01 jul, 2016 - 20:26 • José Pedro Frazão
António Vitorino critica a aplicação de sanções para obrigar ao cumprimento de metas orçamentais na União Europeia. No programa “Fora da Caixa” da Renascença, o antigo comissário europeu assinala que no caso de Portugal os dados da execução orçamental “indiciam que os problemas que estão na base das sanções não se verificam”.
Seja como for a tese de Vitorino aplica-se de forma indistinta. “Acho que as sanções são uma estupidez. Não é desta forma, no meu entender, que vão convencer as pessoas que devem cumprir as regras. As sanções não se justificam em nenhum cenário. Não é o problema de saber se é uma aplicação rigorosa e restrita da lei, mas o de saber qual é a dinâmica politica e a trajectória correcta para o ajustamento das finanças públicas”, argumenta o antigo comissário europeu na Renascença.
Vitorino comentou as frases atribuídas ao ministro das Finanças da Alemanha onde este alegadamente anuncia que Portugal pediu um segundo resgate para logo depois autocorrigir-se, acentuando essa possibilidade se Portugal não cumprir as regras orçamentais europeias.
“Não acredito em gaffes. Acredito que a fórmula que ele escolheu terá sido incompetente para os seus próprios objectivos. Tanto que o obrigou depois a vir emendar o discurso e a corrigir”, comenta Vitorino, que classifica a frase inicial como “infeliz”. O antigo ministro socialista lembra que a tese de Schauble de desacordo face ao caminho seguido por Portugal não é surpreendente.
“Mas neste momento aquele discurso causa danos. Não o podemos isentar de responsabilidade, porque na verdade gerou uma situação que causa danos a Portugal. Mas é também uma manobra de pressão sobre a Comissão Europeia para que faça uma proposta de sanções”, observa António Vitorino.
Os problemas do PSOE
No rescaldo das eleições espanholas, o antigo comissário europeu aguarda a formação de um Governo minoritário do Partido Popular. “Na constituição espanhola, a maioria absoluta só é exigida na primeira votação. A partir daí ganha-se pela pluralidade de votos e pode ser uma maioria simples dos votos apurados”, assinala o comentador do “Fora da Caixa”, ainda que Espanha nunca tenha tido um governo minoritário nestas condições.
A abstenção do PSOE, Partido Socialista Espanhol, é um dos factores essenciais para esse quadro político em Espanha. Questionado sobre as razões do insucesso eleitoral do PSOE, Vitorino admite que um desencanto dos eleitores com a situação social pode estar em parte na base desses resultados.
“Enquanto que aqui em Portugal a construção do estado social é uma “aventura conjunta” entre o PS e o PSD, em Espanha a matriz do estado social partiu do Partido Socialista Operário Espanhol (PSOE) e dos anos de Felipe González no poder. O grande problema neste momento é envelhecimento do PSOE, que pode explicar alguma da decadência em que partido se encontra. É importante renovar. É um problema de lideranças mas algo também mais fundo, do ponto de vista sociológico, do programa político do PSOE.
O Brexit passará em Westminster?
Activar o artigo 50º do Tratado de Lisboa para formalizar a saída da União Europeia não parece ser uma urgência para os partidos britânicos, mesmo após um referendo que ratificou uma opção que formalmente pode durar dois anos a aplicar. A demissão de David Cameron parece complicar a rapidez do processo e até mesmo abrir uma discussão política nova.
“Só haverá um novo primeiro-ministro em Setembro e vamos ver o que é que este quererá para o seu mandato. Não é de descartar a possibilidade de um novo primeiro-ministro, eleito em circunstâncias parlamentares, pretender um voto popular que legitime a sua liderança. É uma questão que ainda está em aberto, mas isso levaria mais um ou dois meses”, analisa António Vitorino.
O comentador socialista admite que existem grandes dúvidas sobre se a actual composição parlamentar seria suficiente para votar as leis necessárias a executar o referendo.
“Não estou a dizer que o parlamento de Westminster não vai seguir as indicações do referendo, porque vai. Penso que ninguém se atreve, perante um referendo tão expressivo, a não dar sequência parlamentar. Mas, do ponto de vista da constituição não-escrita britânica é o parlamento que tem que decidir accionar o artigo 50º. A partir do momento em que o fazem, tudo o que for acordado tem que ser objecto de aprovação parlamentar. É para isso que as dúvidas existem de que haja uma maioria absoluta clara em Westminster”, remata António Vitorino.