24 jan, 2018 - 09:00
"Mais de 100 mortos em menos de quatro meses não mais sairão do meu pensamento, como um peso enorme na minha consciência e no meu mandato presidencial. Estas mortes representam a fragilização dos portugueses." A frase foi dita por Marcelo Rebelo de Sousa, dois dias depois dos incêndios de 15 de Outubro, e revela bem a maior preocupação, o tema mais marcante destes primeiros dois anos de mandato como Presidente da República.
A tragédia influenciou de tal modo a sua actuação que, após quase dois anos de uma sintonia quase perfeita com o Governo, Marcelo mudou a agulha e deixou bem clara a sua exigência de "um novo ciclo" com acção urgente.
Numa comunicação ao país, pediu uma clarificação do apoio ao Governo no Parlamento, aconselhou um pedido de desculpas, sugeriu mudanças de equipas e prometeu usar todos os seus poderes para assegurar que o Estado cumpre o dever de protecção das populações. Foi, aliás, na sequência desta intervenção que a ministra da Administração Interna, Constança Urbano de Sousa, se demitiu, depois de ter resistido a meses de contestação.
O chefe de Estado classificou os fogos de Junho e de Outubro, que no seu conjunto mataram mais de cem pessoas, como "o ponto mais doloroso" da sua presidência e prometeu nunca mais largar o assunto, tendo decidido passar o Dia de Natal e o final do ano nos municípios mais atingidos, o que só não aconteceu porque teve de ser operado de urgência a uma hérnia umbilical.
Dois anos de afectos
Eleito há dois anos, Marcelo Rebelo de Sousa tem sido um Presidente popular e interventivo, no centro da vida política, com presença mediática e uso constante da palavra, analisando e deixando recomendações sobre os temas da actualidade.
O ex-comentador político e professor universitário de Direito, que completou 69 anos em Dezembro, foi eleito Presidente da República a 24 de Janeiro de 2016, à primeira volta, com 52% dos votos, e tomou posse em 9 de Março. Foi logo a seguir às eleições presidenciais que Marcelo deixou bem claros os princípios do seu mandato: "Afectos, proximidade, simplicidade e estabilidade."
Habituado a dar a sua opinião sobre os mais variados assuntos, manteve a frequência das declarações públicas. Nos primeiros 100 dias em funções, teve mais de 250 iniciativas e falou praticamente todos os dias, em regra várias vezes ao dia.
Conselho de Estado na rotina do Presidente
Sempre envolvido no acompanhamento permanente e activo da governação e da actividade parlamentar, Marcelo criou a rotina de ouvir, de três em três meses, os partidos com assento na Assembleia da República, as confederações patronais e sindicais e o Conselho de Estado.
Em menos de dois anos, Marcelo convocou oito vezes o Conselho de Estado, quando Cavaco Silva, em dez anos, só ouviu o seu órgão de aconselhamento uma dúzia de vezes.
Ainda não recorreu ao Tribunal Constitucional, mas utilizou seis vezes o poder de veto político, em relação a dois decretos do Governo, sobre acesso a informação bancária e o estatuto da GNR, e a quatro diplomas do parlamento, sobre gestação de substituição, os transportes do Porto e de Lisboa e, mais recentemente, as alterações ao financiamento dos partidos.
Os acordos de regime sectoriais têm sido uma das suas causas, embora defenda, ao mesmo tempo, a necessidade de um Governo e de uma oposição fortes, que sejam espaços alternativos.
Europa primeiro
No plano da política externa, o Presidente tem privilegiado a Europa. Só em 2017 visitou, por exemplo, Madrid, Bruxelas, Andorra, Barcelona, Atenas e Malta. No total dos dois anos de mandato, fez mais de 30 deslocações ao estrangeiro.
Além disso, inaugurou a prática de dividir em duas partes as cerimónias do Dia de Portugal. Em 2016, a festa fez-se entre Lisboa e Paris. No ano seguinte, entre o Porto e as cidades brasileiras de São Paulo e Rio de Janeiro. No próximo 10 de Junho está agendada uma visita aos Estados Unidos.
Em território nacional, no último ano, destacam-se as suas visitas às nove ilhas da Região Autónoma dos Açores, que percorreu em duas etapas, e as sucessivas deslocações aos locais dos maiores incêndios, onde contactou de perto com as populações atingidas.