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Aceder a dados telefónicos e digitais para prevenir terrorismo? "Só com revisão constitucional"

06 abr, 2016 - 19:54 • André Rodrigues

Ministro dos Negócios Estrangeiros defendeu, em entrevista à Renascença, uma solução parlamentar, sem mudanças na Constituição. Constitucionalista Jorge Reis Novais está contra.

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O ministro dos Negócios Estrangeiros defendeu, em entrevista à Renascença, a possibilidade de os serviços secretos poderem aceder a informações de tráfego e registo de chamadas telefónicas e de internet, os chamados metadados, como forma de prevenir eventuais ataques terroristas.

"Julgo que na Assembleia da República haverá condições para que os grupos parlamentares revisitem esta questão”, sem necessidade de uma revisão constitucional, defendeu Augusto Santos Silva.

O constitucionalista Jorge Reis Novais discorda do ministro: o legislador entraria "num território extremamente movediço".

Em Setembro do ano passado, o Tribunal Constitucional proferiu um acórdão com uma margem de manobra muito reduzida neste âmbito. Do seu ponto de vista, é possível uma solução de meio-termo, como a que defende Augusto Santos Silva?

É uma questão complexa. Vamos partir do princípio de que as novas circunstâncias impostas pelo terrorismo internacional determinam que seja razoável ou adequada essa limitação à privacidade. Se quisermos ser rigorosos, a forma como a Constituição está redigida nesta matéria leva-nos, numa primeira linha, a concluir que só através da revisão constitucional seria possível esta alteração.

Isto é: em geral, a Constituição consagra os Direitos Fundamentais de uma forma muito genérica, dando uma larga margem ao legislador para a introdução de restrições a esses direitos. Mas há outros casos em que a Constituição diz que essa restrição não é possível.

O direito à vida, por exemplo: a nossa Constituição diz que em caso algum poderá haver pena de morte em Portugal. Portanto, sem revisão constitucional, fica excluída essa possibilidade.

Estabelecendo o paralelo com a protecção dos metadados, a norma que proíbe o acesso a este tipo de informação é uma norma deste mesmo género, que diz de forma clara e inequívoca que quaisquer restrições a este direito à privacidade só são possíveis no âmbito do processo criminal. Tanto quanto penso, não é nesse âmbito que se está a pensar nessa alteração, portanto, a meu ver, só através de uma revisão constitucional é que estas questões poderiam ser devidamente acauteladas.

Mas admite que o Parlamento possa apresentar uma proposta legislativa que desafie o Tribunal Constitucional a mudar de ideias sobre este assunto, tendo em conta a ameaça terrorista?

Compreendo que, por razões de ordem política, não se pretenderia ir pelo caminho de uma revisão constitucional. Mas aí a situação fica muito periclitante, porque muito dificilmente o legislador conseguirá uma redacção que evite estas dúvidas ou mesmo as certezas de inconstitucionalidade.

O Tribunal Constitucional serve para ver em que medida é que o legislador não vai longe demais, mantendo-se dentro dos limites da lei fundamental. Ora, neste caso, os limites da Constituição são muito claros.

Ministro defende acesso a metadados para prevenir atentados terroristas
Em entrevista à Renascença, Santos Silva defendeu o acesso a metadados para prevenir atentados terroristas

Admito que todos nós devemos ser sensíveis à nova situação que o terrorismo internacional nos impõe. O problema é que, neste caso, a norma da Constituição não admite diferentes leituras, porque é muito clara e inequívoca. Por muito sensível que seja, o legislador fica sem margem. E uma revisão constitucional muito estrita nos termos, circunscrita aos crimes de terrorismo, seria eventualmente possível.

Fora disso, entendo que o legislador entra num território extremamente movediço, que não é bom para ninguém.

Então, não fazem sentido as considerações do ministro dos Negócios Estrangeiros a este respeito?

Não digo isso. Aliás, não há unanimidade no acórdão do Tribunal Constitucional que proíbe o acesso a metadados. Pessoalmente, não sou adepto de revisões constitucionais a propósito de tudo e de nada. Mas, atendendo às circunstâncias, se não há outra forma de resolver o problema que não seja através de uma revisão constitucional, ela deve ser feita, sob pena de se destruir a própria força da Constituição.

E vê utilidade numa revisão constitucional neste âmbito concreto dos metadados?

Sim, se se concluir que o acesso a esses dados tem eficácia, produzindo resultados que levem à protecção de bens que todos reconhecemos como de valor indiscutível, então seremos levados a concluir que se torna necessário alterar o actual estado normativo.

Como se faz isso? Quando a Constituição proíbe em termos absolutos, a única forma de alterar é introduzindo uma modificação na Constituição. As outras vias acabam sempre por trazer mais inconvenientes do que vantagens a médio prazo. E falo de inconvenientes do próprio ponto de vista da vigência da Constituição: se, a certa altura se quer forçar a Constituição a dizer aquilo que ela não diz, é pior para a normatividade da Constituição.

