10 mai, 2019 - 19:26 • Lusa com Redação
O Ministério Público considerou na acusação do caso das viagens pagas pela Galp no Euro2016 que o ex-secretários de Estado Rocha Andrade e Jorge Oliveira aceitaram os convites apesar de saberem que “a eles não tinham direito”.
O Ministério Público acusou 18 arguidos, incluindo dois ex-secretários de Estado e dois presidentes de Câmara (Álvaro Beijinha, Santiago do Cacém, e Nuno Mascarenhas, Sines), pelo crime de recebimento indevido de vantagem no caso das viagens pagas pela Galp no Euro2016 de futebol.
“Os arguidos Álvaro Beijinha, Nuno Mascarenhas, Fernando Rocha Andrade, João Bezerra da Silva [ex-chefe de gabinete], Jorge Oliveira, Susana Escária [gabinete ministerial] e Vítor Escária [assessor do Governo] atuaram com o propósito de aceitar os convites que lhe foram feitos por responsáveis da Galp, apesar de bem saberem que os mesmos apenas lhes tinham sido endereçados por forças das funções públicas que desempenhavam e que a eles não tinham direito”, diz a acusação.
No mesmo despacho, o Ministério Público sustenta que “mais sabiam que aqueles arguidos bem como Pedro Matias [do gabinete do ex-secretário de Estado João Vasconcelos, arguido já falecido] e Luís Vaz (da administração da ANA) que, desse modo, recebiam pacotes com um valor que era relevante e fora suportado pela Galp, seja através da sua aquisição seja por via do patrocínio concedido à Seleção Nacional de Futebol”.
No entender dos investigadores, sabiam ainda estes arguidos que “a aceitação de tais ofertas lhes permitiria presenciar, sem despenderem qualquer esforço ou quantia, eventos desportivos com enorme significado simbólico e histórico em datas em que a aquisição dos bilhetes e voos respetivos já se revelava bastante difícil”.
O Ministério Público conclui ainda que estes nove arguidos “atuaram ainda com o conhecimento de que, enquanto presidentes de câmaras municipais, administrador da empresa concessionaria de serviço público, secretários de Estado, assessores e chefes de gabinete de secretário de Estado lhe estava vedado aceitar quaisquer ofertas de entidades privadas.
Isto porque, adianta a acusação, o seu recebimento colocava em causa “a transparência, equidistância, isenção e objetividade com que deveriam desempenhar as suas funções, nomeadamente no que diz respeito às empresas que integravam o grupo Galp”.
Em tudo, conclui o Ministério Público, os arguidos atuaram de forma livre, deliberada e consciente, com conhecimento de que a sua conduta era proibida e punida por lei.
Nos autos é dito que competia à Autoridade Tributária, durante o mandato do arguido Fernando Rocha de Andrade (ex secretário de Estado das Finanças), exercer a ação de justiça tributária e assegurar a representação da Fazendo Pública junto dos órgãos judiciais.
O despacho refere que, em junho de 2016 encontravam-se pendentes nos tribunais tributários e em tribunais administrativos e fiscais 27 ações judiciais com o valor processual total superior a 69,5 milhões de euros, instauradas por empresas do grupo Galp contra o Estado português, em que eram suscitadas questões relacionadas com IRC, Imposto de Selo, fazendas demoradas, IMI e IVA, entre outros litígios.
Na acusação é ainda referido que a 03 de junho de 2016 “foi disponibilizada aos membros da comissão executiva da Galp Energia SGPS, SA, uma tabela com a menção de que, com os 49 pacotes de viagens e bilhetes destinados a convidados “institucionais/corporativos” iria ser despendida a quantia total de 47.791 euros”.
No grupo dos 18 arguidos figuram ainda vários responsáveis da Galp Energia SGPS SA e à Galp Energia SA, empresas que ofereceram as vantagens patrimoniais.
Segundo a acusação, os custos inerentes à deslocação, que incluíam viagens, refeições e bilhetes para os jogos, seriam integralmente suportados pela empresa petrolífera.
Este caso levou, em julho de 2017, à saída dos então secretários de Estado responsáveis pelas pastas da Internacionalização, Jorge Costa Oliveira, dos Assuntos Fiscais, Rocha Andrade, e da Indústria, João Vasconcelos, que morreu a 26 de março desde ano.
O MP pediu ainda a declaração de perda a favor do Estado dos valores correspondentes às vantagens usufruídas e não reembolsadas, bem como os correspondentes às vantagens prometidas, mas que foram recusadas ou reembolsadas, num total de 40.265 euros.
A Galp manifestou hoje "toda a confiança" de que os tribunais virão a reconhecer as suas razões no caso das viagens pagas pela empresa nos jogos do Euro2016, após tomar conhecimento do despacho de acusação do Ministério Público.
Em comunicado, a Galp alega que os convites foram feitos enquanto patrocinadora da seleção nacional de futebol, de acordo com a lei e com "as práticas e tradições seguidas no país ao longo dos anos, no âmbito de patrocínios empresariais".