28 set, 2017 - 00:01 • Eunice Lourenço (Renascença) e David Dinis (Público)
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O caso de Tancos não põe em causa a segurança nacional, alega o deputado socialista e ex-ministro de Costa. A geringonça, essa, acredita que vai sair "reforçada" das eleições autárquicas.
Falando de Portugal, continua um mistério o caso de Tancos. O ministro da Defesa está a gerir convenientemente este problema?
O ministro da Defesa é uma pessoa por quem eu tenho profunda consideração. E acho que ele tem feito o que é possível neste contexto, que é um contexto complicado. O que eu acho sinceramente é que as Forças Armadas são, em paralelo com a Igreja Católica, uma das grandes instituições que fazem parte da nossa espinha dorsal. E por em causa, por uma questão menor, aquilo que é o funcionamento excecional das nossas Forças Armadas…
Acha que é saudável, benéfico para as Forças Armadas que, três meses depois, continuemos sem saber nada do que aconteceu em Tancos?
Essa é uma questão menor, mas eu também gostava de saber. Mas é uma questão menor comparada com a questão de fundo.
Mas isto está a afectar a imagem das Forças Armadas… Claro que sim, mas também vivemos sempre nestas coisas da espuma dos dias. É uma questão menor, não há nenhuma questão de segurança nacional. As nossas Forças Armadas são exemplares, os três ramos.
É por isso que pergunto, especificamente não sobre o roubo, mas da falta de transparência como todo o processo… Eu não creio que tenha havido falta de transparência. Provavelmente as investigações estão a decorrer e provavelmente vamos ter resultados em breve, mas…
O problema é ter-se tornado um caso político?
Eu acho que houve também um pouco. E usar isso como argumento de natureza eleitoral no quadro de eleições autárquicas parece-me um disparate. Houve ali uma ligação clara, pelo menos do ponto de vista da cronologia, com a tragédia dos incêndios. E essa sequência valorizou uma coisa que teria sido menor na altura, se estivesse desgarrada de todo o resto.
Há uma discussão que tem sido pouco feita em Portugal e que está em curso, que é um mecanismo de Defesa Europeu. Como é que acha que deve ser a participação de Portugal nesse mecanismo?
Portugal tem dado sempre sinais que são positivos e que aguentam a comparação, para muito melhor, com todos os outros parceiros europeus. Mas ninguém quer abdicar de ter o seu próprio sistema de forças e as várias tentativas que se fizeram a nível europeu tem falhado todas. Agora, o senhor Juncker avançou com um conjunto de propostas. Nós estamos a enfrentar desafios completamente novos, com métodos muito antigos.
O João Soares defende que é preciso uma reforma da NATO. Com este aprofundamento da defesa europeia que se antevê… Não houve, até agora, nenhum aprofundamento. E eu acho que valia a pena começar pela NATO, que tem potencialidades e tem que ser reformada.
Este é um terreno onde não é fácil haver discussão com o PCP e com o Bloco de Esquerda… Quem é que disse que não é fácil?
Acha que é possível?
É perfeitamente possível. São dois partidos profundamente dialogantes e empenhados e trazem aqui um contributo que é muito interessante. Eu fui dos primeiros [a defender entendimentos à esquerda], mesmo antes do António Costa, e mesmo antes de Jorge Sampaio quando avançámos para a coligação em Lisboa. Defendi isso sozinho dentro do PS e lembro-me das críticas que me fizeram. Não só por razões práticas, porque somos muito mais forte unidos do que separados, mas também por razões ideológicas. Nós, o Governo do PS com o apoio da esquerda, pusemos a salvo coisas que estavam em risco sério: a escola pública, o SNS e com o sistema de Segurança Social. Mas há aqui uma coisa em que ainda não conseguimos que é pôr mão no sistema financeiro. Nós já não temos sistema financeiro português, já nada existe e com isto não estou a excluir as responsabilidades que alguns governos do PS tiveram, nomeadamente na gestão da CGD, onde se fizeram grandes disparates. Eu acho que o contributo que vem do lado do PCP e do lado do Bloco reafirma a firmeza ideológica dos valores originais da social-democracia. Nós não podemos aceitar, e felizmente não temos tido agora, promiscuidade entre política e negócios. Isso não. E houve momentos na história do PS no poder em que isso aconteceu…
As eleições autárquicas vão fortalecer esta maioria de esquerda?
Eu tenho a esperança e a convicção.
E depois como é que se resolve o caminho até às legislativas? Teremos uma cada vez maior entre os partidos de esquerda para mostrar cada um o seu serviço?
Eu acho que se tem feito a prova de que o diálogo funciona e funciona muitíssimo bem…
Mas acha que depois se deve caminhar para uma aliança pré-eleitoral?
Não, eu não sou favorável. À partida as coisas mudam, como sabemos, mas eu não sou favorável à aliança pré-eleitoral. As autárquicas vão fazer a prova num terreno que, à partida, não é um terreno fácil desta complementaridade entre as várias forças de esquerda. A campanha do PS, do Bloco e do PCP tem sido feita toda pela positiva e sem agredir aqueles que são conjunturalmente os nossos adversários.
Tem fé que o PS tenha maioria absoluta?
É altamente desejável que este entendimento prossiga.