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Entrevista Público/Renascença

Marco António Costa: “Teria sido útil haver um refrescamento no PSD após as europeias”

20 jun, 2019 - 00:00 • Paula Caeiro Varela (Renascença) e Sofia Rodrigues (Público)

O presidente da comissão parlamentar de Defesa Nacional admite que o PSD foi “inábil” a gerir a crise dos professores e espera agora que Rui Rio apresente um programa eleitoral “reformista”.

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Marco António Costa: “Teria sido útil haver um refrescamento no PSD após as europeias”
Marco António Costa: “Teria sido útil haver um refrescamento no PSD após as europeias”

Marco António Costa, ex-vice-presidente de Passos Coelho, foi deputado nas últimas três legislaturas e defende uma reforma profunda da forma de funcionamento do Parlamento.

Dá por encerrada a sua vida política na próxima legislatura?
Já tinha anunciado há algum tempo a minha intenção de cessar a minha atividade como parlamentar. Só não o fiz mais cedo porque entendi que a questão que surgiu relativamente a Tancos e todo o desenrolar do processo exigiria que houvesse um acompanhamento.

Vai mudar de vida ou criar distância da atual direção do PSD?
Eu não disse que queria sair da vida política, disse que não iria continuar a exercer funções de deputado. Já fiz três legislaturas como deputado e entendo que está na hora de me dedicar a fazer outras coisas. Tenho a minha atividade profissional como advogado, mas mais do que isso quero continuar a trabalhar no plano político noutro âmbito de outra forma. Não saio por estar em conflito com ninguém nem por estar com mal com a vida política nem com a minha vida. Não desejo nem pretendo transmitir uma mensagem de que estou a fazer um afastamento.

Durante a campanha para as europeias, disse acreditar num bom resultado do PSD e do CDS, mas isso não aconteceu. O que correu mal?
Julgo que inevitavelmente a questão dos professores teve uma influência muito forte. O PSD tem de ponderar fortemente um conjunto de decisões que tem tomado que o têm descaracterizado. De alguma forma, com razão ou sem razão, a interpretação que a sociedade portuguesa tem feito destes posicionamentos do PSD, contribui para uma confusão. Dou vários exemplos: Os professores e mais recentemente a aprovação do fim das taxas moderadoras. Eu votei disciplinadamente essa decisão, mas não a compreendo e tenho as maiores reservas. Esta nova posição que eu vi do presidente do partido falar sobre o SIRESP e felicitar o Governo pela coragem. Eu não vejo nenhum tipo de coragem do Governo em tomar esta atitude. Vejo o Governo continuar a nacionalizar empresas sem o mínimo de justificação.

O PSD está a dar sinais contrários ao eleitorado e isso contribuiu para o resultado nas europeias?
Há vários fatores. Seria também redutor dizer que foi apenas a questão dos professores. Talvez a nacionalização da campanha e uma certa pessoalização de ataques ao primeiro-ministro não seja...as pessoas não gostam, talvez não tenha sido a melhor opção por parte de Paulo Rangel. Gostava de ressalvar que o PSD, do ponto de vista essencial, relativamente ao seu posicionamento sobre os professores foi corretíssimo.

Em que sentido?
O PSD disse que, para haver qualquer tipo de recuperação do tempo, isso implicaria que houvesse uma norma de segurança, que não tivesse um impacto orçamental. O problema foi ter-se metido numa discussão que não era sua. Quem criou o problema foi o PS, no Governo Sócrates, e continuou a mantê-lo neste Governo. Quem prometeu aos professores o que não cumpriu foi o primeiro-ministro, foi esta maioria de esquerda e de alguma forma o PSD, ao permitir-se abrir espaço para o primeiro-ministro fazer uma estratégia que, em tempos, classifiquei de manhosa. Envolveu o PSD numa teia que acaba por ficar como responsável por algo em que não tem responsabilidade, foi uma armadilha em que o PSD caiu.

O PSD foi inábil?
Sem dúvida.

Rui Rio foi inábil? Deixou-se enredar na teia?
Não gosto de pessoalizar. O dr. Rui Rio vai ser candidato a primeiro-ministro, temos o dever de, dentro do PSD, criar condições para ele vencer as eleições.

Mas faz sentido, que depois deste resultado das europeias, destes erros de posicionamento que apontou, que Rio continue até às legislativas e seja candidato a primeiro-ministro?
Tenho uma opinião pessoal que, se calhar, teria sido útil haver um refrescamento do partido, mas é o dr. Rui Rio que está, é ele que quer continuar e, portanto, vamos em frente.

Isso significa que Rui Rio devia ter colocado o seu lugar à disposição depois deste mau resultado para o PSD?
Não queria dizer muito mais do que isto. Um refrescamento teria sido...o PSD precisa de ter um golpe de alma para as próximas eleições. Ele pode ser obtido de várias maneiras. Ou por uma atitude do líder ou por um programa altamente reformista que conduza o debate nas próximas legislativas em volta desse programa. Depois de termos tido um governo que durante anos não fez uma reforma, ter um partido que não apresente um programa profundamente reformista será outra vez uma desilusão para os portugueses. E isso tem um risco eleitoral.

