07 mai, 2018 - 10:51
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O presidente da Associação Sindical de Juízes Portugueses (ASJP), Manuel Ramos Soares, aponta a crónica falta de meios como principal razão para a lentidão da justiça e ao sentimento de impunidade, mas sublinha, também, que em matéria de combate à corrupção há muito trabalho feito.
“Que há um sentimento de impunidade há, mas eu pergunto: qual foi a instituição do Estado que mais fez no combate à corrupção nos últimos 10 ou 20 anos? Não foi o Ministério Público, as polícias de investigação e os tribunais que durante anos e anos lutam com falta de meios e pedem meios no poder político para serem mais eficazes?” questiona, na Manhã da Renascença.
“Não foram estas instituições que fizeram mais para combater este sentimento de impunidade? Eu acho que sim”, reforça o presidente da ASJP.
Manuel Ramos Soares reagia à preocupação demonstrada pelo Presidente da República, na entrevista à Renascença e ao “Público”, durante a qual defende uma renovação do sistema e o fim dos megaprocessos.
Marcelo Rebelo de Sousa diz que “o tempo da justiça não pode ser tão demorado” que ponha em causa o Estado de Direito democrático.
O presidente da Associação Sindical de Juízes volta a questionar: “Quantos anos nós ouvimos o Ministério Público, nos DCIAPS, onde estão concentradas as investigações mais importantes, a pedir meios, a pedir perícias, a pedir auxílio técnico? Anos e anos ouvimos esta conversa. Agora, finalmente, foram atribuídos meios e nós vemos que o Ministério Público e as polícias de investigação estão muito mais eficientes. E amanhã, quando estes processos chegarem a tribunal – estes processos muito complexos – vamos precisar de meios também para os tribunais”, avisa.
Manuel Ramos Soares explica: “porque, por exemplo, desde 2013 está previsto que haja nas comarcas, nos tribunais, gabinetes de apoio técnico com assessores para os juízes e nós não temos. Imagina amanhã três juízes a julgar o processo Marquês ou um processo dessa dimensão sem apoio técnico?”.
Do lado dos magistrados do Ministério Público, António Ventinhas aponta o dedo ao poder político para explicar a lentidão na justiça.
“Temos o pacto da justiça, que foi aprovado no início de janeiro e não temos visto visto grande desenvolvimento. Ainda agora nos foi submetida uma lei de organização do sistema judiciária em que não existe qualquer proposta que tenha sido acolhida relativamente ao pacto da justiça”, afirma à Renascença, concluindo que o problema a é não haver, muitas das vezes, “acolhimento do poder político das medidas que são propostas”.
Quanto à existência de megaprocessos, de que Marcelo também fala, o presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público diz que há casos em que tem de ser mesmo assim.
“Porquê? Porque todos os factos estão ligados entre si. Não é possível partir o processo em processos menores, senão perde-se todo o sentido. Imaginemos que há um grande circuito de dinheiro que passa por inúmeras pessoas. Não tem lógica partir o processo em tantas partes quanto o número de transações”, explica.
Mas “há outros processos em que, se é possível autonomizar algumas das suas partes, deverão ser autonomizadas. No que diz respeito à operação Marquês, foram extraídas 15 certidões, ou seja, deu origem a 15 novos processos”, indica ainda.
Na entrevista à Renascença e jornal “Público”, o Presidente da República defende uma renovação do sistema de justiça para que se chegue mais rapidamente a decisões, nomeadamente sobre casos de corrupção, e considera que a situação já é crítica.
Marcelo Rebelo de Sousa não se pronuncia sobre casos em concreto, mas manifesta preocupação com a excessiva diferença entre o tempo mediático, o tempo político e o tempo judicial.
Deixa ainda transparecer uma certa desilusão pela demora nas consequências práticas do pacto da justiça que o próprio fomentou.