17 jan, 2019 - 20:02
O presidente do PSD, Rui Rio, garante que não deserta do partido, coragem não lhe falta para os próximos combates eleitorais e acusa Luís Montenegro de empurrar o partido para um “espetáculo pouco dignificante”. Rui Rio falava esta quinta-feira no discurso de abertura do Conselho Nacional do PSD que vai votar uma moção de confiança à sua liderança.
Discurso de Rui Rio, na íntegra
Antes de me candidatar a presidente do PSD há um ano atrás, tinha já sido desafiado para o fazer por duas outras vezes.
Não o fiz, porque sempre entendi que os mandatos são para cumprir e os compromissos com o eleitorado para honrar na sua plenitude. Estava, na altura, em funções para as quais tinha sido eleito e, em nome dos meus princípios, jamais as poderia abandonar.
Foi assim com os portuenses ontem. É, assim, hoje, com os militantes do PSD. Será assim, amanhã com os portugueses, se esse for o seu desejo.
É por isso, que em coerência com estes meus valores, eu também sempre respeitei os resultados eleitorais. Nunca andei em manobras de corredores parlamentares ou jornalísticos, conspirando contra quem é legitimamente eleito. Muito menos, seria capaz de boicotar a atividade de quem foi democraticamente escolhido para trabalhar, para, no momento seguinte, poder reclamar que tudo está mal.
Em português, a isso, chama-se hipocrisia, e essa é coisa que, seguramente, não faz parte do meu rol de defeitos.
A razão pela qual hoje aqui estamos deve-se ao facto de me ter sido lançado um repto para abandonar as funções para que fui democraticamente eleito, e convocar novamente eleições diretas para a liderança do PSD. Um repto para eu desertar.
A principal razão aduzida é a de que o partido está mal nas sondagens.
Todos, ou quase todos, sabemos bem como são feitas uma grande parte das sondagens que, por aí, vão circulando.
Se as fossemos seguir, o PSD e Pedro Passos Coelho teriam tido uma derrota estrondosa em 2015. Aconteceu o contrário.
Em 1991, quando fui eleito deputado pela primeira vez, e o PSD teve, com Cavaco Silva, a maior maioria da nossa história recente, com mais de 50% dos votos, o Expresso noticiava, pouco tempo antes, que o PS de Jorge Sampaio iria ganhar as eleições. Curiosamente, a responsabilidade de tal habilidade era, à data, de uma empresa cujo corpo acionista não diferia muito do da empresa que hoje trabalha para esse mesmo jornal.
Em 1986, quando Mário Soares foi eleito Presidente da República, as doutas sondagens davam-lhe na pré campanha eleitoral uns módicos 8%. Uma percentagem, que à luz da lógica do que aqui estamos a debater, arrumaria com qualquer possível argumentação em favor da concretização de uma candidatura.
Eu próprio, se me candidatasse a sondagens, teria apenas ganho uma das diversas eleições que já disputei. Nem as últimas diretas teria conseguido ganhar, muito menos, as primeiras a que concorri. Nessas verificou-se, desde logo, a minha fraca aptidão para ganhar sondagens, já que, nesse campeonato, apenas consegui um máximo de 19%, contra os 44% que obtive nas eleições em causa. Sempre fui muito melhor em eleições do que em sondagens.
Mas há quem pense diferente, particularmente, dentro do nosso partido. E compreende-se que assim seja, porque não faltam os que, ao contrário de mim, são muito melhores em sondagens do que em eleições.
Se olharmos para alguns resultados eleitorais, particularmente nas últimas autárquicas, percebe-se bem, o incómodo de alguns em falar de resultados de eleitorais. Para esses, é realmente, preferível falar em sondagens, e nelas sustentar a argumentação que mais lhe convier, tendo em vista, em cada momento, os fins pretendidos.
Quando há 11 meses esta CPN tomou posse, o ponto de partida não eram inquéritos de opinião, feitos de forma mais ou menos séria. O ponto de partida eram, e são, os resultados. E esses, deram-nos votações de 11% nos principais municípios do País e um resultado globalmente baixíssimo à escala nacional.