Rio pode ser o porta-voz desta alternativa que o PSD precisa de apresentar ao eleitorado? Disse que ele merecia uma oportunidade nestas eleições e falhou.
Acho que é um bocado redutor dizer que ele falhou, há vários fatores que se associaram para que isso sucedesse. O PSD precisa de apresentar um programa reformista e o líder do partido precisa de dar sinais de unidade interna e isso constrói-se.

Isso vai acontecer nos próximos meses quando há listas de deputados para fazer e a direção considera que esta bancada lhe é hostil?
Tem de perguntar ao dr. Rui Rio. O dr. Passos Coelho foi eleito líder, tinha uma bancada escolhida pela dra. Ferreira Leite e chegou a primeiro-ministro. É tudo uma questão de arte e tolerância e bom senso.

Rio tem tolerância e bom senso?
Não sei.

Mas conhece-o.
Espero que tenha. Julgo que é uma pessoa moderada, no essencial, às vezes sobressaem aspetos da personalidade dele que nem sempre o retratam.

Vê um vazio de propostas?
Vejo nós a fazermos votações mais alinhadas com a esquerda populista em algumas coisas. Sobre os elogios ao SIRESP, espero que tudo corra bem, mas se falhar o sistema, não sei qual é o discurso que o PSD poderá ter a seguir, depois do que disse o líder.

Se o PS não tiver maioria absoluta e se não conseguir fazer maioria com a esquerda, acha que o PSD deve viabilizar o Governo de António Costa e tentar fazer as reformas de que Rio tanto fala?
Neste momento, o dr. António Costa está a construir mais uma maioria negativa, própria do PS, assente nesta ideia: libertem-me destes malandros do Bloco de Esquerda e do PCP que me estão a obrigar a fazer coisas que eu nem desejo e que me empurram para soluções governativas que estou escandalizado que me obriguem a tomar. A maioria absoluta das eleições dependerá muito da capacidade que ele tiver de vender à opinião pública que precisa de se livrar do BE e PCP. Aparentemente as pessoas começam a acreditar nisso. As pessoas têm que avaliar se aquilo que ganharam em rendimentos, em aumento de salários e pensões, não lhes foi tirado em impostos indiretos e, mais do que isso, se não lhes foi tirado em qualidade de serviços públicos e se não tiveram de ir ao sector privado.

Essa é a avaliação nas urnas, mas as sondagens indicam é que Costa está a passar a sua mensagem. Acha que Rio tem vontade de, no caso de o PS não ter maioria, dar a António Costa as condições para ele ser “resgatado” dos partidos mais à esquerda?
Não tenho por hábito discutir cenários. Queria antes discutir o que o partido poderá fazer para vencer as eleições.

O que deverá fazer então?
Apresentar um programa reformista.

O que é que está a falhar na direção? Não conhecemos propostas.
Não está a falhar na justa medida em que haverá uma oportunidade, ainda durante o mês de Julho, para apresentar o programa eleitoral. É preciso o líder do partido ter intervenção mais regulares no plano público e, acima de tudo, começar a fazer valer os pontos de vista do partido naquela que é a sua visão estratégica para o país e não comentar estritamente as decisões ou meramente as opiniões que o PS e o Governo vai lançando para tentar testar a opinião pública. Procurar marcar a agenda.

Chegou a admitir a possibilidade de ser candidato à liderança do PSD. Essa hipótese está afastada, mantém-se? Podemos ler esta saída da via parlamentar como uma forma de voltar mais tarde?
Não faço futurologia. Neste momento não tenho nenhum projeto nesse sentido, não posso responder só ‘se Cristo vier à terra’ porque pelos vistos veio e não queria correr esse risco.

E o dr. Passos Coelho? Há menos de um ano disse que fazia muita falta ao país e esperava que ele voltasse? Ainda espera?
Reafirmo completamente. Um primeiro-ministro que teve a capacidade de liderar um país em circunstâncias tão difíceis, que o fez com dignidade exemplar, respeitando adversários, construindo uma base sólida entre dois partidos para governar o país e dando a volta por cima, acho que não pode ser desconsiderado para o futuro.

Para ser de novo primeiro-ministro?
Não me cabe a mim referir o que deve ou não fazer.

Onde é que o vê?
Onde ele se sentir feliz e onde for mais útil ao país.

Ou sem São Bento ou Belém.
É uma decisão pessoal dele, o país não deve prescindir de uma personalidade como ele.

Luís Montenegro ou Carlos Moedas?
[risos] São dois militantes do PSD que considero e respeito.

