12 nov, 2015 - 10:45 • André Rodrigues
O economista João Duque não contesta a seriedade das contas de Mário Centeno, mas tem dúvidas de que a receita do PS dê os resultados esperados pelos socialistas.
Os ganhos para a economia obtidos "através do efeito de um aumento da despesa e de uma redução da receita fiscal" são "um pouco sobrestimados" por Centeno, argumenta Duque, em declarações à Renascença. "Isso levará com certeza a um comportamento não tão favorável da economia portuguesa", reforça.
Mário Centeno, putativo futuro ministro das Finanças, defendeu, em entrevista, na noite de quarta-feira, à RTP3, que a recuperação de rendimentos dos portugueses, conjugada com o aumento do consumo, terá efeitos benéficos sobre a economia e as contas públicas, mas João Duque tem reservas face a esta tese, também porque "o ambiente" não é o mais favorável.
"Há um ambiente, que decorre dos acordos com o Bloco de Esquerda e o PCP, que não propicia o quadro mais saudável para estimular os empresários e as empresas para o investimento em Portugal e para a atracção do investimento estrangeiro", argumenta. Na leitura deste economista, "esse ambiente não está quantificado no modelo", pelo que há o risco de termos "uma reacção diferente" da que é pretendida.
João Duque acredita que, como garante Mário Centeno, Portugal não repita o percurso da Grécia, mas adverte que "podemos levar um sério abanão". Todavia, "a bem de Portugal", o antigo presidente do ISEG quer que "as coisas corram como está definido" no programa macroeconómico elaborado por Mário Centeno.
O erro de Gaspar e o erro potencial de Centeno
João Duque admite que é tão arriscada a exequibilidade das ideias de Mário Centeno como foi errada a austeridade de Vítor Gaspar, lembrando que "o que falta é tempo para aplicar medidas com alguma calma".
"O choque muito forte e as variações muito grandes de alteração da economia levam a comportamentos diferentes daquilo que é esperado", sublinha.
Voltando às medidas que constam dos acordos entre PS, Bloco de Esquerda e PCP, o economista defende que "vão todas no sentido da defesa do trabalho e dos rendimentos das famílias".
"Não que isto não seja importante", nota Duque, apontando, contudo, o "problema" de que, "para mantermos isto temos de ter emprego, e o emprego em Portugal, de acordo com o modelo, vai ser desenvolvido pela economia privada, que só está a ser chamada naquilo que diz respeito - de uma forma um bocadinho leve - a PME e startups".
Não é por aí, concretiza João Duque, que Portugal terá "um modelo interessante para a fixação de emprego de elevada qualidade e de boa remuneração".
A isto associa-se outro risco: "O pouco estímulo ao investimento e às empresas, que se revela até numa certa agressividade contra o grande capital, leva a que as empresas, nomeadamente as estrangeiras, não queiram vir para Portugal."