03 abr, 2019 - 18:28 • José Pedro Frazão com Redação
Esta quarta-feira, no programa Casa Comum, da Renascença, o socialista Fernando Medina afirmou ser a favor da exclusividade dos deputados. "Sou defensor, aliás, de uma mudança profunda relativamente ao quadro do exercício da função de parlamentar, de deputado, e privilegiaria a exclusividade da função de deputado”, explicou.
Para o autarca lisboeta, a solução tem desafios como a profissionalização da politica e o peso dos diretórios. Mas também obriga a olhar de frente para questão da reintegração dos deputados e da remuneração face ao regime de incompatibilidades.
"É uma solução que encerra em si também questões e dificuldades, nomeadamente as associadas à profissionalização da carreira política e ao peso dos diretórios dos partidos na escolha dos deputados. Mas eu acho que seria preferível, obrigando também a assumir de frente uma questão: é que ao assumir que as funções de deputado devem ser exercidas em exclusividade, é preciso tratar de forma adequada toda a questão da reintegração dos deputados e toda a questão da remuneração nos períodos de incompatibilidade que venham a decorrer do exercício da função de deputado – aliás, como têm hoje os membros da entidades reguladoras”, lembrou Fernando Medina.
O presidente da Câmara de Lisboa entende também que não pode haver exclusividade de deputados sem clarificar a reintegração e o regime de incompatibilidades. Caso contrário ,diminui a qualidade dos deputados e ficam aqueles que não conseguem fazer mais nada.
"O que não se pode pedir é a exclusividade no exercício da função de deputado e que, depois dos anos da função de deputado, a pessoa saia, não se sabe bem para onde, nem em que circunstancias, nem em que termos. Se não cuidarmos, a par da exclusividade, a reintegração e o regime de incompatibilidades, o que nós estaremos é a contribuir, de facto, para um abaixamento maior da qualidade daqueles que se dispõem ao exercício da função parlamentar – porque vão ver com isso a sua vida prejudicada, a não ser aqueles para quem a função de deputado significa o máximo daquilo que podem aspirar."
O PSD, com a abstenção do PS, relembre-se, alterou quinta-feira, à última hora, um artigo do estatuto dos deputados que lhes permite continuarem a pertencer a sociedades de advogados. Já os trabalhos da comissão de reforço da transparência iam a meio, na quinta-feira à noite, quando o deputado e coordenador do PSD, Álvaro Batista, entregou uma proposta manuscrita de alteração ao artigo 21.º que alterou o texto resultante da votação indiciária.
Na proposta entregue à última hora, os deputados passam a deixar de poder "intervir em qualquer uma das atividades" de consultor ou a emitir pareceres ou representar partes em processos a favor ou contra o Estado numa "sociedade civil ou comercial" em que preste serviço ou seja sócio. Por outras palavras, um deputado pode continuar a trabalhar ou a ser sócio de uma sociedade de advogados, por exemplo, desde que não intervenha naquele tipo de processos.
Outro artigo, também aprovado pelo PSD e CDS, com a abstenção do PS e contestado pelo PCP e pelo BE, permite que se, antes de ser eleito, um deputado já a trabalhar em "instituições, empresas ou sociedades de crédito, seguradoras e financeiras", pode continuar a fazê-lo.
Também no programa Casa Comum, o social-democrata Pedro Duarte não defende, neste momento, a exclusividade de deputados. Mas se houver alteração do estatuto, eventual redução de deputados e condições de reintegração, acredita que pode fazer sentido avançar para essa exclusividade.
"Nas atuais condições, não defendo a exclusividade. Mas havendo uma alteração do estatuto do deputado, uma verdadeira alteração do estatuto do deputado, eventualmente até reduzindo o número de deputados no Parlamento – que podemos ainda fazê-lo dentro do quadro constitucional vigente –, dando mais condições para o exercício da função e dando outro tipo de condições, até do ponto de vista da reintegração depois de um ex-deputado, eu admito que faça sentido darmos esse passo”, conclui.
Segundo Pedro Duarte, o processo de alteração do estatuto dos deputados começou mal. Será que os deputados querem enganar o povo? "Não sei se os deputados se querem enganar a eles próprios, se querem enganar o povo ou se estão só, pura e simplesmente, a fazer o “business as usual”. Portanto, quando não há uma solução boa para o caso, cria-se umas entidades administrativas que, ainda por cima, em matéria de natureza ética, acho que todos deveríamos ter o máximo cuidado e rigor relativamente a isso."
O comentador da Renascença critica o obscurantismo nesta discussão atual. Para ele, o PS mudou posições e não se percebe porquê.
"O processo como decorreu esta discussão no Parlamento nos últimos dias acho que não foi bonito. E digo isto porque isto parte de uma comissão de ética que está criada desde 2016 e, aparentemente, houve umas alterações de última hora, nomeadamente da posição do grupo parlamentar do Partido Socialista – com toda a legitimidade, não ponho isso em causa. Mas a perceção que se tem quando se está de fora é que, de facto, há algum obscurantismo em tudo isto, parece que se moveram umas forças e uns interesses de última hora em que a posição foi invertida assim um bocadinho por baixo do tapete”, disse.