18 jan, 2018 - 00:00 • Eunice Lourenço (Renascença) e David Dinis (Público)
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Depois de cinco anos como bastonário da Ordem dos Advogados, Marinho e Pinto chegou ao Parlamento Europeu em 2014 como candidato pelo Movimento Partido da Terra. Rapidamente, deixou aquele partido e, agora, é presidente do Partido Democrático Republicano. Agora, admite deixar a política.
Como é que tem visto, à distância do Parlamento Europeu, a actuação da "geringonça"?
A "geringonça" foi o resultado da confluência singular de vários factores, uns astrais, outros políticos. Foi um parto bafejado pelos deuses bons - porque tudo tem corrido bem. Mas vejo com alguma apreensão, só nesta medida: eu saúdo mudanças que se fizeram, corrigindo os excessos de austeridade do anterior Governo - que assumiram mais a natureza de um ajuste de contas ideológico com o 25 de Abril do que efectivas de ultrapassar a crise; mas vejo com preocupação, porque continua a enganar-se o povo, dizendo que é possível distribuir sem produzir. Isto preocupa-me, eu que estou aqui na Europa e vejo o rigor com que determinados países actuam em relação às questões orçamentais. O Estado só pode distribuir se criar condições para produzir. Mas em Portugal vejo que se insiste: "houve austeridade porque aqueles são maus, queriam o vosso mal; nós somos bons, cortamos a austeridade". Como se houvesse um cofre sem fundo, com dinheiro para redistribuir.
A eleição de Rui Rio, no PSD, pode mudar os discursos e as regras do jogo?
Rui Rio é um homem com princípios muito sólidos, um homem de grande rigor nas coisas que faz - e sobretudo de muita coragem. Enfrentou poderes muito fortes, quer na cidade do Porto, quer no país. A fasquia está muito alta ao nível das exigências que o país esperará dele, ao nível do rigor, do combate a certas degenerescências que se têm instalado na Justiça, na Assembleia da República... Agora, não sei como vai ser.
Revê-se nas posições dele sobre a Justiça?
Sim, sempre defendi isso. E haver um líder de um grande partido com a coragem de o dizer publicamente é um bom sinal. Agora, já começaram as movimentações aí em Lisboa, em alguns círculos do PSD, para lhe fazer a cama. Fizeram-na no passado: houve outro líder do PSD que teve que fugir, o Luís Filipe Menezes. Espero que o dr. Rui Rio tenha a sagacidade para resistir, não só às armadilhas, mas aos ataques frontais que vão mover-lhe. Há lobbys e clientelas poderosíssimos que não toleram quando há sinais de mudança.
Já decidiu o que vai fazer à sua vida política? Se vai recandidatar-se ao Parlamento Europeu?
Em política os prazos devem ser limitados. E além disso há também um limite natural para as pessoas. Eu sempre gostei da vida. E, quer como bastonário e como deputado, tenho renunciado a muitas das dimensões da vida, das realizações pessoais que fariam a minha felicidade. Estou no meu limite, somos como os iogurtes, temos também um prazo de validade. E penso que o meu prazo está a chegar ao fim.
Chegando ao fim como eurodeputado, também chega ao fim como projecto político?
Isso não posso dizer-lhe, porque não posso falar só no meu nome. Como presidente de um partido - do Partido Democrático Republicano - tenho responsabilidades para com as pessoas que aderiram, motivados pela minha forma de actuar. Devo falar com eles. Mas a ideia de que devemos parar. Mas tenho também uma relação muito frustrada com o povo português. Fiquei muito desencantado com a forma como os eleitores reagiram às declarações que proferi quando assumi o lugar de deputado ao Parlamento Europeu.
Relativamente aos salários que se praticam?
Sim, sim. Reagiram muito mal por eu dizer uma verdade. Lembro-me muita vez da “Alegoria da Caverna”, do Platão: há verdades que não se podem dizer ao povo, senão eles atacam o mensageiro, quem lhes diz a verdade e não os causadores dessa verdade.
Entrou na política como moralizador. Foi-lhe prejudicial?
Não, eu quando disse a verdade - eu disse que o Parlamento Europeu era um faz de conta. Porque é um Parlamento onde os deputados não têm iniciativa legislativa. É o único Parlamento do mundo e da história que está limitado a montante pelas propostas que lhe faz o Governo da UE [a Comissão]. E é o único órgão da UE legitimado pelo voto. Mas a jusante também, porque o que fizer tem que ser aprovado pelo Conselho. Isto é uma castração do próprio Parlamento.
É frustrante ser eurodeputado?
Há coisas muito boas: o que se ganha é excelente. Eu denunciei também os ordenados dos deputados. As pessoas reagiram dizendo: "se não gostas, deixa". como se eu estivesse a reclamar por receber tão bem! Não!
Mas ficou...
Que quer que lhe faça? É o povo que temos. São os jornalistas que temos em Portugal, atacaram quem divulgou, aquilo que todos os deputados silenciaram durante décadas.
E depois? Vai tentar ser eleito deputado à Assembleia da República ou dará o projecto por concluído?
Respondo-lhe com uma frase que vi no cinema, de um grande actor que era Humphrey Bogart, no Casablanca: "Nunca faço planos a tão longo prazo". Isso ainda é muito longe. Como lhe disse, depende do partido, das pessoas com quem me comprometi. Mas a minha vontade era libertar-me disto, destas coisas, para realizar as tais coisas do quotidiano de um homem que têm um grande peso na felicidade.