Toda a história da jurisprudência do Tribunal Constitucional português revela-nos que quando o Tribunal Constitucional também se envolve a decidir politicamente, o resultado não é bom. E nós já tivemos casos em que isso aconteceu, não há muito tempo.

Terrorismo. Rui Pereira defende revisão constitucional para acesso a metadados
Terrorismo. Rui Pereira defende revisão constitucional para acesso a metadados
Comentários
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  • Fields
    07 abr, 2016 lx 02:44
    Não me digam que estão preocupados que se venha a desdobrir que vocês andam a espiar os cidadãos há muito tempo, e querem abafar a coisa... Artolas então só se combate o terrorismo com escutas e metadados! Os americanos já tinham isso tudo a triplicar e não conseguiram evitar o ataque às torres gémeas. Estes políticos só servem mesmo para limpar o pó às cadeiras do parlamento...
  • Joao
    07 abr, 2016 Lisboa 01:53
    Não conheço a constituição muito bem. Mas acredito a vida das pessoas está como prioridade. Se é inconstitucional o uso de ferramentas que permitem a vida, então temos uma constituição muito má que tem de ser revista.
  • carlosayres
    06 abr, 2016 Rio Maior 23:13
    Há, com efeito, muitas maleitas de que enferma a Lei Fundamental do país. Não compete a mim nem aos cidadãos apontá-las, pois temos constitucionalistas e outra gente versado na matéria. No caso presente dos "metadados", como se diz, se é algo necessário para defender a soberania e integridade do país, não vejo por que não possa ser aplicada, não ficando de olhos parados, ver a caravana passar. Ontem já foi tarde demais. Este país necessita de saber que os governantes estão a olhar por eles, incutindo-lhes segurança, ao invés de terror, de insegurança. As coisas deverão ser feitas e colocadas em prática, enquanto nada se passa e não quando as coisas acontecem, pois, aí, já será tarde e, então,todos correm para aqui e para ali, tentando apagar um fogo que já tudo destruiu.
  • madala
    06 abr, 2016 evora 22:20
    Temos uma constituição que não nos defende dado que está completamente armadilhada. Defende aqueles que o constitucionalista quiz ,ou obrigaram-no a fazer, isto é, os grandalhões, trafulhas, etc. Não se pode escutar, não se pode colocar câmaras de video, etc, porque viola os direitos dos cidadãos mas não os defende. Autêntica porcaria!
  • Jose Mourisco
    06 abr, 2016 Barreiro 22:16
    Eu concordo. Ate porque iriam se descobrir muitas conversas interessantes aqui na margem sul, principalemente para os arredores dos barreiro. Mas claro que isso não interessa. Por isso existe muito medo de se ouvir a verdade
  • Pedro
    06 abr, 2016 Gondomar 22:11
    estava a ver quando é que esta espionagem iniciada pelos Estados Unidos viria a ser aprovada.Nunca seria aprovada a bem então os senhores Estados Unidos que estão com uma recessão economica nunca vista colocaram uns agentes da CIA criaram o tal EI e semearam o terrorismo em varios paises.Conclusão-o acesso aos dados que até alguns anos para cá eram controlados em segredo pelos estados Unidos e esse segredo foi descoberto desta feita com a desculpa do terrorismo vais ser espionagem a todos e mais alguns,telemoveis,drones,portateis,Desktop,etc mas desta vez com a permissão dos varios governos.Um golpe bem dado mas para quem anda de olhos fechados.Ao mesmo tempo com os atentados terroristas dá um golpe na economia da Europa reduzindo a sua crise.2 em 1.Não falta muito vamos andar a ser seguidos por drones e por ai fora matam qualquer um e dizem que era terrorista e está feito.
  • ferreira
    06 abr, 2016 aveiro 22:03
    Prevenir é antecipar os acontecimentos. Porque estão à espera
  • Jorge
    06 abr, 2016 Conchinchina 21:49
    O que é preciso é uma carroça. Por isso é que esses vagabundos terroristas deitam e rolam nos países europeus porque sabem que é tudo uma cambada de otários que ficam só nos direitos humanos, que não pode isso, não pode aquilo, enquanto eles podem tudo. Tem que morrer uns milhares para depois então tomarem providências. Bando de otários. Tomara que se tiver atentados que matem as famílias deles , só assim eles mudam de discurso .
  • Eu
    06 abr, 2016 Aqui 21:20
    george orwell 1984...
  • Dias
    06 abr, 2016 Lx 21:00
    É o costume, vão ter de morrer mais algumas centenas de pessoas para as policias poderem escutar e prender os terroristas. Haja paciências para tanta estupidez, democracia sim, mas controlada pois é esta a única maneira de travar o populismo de certas medidas democráticas que só nos trazem dissabores, infelizmente.

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