16 fev, 2017 - 00:15
Veja a outra parte da entrevista a Carlos César:
Conseguidos resultados históricos na economia, começam a ouvir-se vozes à esquerda a sublinhar que o cumprimento das metas não está ajudar o país e que é preciso fazer um outro caminho. Isto significa que os dossiês importantes que aí vêm serão mais difíceis de compatibilizar com a esquerda?
Não creio. Estes resultados são importantes porque mostram sucesso independentemente das medidas extraordinárias, mas servem sobretudo para demonstrar aquilo que é essencial à esquerda portuguesa: é possível melhorar os rendimentos das pessoas, repor mínimos sociais, introduzir elementos de justiça retributiva e de justiça remuneratória, salvaguardando, ao mesmo tempo, a boa condução das finanças públicas. É fundamental compreender que essa demonstração de sucesso no plano externo é um factor de valorização da experiência portuguesa e da própria participação do BE e do PCP neste projecto. Porque à luz das instituições europeias e dos cidadãos europeus, nós fazemos a demonstração de que é possível governar com sentido social, não descurando a responsabilidade financeira e obedecendo a um normativo europeu. Isso é fundamental para o sucesso da esquerda em Portugal e fora de Portugal.
A esquerda tem consciência disso?
O PS tem consciência de que isso é fundamental e o BE e o PCP certamente compreenderão que já não há experiências num único país que sobrevivam isoladamente. O sucesso do projecto político e governativo que temos em Portugal é indissociável da sua conviviabilidade política no plano europeu. Não é possível viver sozinho no mundo. Esta demonstração que fizemos é fundamental do ponto de vista da perenidade e da consistência desse projecto. Evidentemente que também nos permite folgas futuras. A circunstância de termos atingido os objectivos com esta rapidez, consistência e qualidade estrutural permite-nos também progredir em algumas áreas em que tivemos de ter maior contenção.
Não concorda com os elementos do PSD que dizem que Passos Coelho é o cimento que cola a geringonça?
Não, creio que não. Nós temos um projecto que nos tem feito unir e progredir. Há algo que é muito importante preservar e, pela minha parte, como presidente do grupo parlamentar do PS, não prescindo disso: o PS é diferente do BE e do PCP. São três partidos diferentes, ou, pelo menos, o PS é diferente dos outros dois. Mas encontrámos num projecto que tem três pilares (o programa do Governo a que se associa o Plano Nacional de Reformas, os acordos bilaterais e o diálogo permanente) a base da estabilidade política. Não há dívida de que há uma estabilidade [política] muito significativa. Repare, por exemplo, que em cerca de 1200 diplomas aprovados na Assembleia, só em 10% dessas situações é que PS, BE, PCP e PEV não votaram juntos. É o número suficiente de vezes para mostrarmos que somos diferentes e é o número suficiente de vezes para mostrarmos que temos uma grande coesão. Mas não temos nenhum preconceito contra o PSD e o CDS.
Há reformas que a esquerda agora reclama, por exemplo na legislação laboral, para as quais o PS não está muito virado...
A situação em que hoje nos encontramos nesse plano, da legislação laboral, é marcada por uma estabilidade que é indesejável alterar. Mas isso não significa que não existam aperfeiçoamentos a fazer, sobre aspectos de natureza mais sectorial, para os quais nós podemos trabalhar em conjunto. Como na questão da precariedade. Vamos trabalhando caso a caso, dossiê a dossiê, numas matérias não temos acordo imediato, numas divergimos por questões de intensidade, noutras de oportunidade e noutras de substância...
A “geringonça” é uma camisa de forças para o Governo?
Não. O Governo não tem maioria absoluta, depende dessa maioria parlamentar. O que se deve concluir é que essa maioria, sendo constituída por partidos que são diferentes uns dos outros, resulta de um diálogo permanente e de um acerto de posições e por vezes de algum desacerto. É assim que tem de acontecer. Em boa verdade, desde que este Governo tomou posse ainda não teve nenhuma crise da dimensão que teve o anterior, que até tinha uma coligação maioritária.
Ainda
não decorreu tempo suficiente...
Pois,
mais ainda não teve.