diretor científico do Observatório das Migrações, insiste na necessidade de consagrar esse direito ao voto, “porque só assim é que terão influência nas políticas públicas” e acrescentar ainda a capacidade de os imigrantes serem também eleitos.
“São questões de liberdade, e no momento em que comemoramos os 50 anos do 25 de Abril, parece-me muito importante que se diga que estes direitos de acesso ao voto devem ser universais para quem chega”, sustenta o sociólogo da Universidade de Coimbra no programa “Da Capa à Contracapa” da Renascença, em parceria com a FFMS.
Este especialista sublinha que é preciso mudar a legislação para assegurar o direito recíproco ao voto nas relações bilaterais de Portugal com diversos países e alerta para a necessidade de cultivar a literacia política.
Da Capa à Contracapa
A Fundação Francisco Manuel dos Santos publica um (...)
“Não basta saber que se pode votar, importa saber em quem votar, para que este processo tenha depois consequências positivas para a sociedade. Não se pode ser conduzido a votar num partido ou noutro. Faz para mim sentido que seja introduzida esta ideia de literacia política, explicando o que é uma autarquia, o que é uma junta de freguesia, o que é um parlamento, traduzindo para uma linguagem de alguém que chegou há pouco tempo, vindo de países que têm por vezes regimes completamente diferentes”, complementa o diretor científico do Observatório das Migrações.
Dar voto a um milhão de imigrantes terá grande impacto, admite o especialista em imigração e gestor de projetos comunitários, António Brito Guterres, lembrando que há muitos imigrantes esquecidos há décadas pelos políticos, exatamente porque não valem votos.
“São pessoas sem capacidade de voto, portanto não se faz campanha. Mas, mais do que isso, se as pessoas não tiverem uma narrativa que cruze a cidade portuguesa, não têm direito a ter um imaginário próprio, logo também não têm direito a uma certa política pública”, sustenta este conhecedor da realidade dos territórios onde se concentram imigrantes em Portugal.
António Brito Guterres chama a atenção para as qualificações que muitos destes migrantes do subcontinente indiano trazem e mesmo alguma militância política. “Se vocês forem ao Ano Novo Nepalês, que acontece normalmente na Alameda, em Lisboa, é impressionante a quantidade de atores políticos deles. Se olhar para as associações do Bangladesh espalhadas ao longo da Avenida Almirante Reis, vamos encontrar vários movimentos políticos. É interessante como são pessoas politizadas e, muitas vezes, até foi a questão política que as fez migrar também”, acrescenta Brito Guterres no programa “Da Capa à Contracapa”.
Entrevista ao Patriarca de Lisboa
Em entrevista à Renascença, que pode aqui ler na í(...)
O sociólogo Pedro Góis considera ainda redutor acentuar apenas as vantagens económicas da imigração em Portugal, baseada no contributo positivo para a Segurança Social.
“O contributo para a sociedade também é muito importante, só que é intangível. Não conseguimos fazer um gráfico com esse contributo, mas parece-me óbvio que está muito presente na perceção positiva que temos de alguns grupos e não está ainda tão presente na perceção que temos de outros”, analisa o diretor científico do Observatório das Migrações.
Dois terços dos inquiridos no Barómetro da Fundação Francisco Manuel dos Santos defendem que os imigrantes devem poder trazer a família para Portugal.
Neste cenário, Pedro Góis alerta para uma nova subida do número de imigrantes no futuro, uma vez que boa parte dos imigrantes que chegaram nos últimos anos não teve ainda acesso ao reagrupamento familiar.
“Se esse reagrupamento familiar vier a acontecer nos próximos anos, isso fará crescer os números da imigração e trará outro tipo de imigrantes, já não necessariamente ligados ao mercado de trabalho de forma direta”, observa o investigador da Universidade de Coimbra.