16 mar, 2017 - 06:00 • José Pedro Frazão , Eunice Lourenço
Pedro Santana Lopes diz que vai escrever um livro para responder ao mais recente volume da biografia de Jorge Sampaio. Mas vai desde já respondendo ao antigo Presidente, que, diz o ex-primeiro-ministro, dissolveu o Parlamento em 2004 para abrir caminho à eleição presidencial de Cavaco Silva. “Estou convencido que essa foi a principal razão”, diz Santana Lopes em entrevista à Renascença, que será transmitida ao final da tarde desta quinta-feira, depois das 19h00.
O antigo primeiro-ministro diz que Sampaio “estava muito empenhado na eleição de Cavaco Silva” e diz mesmo que chegaram a falar disso. “O sistema queria Cavaco Silva”, acredita Santana, dizendo que para Cavaco ser eleito, nas presidenciais de 2006, era melhor que o Governo fosse do PS porque havia a convicção de que os portugueses não punham “os ovos todos no mesmo cesto”.
Santana diz ainda que “o sistema” o via como “muito distante de Cavaco Silva” e receava que com ele na liderança do PSD o partido não apoiasse Cavaco com convicção.
“O sistema dos poderosos era mais amigo de Jorge Sampaio do que meu amigo”, afirma o actual provedor da Misericórdia de Lisboa, que também atribui culpas da sua queda a “algum sector financeiro e alguns empresários”.
O segundo volume da biografia de Jorge Sampaio chegou às livrarias esta semana. Escrito pelo jornalista José Pedro Castanheira, tem cerca de mil páginas e conta os anos da vida pública de Jorge Sampaio desde a sua eleição para a Câmara de Lisboa até à passagem de testemunho para Cavaco Silva na Presidência da República. Inclui, portanto, os anos de Sampaio Presidente e as crises políticas de 2004-2005, com a ida de Durão Barroso para Bruxelas, a nomeação de Santana Lopes para primeiro-ministro, a posterior dissolução do Parlamento e a demissão do Governo.
O autor teve acesso ao arquivo particular de Sampaio, entrevistou-o durante dezenas de horas e, como se lê na contra-capa, entrevistou mais 198 pessoas que se cruzaram com o biografado: amigos, rivais, colaboradores, apoiantes e críticos. Mas entre essas pessoas não está Santana Lopes que não gostou de ler no livro que Sampaio estava “farto” dele.
“Fartei-me do Santana como primeiro-ministro, estava a deixar o país à deriva - mas não foi uma decisão ad hominem. (...) Hoje faria o mesmo. De vez em quando é preciso dar voz ao povo - e percebi qual era o sentimento do povo”, diz Sampaio, citado na sua própria biografia.
Nesta entrevista à Renascença, Santana diz que não foi o povo que o Presidente ouviu, mas empresários e banqueiros reunidos na Cotec (associação empresarial para a inovação com o alto patrocínio do Presidente da República).
O antigo primeiro-ministro diz que nunca teve dúvidas de que a sua queda foi “uma decisão política deliberada” e manifesta-se disponível para uma conversa pública com Jorge Sampaio para esclarecerem como “pessoas dignas e civilizadas” o que chama mesmo de “factos alternativos” contados no livro.