11 mar, 2018 - 02:25 • Eunice Lourenço
Era suposto o 27º Congresso do CDS ser de aclamação de Assunção Cristas como líder do partido e da confirmação da sua estratégia de líder da oposição. E está a ser. Mas também está a dar sinais de problemas por resolver e que podem emperrar a máquina bem oleada que o CDS parece começar a ser.
A presidente do CDS apresentou-se ao Congresso com uma ambição descomplexada, deixando bem claro que já se considera líder da oposição e pretende um dia, que já não lhe parece assim tão longe, liderar um projeto de governo. A ambição de Assunção foi secundada por vários dirigentes, como Adolfo Mesquita Nunes, que já em entrevista à Renascença e ao Público tinha dito que o CDS devia ter a oportunidade e a ambição de liderar uma alternativa de Governo.
Essa ambição, no entanto, não é inteiramente seguida pelo congresso, pela massa de militantes que se habituou a ter uma relação de alguma subordinação ao PSD e parece ter algum receio em incomodar demasiado o sempre tão maior vizinho do lado.
Há como que um temor do partido em relação à ambição da líder que se manifestou inclusive na forma como o Congresso reagiu ao seu discurso. Quando Assunção lembrou os resultados das eleições autárquicas em Lisboa, em que conseguiu ficar à frente do PSD os militantes aplaudiram com entusiasmo. Mas quando disse claramente que quer “disputar a primeira liga” e que o CDS seja “o primeiro partido no espaço do centro direita”, os militantes quase que não reagiram, como se não soubessem se devem recear ou apoiar a ambição da líder ou como se sofressem de uma espécie de “Síndrome de Estocolmo” partidária.
A relação com o PSD não está de todo resolvida. Pode-se mesmo dizer que CDS e PSD estão numa “relação complicada”. Assunção Cristas tentou resolver pelo silêncio, ignorando completamente o PSD no seu discurso deste sábado. Um silêncio que não pode repetir este domingo quando Rui Rio estiver na sala para o encerramento do Congresso. Mas o mesmo não fizeram outros atuais e antigos dirigentes.
António Pires de Lima, ex-ministro do governo de coligação, subiu ao palco de Lamego para lembrar que o PSD é um “partido amigo”. Nuno Melo fez questão de mandar “um grande abraço” a Pedro Passos Coelho e dizer que o CDS é oposição ao PS e combate sobretudo o Bloco de Esquerda. Adolfo Mesquita Nunes diabolizou essa esquerda. Mas João Almeida, que até fez parte do mesmo Governo que Pires de Lima, acusou o PSD de ser culpado por o resultado de 2015 não ter sido o suficiente para continuarem a governar.
E, nos bastidores, entre dirigentes e alguns militantes, não é disfarçável o gozo interno com que vão seguindo as vicissitudes do início de liderança de Rui Rio, como o caso dos alegados dados falsos do currículo de Feliciano Barreiras Duarte, secretário-geral do PSD, divulgados este sábado pelo semanário “Sol”.
De tenda a casa
Se tem um complexo interno e uma relação complicada ainda por resolver, Assunção Cristas parece estar a conseguir resolver outro problema antigo do CDS que Maria José Nogueira Pinto designava por “tenda de campanha”.
Aquela dirigente do partido dizia que o CDS parecia uma tenda de campanha que ora se montava aqui, ora ali, consoante os resultados eleitorais e a sucessão das lideranças, desbaratando eleitorado, apoiantes e até dirigentes a cada mudança. Não há partido que tenha perdido tantos antigos líderes pelo caminho.
O que a liderança de Assunção e este congresso parecem mostrar é que é possível haver espaço no CDS para liberais, como Adolfo Mesquita Nunes, europeístas praticantes como Diogo Feio, antigos eventuais adversários como Nuno Melo, conservadores como Filipe Anacoreta Correia, ainda mais conservadores, como Abel Matos Santos, democratas-cristãos como uma grande maioria se reclama e como se define Adriano Moreira, o fundador que resolveu a questão ideológica logo no início do congresso.
Saber se Assunção consegue transformar a tenda de campanha em “casa comum da direita”, vencendo complexos, preconceitos e ultrapassando relações complicadas é que o veremos nos próximos meses. A resposta não depende só dela – depende em grande parte do desempenho do vizinho do lado -, mas a líder do CDS tem mostrado que tem condições e “lata” suficientes para tentar.