12 mar, 2019 - 23:47 • Lusa
O ex-secretário-geral dos serviços de informações portugueses Júlio Pereira aponta, indiretamente, um erro aos militares pela forma como reagiram ao furto de Tancos, afirmando que deveriam, primeiro, ter avisado as forças policiais e as "secretas".
A afirmação foi feita esta terça-feira por Júlio Pereira, secretário-geral do Sistema de Informações da República Portuguesa (SIRP) à data do furto de Tancos, em junho de 2017, na comissão parlamentar de inquérito às responsabilidades políticas do furto de Tancos, hoje à tarde.
Questionado pelo CDS, sobre a reação das autoridades militares e o que se seguiu ao furto, Júlio Pereira respondeu o que teria feito se estivesse no lugar dos militares.
"Se estivesse na situação dos militares quando aconteceu isto em Tancos, a primeira coisa que faria era dar conhecimento aos serviços de informações e às polícias. Até porque, quando esse equipamento estava a ser movimentado, talvez houvesse ainda a possibilidade de detetar alguma coisa relacionada com o furto. Não foi isso que aconteceu", afirmou.
Noutra parte da audição, o antigo secretário-geral do SIRP já havia dito que os responsáveis militares deveriam ter alertado as forças de segurança e serviços de informações, "em vez de inventariar" o material nos paióis.
Após o furto e o alerta que recebeu via Serviço de Informações de Segurança (SIS), que por sua vez soube através da comunicação social, os serviços fizeram o que estava previsto: acionar "as fontes" que têm no país para tentar obter mais alguma informação e alertar os "serviços congéneres".
De resto, Júlio Pereira, juiz conselheiro do Supremo desde que saiu do SIRP, em novembro de 2017, insistiu na tese de que foi uma boa opção os serviços não terem alterado o estado de alerta do país após o furto, mantendo-se em moderado.
Material pretendido por organizações criminosas coincidia com material roubado
Júlio Pereira revelou que 'secretas' estrangeiras partilharam uma lista de armamento pretendido por organizações criminosas e que coincide com o material furtado.
Já no final da audição, tanto o PSD como o CDS-PP levantaram a questão da "lista de compras", como era conhecida a lista fornecida por serviços estrangeiros quanto a material que organizações criminosas estrangeiras estariam interessadas em comprar, incluindo em Portugal, e que foi mencionada numa reunião da Unidade de Coordenação Antiterrorista (UCAT), após o furto de Tancos, em 2017.
Na reunião da comissão parlamentar de inquérito ao furto de Tancos, hoje à tarde, dois deputados, Telmo Correia (CDS-PP) e Matos Rosa (PSD), referiram-se a essa lista, que, por sua vez, consta numa ata da reunião da UCAT, de 30 de junho de 2017, como tendo sido mencionada pelo diretor adjunto do Serviço de Informações de Segurança (SIS).
Na resposta, mesmo no fim da reunião, Júlio Pereira, antigo secretário-geral do SIRP, afirmou apenas: "Escapou-me."
"Era uma lista que batia com a lista do material roubado", insistiu Matos Rosa, ouvindo de resposta de Júlio Pereira que "o SIS não tinha conhecimento dessa lista". "De que eu tenha conhecimento", sublinhou Júlio Pereira.
O antigo chefe dos serviços de informações declarou ainda desconhecer, através de informações dos serviços, por exemplo, do caso de um automóvel que foi identificado junto à porta da Brigada de Reação Rápida, em Tancos, com alguém a tirar fotografias do local, e que, segundo deputados da comissão, foi identificado pelo CISMIL - Centro de Informações e Segurança Militares.
Júlio Pereira secundarizou eventuais indícios de o material ter sido furtado para "uso de terroristas", uma hipótese que admitiu "foi colocada, claro", "mas que não estava na primeira, na segunda nem na terceira linha de preocupações".
Igualmente relativizada foi a eventual ligação do furto a Tancos com crimes idênticos ocorridos, por essa altura, em França e em Israel, assim como disse não ter elementos para o ligar aos das pistolas Glock, da PSP.
Júlio Pereira garantiu, por outro lado, que os Serviços de Informação de Segurança, responsável pela análise destas matérias, não teve qualquer elemento nem informação sobre a eventualidade de estar a ser preparada qualquer ação que levasse a um roubo ou furto de material militar.
Se tivesse informação concreta nesse sentido, "as Forças Armadas teriam sido informadas" pelos canais próprios, garantiu.
O furto do material militar, entre granadas, explosivos e munições, dos paióis de Tancos foi noticiado em 29 de junho de 2017 e parte do equipamento foi recuperado quatro meses depois.