Mesmo, se olharmos, ao resultado de 2015, em que tivemos 36% em coligação, se expurgarmos a parte do CDS, que em 2011 tinha tido 11%, ficamos com valores da ordem dos 25 a 26%. Este é que é um dos pontos de partidas, não são as sondagens, que sabemos feitas, tantas vezes, a gosto do freguês.
Acrescentam os defensores da repetição das diretas que eu agora não as aceito, por medo, por falta de coragem e por estar agarrado ao lugar.
Não foi seguramente a mim que me faltou a coragem. Faltou, sim, a quem há um ano atrás, na altura própria, não teve o arrojo de se assumir, poupando o PSD a este espetáculo pouco dignificante que estamos a dar aos portugueses.
Como é público e notório há muitos anos, coragem foi coisa que nunca me faltou. Estou, aliás, à espera de, pela primeira vez, perder umas eleições, enquanto que os que me desafiam estão na posição inversa: estão à espera de conseguir ganhar uma eleição, pela primeira vez na vida.
As razões pelas quais digo NÃO ao desafio lançado também não passam pela acusação fácil e primária de que estou agarrado ao lugar.
Com a idade que tenho, com o curriculum político que já consegui, com a situação profissional que tinha e com a enorme responsabilidade que, não só este cargo, como principalmente o de Primeiro-ministro, implicam, não foi, seguramente, por nenhuma outra razão que me candidatei, que não seja a disponibilidade para servir o partido e, particularmente, o País.
Nunca coube e, muito menos cabe hoje em mim, qualquer ambição pessoal ou qualquer vaidade especial. Disso, sabem bem todos os que me conhecem.
O mais fácil e mais cómodo seria sair e voltar as costas às dificuldades. Mas tal atitude revelaria uma irresponsabilidade e uma falha grave aos compromissos que assumi perante todos os militantes em geral, e perante os que em mim votaram e em mim acreditam, em particular. Foi, como aqui comecei por dizer, atitude que nunca constou das minhas opções ao longo da vida.
Tenho como certo que tomar a decisão de enredar, outra vez, o partido numa longa campanha interna, seria colaborar numa irresponsabilidade de consequências totalmente imprevisíveis.
Com eleições europeias, regionais e legislativas este ano, e com as europeias a realizarem-se dentro de uns escassos 4 meses, não se consegue entender semelhante insensatez.
Aliás, são aqueles que dizem que temos de falar mais para fora, que, agora, defendem que o PSD se dedique a uma luta interna, que necessariamente nos vai dividir, e deixar os nossos adversários a fazer campanha eleitoral sozinhos.
Ainda hoje li, estupefacto, um proto candidato criticar o partido, numa passagem de uma sua entrevista, por ainda não termos apresentado nomes e ideias para as eleições europeias. Curiosamente, o mesmo entrevistado, defende logo a seguir, umas linhas adiante, que o partido deve, de imediato, voltar a mergulhar numa disputa interna, a tão pouco tempo das referidas europeias. Precisamos de mais coerência e mais maturidade nos comportamentos e nas criticas. Dizer mal por dizer, não demonstra capacidade para assumir tão grandes responsabilidades.
Pior ainda: alguns dos que defendem este tsunâmi partidário são os mesmos que antes das últimas diretas defenderam e aprovaram um período de 4 meses para a realização do Congresso Nacional – dizendo que o assunto era sério e que a democracia exigia um debate com o devido tempo – que, agora, dizem que, com menos de metade desse mesmo tempo se conseguiria realizar tarefa idêntica.
Dois pesos e duas medidas. Uma falta de coerência que, de certeza, não se deverá, a uma especial obediência a qualquer interesse de natureza partidária e, muito menos, altruística.
A proposta que nos é feita é a de fazer um frete ao Partido Socialista, abrindo-lhe as portas a uma vitória eleitoral fácil. E é, também, um aliciante convite ao nosso eleitorado para se encaminhar para a abstenção e para as alternativas partidárias à nossa direita.
Esta sessão do Conselho Nacional, que temos de realizar por força da confusão e da instabilidade gerada, é ela própria um espetáculo de prime time para António Costa, que, se for um homem educado, terá de, necessariamente, agradecer a alguns companheiros nossos, pelo serviço de excelência que lhe estão a prestar.
Aceitar o inusitado repto agora lançado, seria, também, prejudicar toda a estabilidade futura do partido.
