26 jan, 2017 - 00:16 • Raquel Abecasis (Renascença) e David Dinis (Público)
Veja também:
A ministra da Presidência e da Modernização Administrativa diz que, depois do chumbo da baixa taxa social única (TSU), já espera tudo do PSD, incluindo entraves às parcerias público-privadas (PPP) na saúde. "No PSD já não me espanta nada”, afirma Maria Manuel Leitão Marques, em entrevista à Renascença e ao jornal “Público”.
Chumbada a redução da TSU, o Governo tentará um novo acordo na concertação social para compensar o aumento do salário mínimo. Diz a “número três” do Governo que não está em causa a governabilidade e que o PS não mudará de rumo por causa da nova estratégia política do PSD.
O que pode fazer o Governo depois do chumbo da descida da TSU?
A medida não viola o acordo que fizemos com os nossos parceiros e o Governo optou por ela para dar uma contrapartida para o esforço que as entidades patronais vão fazer para o aumento do salário mínimo.
Mas viola o acordo com “Os Verdes”.
Não, se for ver o acordo não viola. “Os Verdes disseram isso, mas depois até já vieram recuar. Não viola com nenhum dos parceiros.
Sendo assim, também não faz sentido que seja pela mão desses partidos que este acordo seja chamado ao Parlamento e que seja lá chumbado.
Eles também não têm esse acordo com o Governo. Para conseguirmos o aumento do salário mínimo, e porque somos favoráveis a esse aumento, entendemos que deveríamos encontrar contrapartidas com os parceiros. E foi esta que encontrámos [a redução da TSU]. Não é essa a opinião dos outros partidos com assento parlamentar e estão no seu direito. Sendo que essa opinião é menos compreensível para os partidos que sempre defenderam medidas semelhantes.
Já há duas semanas que o Governo sabe desse voto do PSD. E que a medida seria chumbada. O Governo já negociou outra medida que permitisse compensar as empresas?
Como tem sido dito pelo Governo e até pelo Presidente da República, até ao lavar dos cestos é vindima.
Mas também se pode dizer que Governo prevenido vale por dois. O Governo sentou-se com os patrões procurando alternativas? Acha-as necessárias?
Essa foi a preocupação do Governo. E tentará também encontrar alternativas, de preferência em concertação social. Se não for possível, tentará encontrar alternativas que protejam as pequenas e médias empresas (PME), as empresas mais frágeis, do impacto que o aumento do salário mínimo lhes pode trazer.
As alternativas vão passar por um consenso na concertação social?
Claro, se não já o poderíamos ter feito. Tentaremos sempre encontrar um consenso na concertação social. Sendo que, se assim não for, procuraremos encontrar como Governo soluções que respondam a este problema. O Governo não tem obrigação de chegar a acordo.
Não houve imprudência do Governo, por não ter procurado consensualizar esta medida com o PSD?
Reconheço que o Governo fez os seus cálculos, olhou para aquilo que têm sido as posições do PSD, que sempre afirma que o interesse do país prevalece sobre o interesse do partido. Creio que neste caso o interesse do dr. Passos Coelho com os seus militantes prevaleceu sobre o interesse do país.
Mas reconhece que houve imprudência do Governo?
Não, não reconheço. O Governo governa governando. Às vezes com mais sucesso que outras vezes, mas aqui tomou uma medida que tudo indicava poder reunir o consenso necessário. A não ser que o PSD seja contra o aumento do salário mínimo.
Não haverá empresas que contratem pessoas pelo salário mínimo para obter estes descontos recorrentes na TSU? Este é um risco também?
Sim, é verdade. Não se pode governar sem riscos. Mas temos que fazer o balanço do custo e do benefício. E penso que o benefício do salário mínimo é maior do que alguns riscos que desta medida pudessem decorrer.
Nos próximos dois anos haverá novos aumentos de salário mínimo. O que aconteceu agora não torna impossíveis as próximas negociações em concertação social?
Não creio, a medida da TSU era transitória, era para este ano. Permitia ir um bocadinho mais além na subida do salário mínimo com essa compensação para este ano.
Mas haverá novo aumento em 2018, também em 2019. E os patrões quererão compensações de novo.
É o que está no programa de Governo. Haverá naturalmente negociações. O Governo pode decidir através do seu poder legislativo, embora os seus decretos possam ser chamados ao Parlamento. Se decide em algumas matérias ouvir a concertação social isso significa reforçar a democracia e encontrar consensos antes da tomada de decisão.
Este acordo de concertação tem também outro capítulo em legislação laboral. O que aconteceu levará a uma revisão desses pontos?
Não, não há anúncios nem compromissos do Governo de revisões profundas em matéria de revisão da legislação laboral.
Os parceiros do PS querem...
Estão no seu direito.
Este impasse, com a mudança de estratégia do PSD, vai mudar também a natureza da governação?
Quem nos suporta no Parlamento são “Os Verdes”, PCP e Bloco de Esquerda. São esses os nossos parceiros.
Mas, em muitas coisas, eles não estão de acordo com o Governo.
É possível, somos partidos diferentes, todos com o seu programa, unidos por alguns objectivos comuns que tornaram possível este acordo, tornaram possível um ano de Governo. Naturalmente, não estaremos coincidentes em todos os domínios. Mas também é possível que o PSD se mantenha fiel ao seu programa, naquilo que ele coincide com o do PS. Também há vezes em que convergimos.
Segundo o semanário “Expresso”, pode acontecer um problema semelhante nas PPP da saúde: O PSD aliar-se à esquerda para impedir a entrega do Hospital de Cascais a privados.
Quando a decisão for tomada, se for por decreto-lei, a questão pode ser apreciada no Parlamento. Veremos qual é a posição do PSD nessa matéria, já nada me espanta.
Francisco Assis concluiu de tudo isto que a estabilidade política está em causa.
Penso que não e os próprios parceiros tiveram o cuidado de expressar o seu compromisso com esta solução.
Mas há uma quadratura do círculo que é difícil fazer. Muitas coisas que o Governo quer fazer e, se não tiver apoio à esquerda e direita...
Até agora o PS conseguiu fazer o que há um ano se dizia impossível ou muito improvável: governar com o seu programa, os acordos e com redução do défice. O caminho faz-se caminhando.