26 jun, 2019 - 18:20 • Susana Madureira Martins
O telefonema de terça-feira entre o Presidente da República e a procuradora-geral da República (PGR) é visto como "normal" e "natural" pelo PSD e pelo PS, mas nas entrelinhas é visível um certo mal-estar pelo apoio que Marcelo Rebelo de Sousa deu à autonomia do Ministério Público (MP), precisamente na véspera da greve dos magistrados e numa altura em que o assunto está em discussão no Parlamento.
Questionado pela Renascença, o vice-presidente da bancada do PSD, Carlos Peixoto, diz que "os partidos com representação parlamentar são livres, estamos num Estado de direito, o Presidente emite a sua opinião e o Parlamento tem a sua capacidade de decisão, que não está minimamente manietada com a posição que foi manifestada pelo senhor Presidente da República".
Recado dado, fica outro. Se o Presidente da República "manifestou à senhora PGR a preocupação na manutenção da autonomia do MP, pois bem, essa é exatamente a preocupação do PSD", atira Peixoto, que acrescenta que essa é uma preocupação "de todos os partidos com representação parlamentar".
O deputado do PSD admite divergências com o Presidente, assumindo que a questão é "saber como é que se atinge essa autonomia e essa independência e nessa matéria o caminho que traça o PSD é um caminho diferente do que foi manifestado pelo senhor Presidente da República", mas, acrescenta Carlos Peixoto, "não há problema nenhum, o caminho é diferente".
Questionado se viu no telefonema de Marcelo uma ingerência nos trabalhos dos deputados, Carlos Peixoto garante que não, "de todo", acrescentando que não tem de achar este gesto do chefe de Estado "nem normal, nem anormal, é uma atitude, uma iniciativa do senhor Presidente da República que o PSD regista e respeita".
No PS a posição é muito semelhante à do PSD. O deputado socialista Jorge Lacão diz que o Parlamento "é um órgão de soberania que tem competência legislativa, tem, aliás, competência exclusiva nesta matéria, portanto, compete à Assembleia da República desempenhar bem o seu papel assegurando que o novo estatuto do Ministério Público seja um estatuto francamente melhorado em todas as suas dimensões". Portanto, ao parlamento o que é do parlamento, independentemente da posição do Presidente da República.
Jorge Lacão, que é também vice-presidente da Assembleia da República, considera "muito normal que o senhor Presidente da República exprima os seus pontos de vista junto das entidades que ele julgue pertinente em qualquer tempo e em qualquer modo, portanto sobre isso é apenas o resultado do normal desempenho do senhor Presidente".
Por isso, Jorge Lacão recusa falar do telefonema de Marcelo como uma ingerência nos trabalhos dos deputados, tendo em conta que "o senhor Presidente não se dirigiu à Assembleia da República" e que o empenho da bancada do PS é "contribuir para que a magistratura do MP e o MP como órgão essencial do sistema judiciário tenha condições para desempenhar cabalmente a sua função".
Quanto a um telefonema do Presidente à procuradora-geral da República, precisamente na véspera de uma greve convocada pelos magistrados do MP, Lacão responde apenas que "se houver alguma coincidência" não lhe "compete interpretá-la".