São dois candidatos à liderança do PSD.
Estão empenhados no trabalho de ajudar esta liderança a vencer as próximas legislativas. Dr. Luís Montenegro fez um trabalho notável como líder parlamentar. Carlos Moedas foi um comissário elogiado por todas as frentes. Gostava de acrescentar mais duas personalidades: Jorge Moreira da Silva e Miguel Pinto Luz.

E o Pedro Duarte?
O dr. Pedro Duarte está a tentar contribuir com algumas ideias apenas. Tenho pena que o programa que ele apresentou não tenha sobressaído nenhuma ideia, vi a presença de dr. Luís Montenegro foi a grande questão. Tenho pena que se tenha perdido a oportunidade de conhecer essas ideias.

E os outros quatro nomes?
São nomes que, sem dúvida, precisam de estar na vanguarda do trabalho político do nosso partido. Precisam de ser consideradas, que revelam vontade de querer estar nesse trabalho.

E Miguel Morgado também é uma voz a considerar?
Habituei-me a vê-lo como pensador ativo e alguém que tem sobre todos os temas uma atitude bastante avaliativa, crítica, e que pondera, todos os assuntos com grande atenção. É uma pessoa que será sempre útil no âmbito de um projeto.

Acha que a direita está em crise como diz o Presidente da República, ou é o regime que está em crise?
Aí concordo com o presidente do PSD: Há sinais de que o regime está em crise. O Parlamento está hoje completamente anacrónico, sob o ponto de vista organizativo, não faz sentido nenhum termos três sessões plenárias semanais, não servem para absolutamente nada. O que deveria existir é uma valorização dos trabalhos das comissões para que houvesse uma fiscalização mais atenta, mais efectiva. A forma, as condições de trabalho dos deputados têm de ser alteradas, mas também reduzir o número de deputados não vem daí mal ao mundo, pelo contrário.

E contar com os votos brancos e nulos para ter cadeiras vazias?
Isso discordo. É uma forma do dr. Rio chamar a atenção para uma coisa simples: há um problema grave de forma de participação democrática, os portugueses ou os europeus estão a afastar-se do processo democrático e isto prova que há um problema de regime. Quando o Presidente da República faz apelos tão fortes para a participação na votação e a seguir há aquela abstenção estrondosa tem de perceber que há um problema de regime.

Há uma dessintonia entre os partidos e a sociedade na forma como veem a forma de funcionamento do Parlamento?
Os partidos mais pequenos querem manter este modelo. O PSD e o PS precisavam de se entender para fazer esta reforma. Os partidos pequenos não desejam que a reforma aconteça porque a inexistência daqueles debates no plenário, de alguma forma, retira-lhes visibilidade.

Agora que a comissão de inquérito a Tancos chegou ao fim as conclusões foram satisfatórias?
Não quero fazer essa avaliação. Depois da comissão de inquérito não foi possível provar algumas coisas mas ficámos com a nítida sensação de que algumas coisas se passaram no plano político e não se deveriam ter passado. Há falhas sistémicas que têm de ser corrigidas. Quando a secretária-geral do sistema de segurança Interna e o Sistema de Informações da República Portuguesa sabem do furto 24 horas depois pela comunicação social alguma coisa falhou na organização do Estado. Quando o Estado publica os concursos públicos para a construção de vedações para unidades que têm paióis e isto é publicado é um anúncio de que há um problema com as vedações é quase um convite...

Acha que o primeiro-ministro não sabia de nada?
A alteração das conclusões do relatório, a forma cuidadosa como foi alterado o parágrafo sobre a interferência política é suficientemente revelador de que há um sentimento de dúvida instalado na comissão de inquérito.

Qual é a sua perceção sobre o que o poder político soube e não soube sobre Tancos?
Ficámos todos com um sentimento: Se o Governo não soube deveria ter sabido, porque quando houve a comunicação do furto de armas o ministro da Defesa deveria ter tido a iniciativa de informar o primeiro-ministro, a ministra da Justiça e Administração Interna. Se o Governo sabia e escondeu é muito grave, se não sabia também é grave. Chegamos à conclusão que estamos numa insatisfação relativamente ao que se passou. O que deveria ter acontecido é o Governo ter sabido e ter colocado todos os recursos estavam ao seu alcance para tentar recuperar as armas, se não o fez é porque há aqui uma falha de competência. Quero prestar uma homenagem ao Presidente da República sobre a forma atenta, dedicada, próxima como sempre procurou garantir que se descobrisse a verdade material e que se desse prioridade à recuperação das armas.

Comentários
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  • José Joaquim Cruz Pinto
    21 jun, 2019 Ílhavo 04:39
    Não seria antes bem melhor que se pusessem todos ao fresco?
  • Cidadao
    20 jun, 2019 Lisboa 18:22
    Se não aparece rapidamente um programa de governo credivel e alternativo e pelo contrário, Rui Rio continua a enviar sinais que se contenta em ser o vice, num bloco central / centrão de interesses, o PSD vai levar outro capote nas Legislativas

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