Porque razão se aceitariam agora novas eleições internas, quando, ainda em julho passado, um militante houve, que também se anunciou disponível e desejoso de concorrer a idêntico ato eleitoral?
E, se daqui a três meses, um qualquer outro companheiro lhe apetecer eleições, porque razão havemos de dizer que não, áquilo que antes tínhamos dito que sim?
A estabilidade é um valor decisivo para obter a confiança dos portugueses e não é, por isso, defensável que um grande partido como o PSD, passe a ter uma forma de funcionamento exatamente ao contrário do que o povo legitimamente lhe exige.
Mas demitir esta Comissão Política Nacional, eleita democraticamente há uns escassos 11 meses, a menos do meio do seu mandato, seria, também, não lhe dar a oportunidade de poder trabalhar com um mínimo de condições para tal.
Desde o primeiro dia da sua tomada de posse que o clima de guerrilha interna não parou. Aliás, começou até no dia anterior à sua tomada de posse. Logo a 17 de fevereiro, há precisamente 11 meses – um dia antes de iniciar funções – já esta CPN tinha potenciais candidatos a líder, que, apesar de não o terem sido, já discordavam daquilo que ainda nem sequer tinha começado. Não é a postura ética mais recomendável.
A permanente guerrilha que temos vivido e o constante boicote à atividade dos órgãos democraticamente eleitos, é o expoente máximo do desrespeito pelos militantes do partido e, mesmo, pelos portugueses em geral; que esperam legitimamente do PSD a construção de uma alternativa estável e credível ao Governo do PS.
Não é justo, nem seria correto, chumbar a moção de confiança à CPN, depois de ela nunca ter tido as condições de trabalho que a qualquer direção nacional se devem dar.
Já aqui disse, mais do que uma vez, que, primeiro, as eleições perdem-se. Só depois, se podem ganhar.
Mais depressa do que seria de esperar, o Partido Socialista colocou-se em posição de poder perder as eleições.
A degradação dos serviços públicos, o abrandamento da economia, os desentendimentos no seio da maioria parlamentar (com crescentes criticas do Partido Comunista e do Bloco de Esquerda ao Governo), a generalização do descontentamento por parte das pessoas, a proliferação de greves por todo lado e nos mais diversos setores, e a crescente perceção dos logros da governação e do discurso político a ela associado, tornam evidente que o PS pode perder as próximas eleições.
Está, pois, cumprido o mais difícil. Está feito aquilo que não depende de nós. Falta, pois, fazer apenas o que depende do PSD.
Se já há todas as condições para o PS perder, temos agora nós de criar as condições para ganharmos. Temos de ser capazes de fazer o que só depende de nós; construir uma verdadeira alternativa à governação socialista.
Com a guerrilha que temos tido. Com terramotos políticos, como este, que hoje aqui estamos a resolver, não será possível atingir aquilo que está perfeitamente ao nosso alcance e é nosso dever.
No momento, em que iniciamos este exigente ano eleitoral e em que, por isso, se impõe agravar a oposição ao Governo, não faz qualquer sentido fazer exatamente o contrário e lançar o partido numa disputa eleitoral interna com todo o desgaste que lhe é inerente.
Senhor Presidente, senhoras e senhores conselheiros
Aquilo que hoje aqui se pede é maturidade e sentido da responsabilidade.
Responsabilidade, que passa por não facilitar a vida aos nossos adversários, acentuar a oposição ao Governo, e construir uma alternativa de governação ao Partido Socialista.
Se o caminho seguido for esse, acredito que a vitória está ao nosso alcance.
Se for o outro, o da instabilidade e o do afundamento nas questões internas, é mais do que claro que a derrota será certa e o definhamento do partido poderá ser ainda superior ao que experimentamos nas últimas eleições autárquicas.
Se o partido decidir caminhar nesse sentido, tenho a consciência tranquila, porque não será por ato meu que o tal acontecerá.
Cabe, pois, às senhoras e senhores conselheiros assumir com coragem e frontalidade a responsabilidade de decidir democraticamente o futuro do partido e, em larga medida, do País.
Da minha parte, limito-me agora, a esperar, e, no fim, como sempre, a aceitar democraticamente a superior decisão deste Conselho Nacional.