11 jan, 2019 - 12:30 • Eunice Lourenço , Ricardo Vieira
“Desta vez decidi dizer ‘não’ [à liderança do PSD]. Se algum dia decidir dizer ‘sim’ não vou pedir licença a ninguém”. A 17 de fevereiro de 2018, no Congresso do PSD, em Lisboa, Luís Montenegro deixava claro a Rui Rio, o líder recém-eleito, que estaria ali ao virar da esquina para um eventual confronto. Passado menos de um ano, esta sexta-feira, no Centro Cultural de Belém, Montenegro vai desafiar o presidente do PSD em funções para uma disputa em que não se quis meter há um ano.
Luís Montenegro foi um dos nomes possíveis do chamado "passismo" para disputar as diretas do ano passado com Rui Rio. Os herdeiros e "órfãos" de Passos Coelho procuravam uma cara e um nome que não deixasse Rio sozinho na corrida. Mas Montenegro, como Paulo Rangel, não quis correr o risco de avançar.
Para muitos, foi uma decisão calculista: achou que não ganhava e, mesmo que ganhasse, não conseguiria ganhar as legislativas de 2019. Preferiu que Rio ficasse no partido e tentaria conquistar o PSD depois de 2019, para tentar conquistar o país após uma próxima legislatura de liderança socialista.
O próprio Montenegro chegou a defender que Rui Rio deveria ir a eleições. Foi "andando por aí", mantendo participação pública, com um programa semanal na TSF e comentários na TVI.
Na quarta-feira, o social-democrata de Espinho mostrou que estava a ficar com pressa. "Em breve, muito em breve, falarei sobre o estado do PSD, falarei mesmo sobre o futuro do PSD porque entendo que este estado de coisas tem, efetivamente, de acabar. Isto tem que mudar, o PSD assim não vai conseguir afirmar-se”, disse, na TSF.
Aos 45 anos - nasceu a 16 de fevereiro de 1973 -, Luís Montenegro tenta fazer a Rio o mesmo que António Costa fez a António José Seguro: um assalto ao poder a meio do mandato, apesar de "juras" de que nunca o faria, como numa entrevista concedida há menos de um ano.
Há, contudo, algumas diferenças. Uma é de tempo: Seguro já tinha mais tempo de liderança socialista e tinha ido a eleições (europeias, com um resultado “poucochinho” como lhe chamou Costa). A outra de currículo: Costa já tinha sido quase tudo na política portuguesa: ministro de várias pastas, líder parlamentar, presidente da Câmara de Lisboa, enquanto Montenegro exerceu o seu mais alto cargo político como líder parlamentar do PSD.
Advogado, Montenegro começou na estrutura partidária como presidente da concelhia de Espinho da JSD. Foi eleito deputado pela primeira vez em 2002, por Aveiro, e, em 2010, chegou à direção do grupo parlamentar como um dos “vices” de Miguel Macedo. Pelo meio, em 2005, tentou conquistar a Câmara de Espinho, mas foi derrotado pelo socialista José Mota.
Em 2011, quando Passos Coelho venceu as legislativas, Luís Montenegro salta para a ribalta como o escolhido para a liderança parlamentar. Foi a cara e a voz do PSD no Parlamento durante os anos da "troika" e nos primeiros anos da chamada “gerigonça”. Várias vezes lhe coube o frente-a-frente com António Costa nos debates quinzenais.
Em fevereiro de 2014, na reta final do programa de resgate, proferiu uma das suas frases mais célebres, em entrevista ao "Jornal de Notícias": “Eu sei que a vida quotidiana das pessoas não está melhor, mas não tenho dúvidas que a vida do país está muito melhor do que em 2011”.
Saiu da liderança da bancada em julho de 2017, ao fim de seis anos e três mandatos consecutivos. Ou seja, saiu por limite de mandatos, sendo substituído por Hugo Soares. Meses depois, na sequência do resultado das eleições autárquicas de 2017, Pedro Passos Coelho deixou a presidência do PSD e os olhos do "passismo" foram-se voltando para Montenegro, visto por muitos como o sucessor natural.
Há, no PSD, quem o considere não um sucessor de Passos Coelho, mas uma criação de Miguel Relvas. Acusam-no de não ter currículo, de não ter vida profissional para além da política e, até, de nunca ter lido um livro até ao fim.
Como deputado, contudo, viu-se envolvido numa polémica relacionada com a sua vida profissional, por ser proprietário de 50% do capital social da empresa "Sousa Pinheiro e Montenegro", a sua firma de advogados que, entre 2014 e 2017, conseguiu seis contratos por ajuste direto com a câmara de Espinho e outro dois com a de Vagos, ambas presididas por social-democratas.
O Estatuto dos Deputados não permite que os parlamentares tenham mais do que 10% em empresas fechem contratos com o Estado. Na altura, Montenegro defendeu-se, alegando que a advocacia é uma profissão liberal que está excecionada no Estatuto.
No congresso do PSD que consagrou Rui Rio e em que foi eleita a sua direção, Montenegro disse que se ia dedicar à advocacia e à família. Passados dez meses, mudou de ideias e não quer sequer esperar por outubro para ver como Rui Rio funciona nas urnas.