01 ago, 2019 - 15:38 • Lusa
O Bloco de Esquerda considerou esta quinta-feira inaceitável a visita a Portugal do Presidente do Brasil, defendendo que o Governo português a deve cancelar porque Jair Bolsonaro "não é bem-vindo" ao país e mostra "constante desrespeito" pela democracia.
Numa nota do Bloco a que a agência Lusa teve acesso, o partido começa por se referir a afirmações de Jair Bolsonaro "a propósito da morte do ativista estudantil e militante político Fernando Santa Cruz, dado como desaparecido em 1974, em plena ditadura militar naquele país".
"Sabendo-se que está em preparação uma visita oficial do presidente da República do Brasil a Portugal, prevista para o início de 2020, o Bloco de Esquerda considera que esta, a concretizar-se, sinalizaria ao povo irmão do Brasil que o governo português é conivente com o constante desrespeito à democracia demonstrado pelo atual governo", critica.
Por isso, os bloquistas consideram "inaceitável a realização desta visita", deixando claro que "Jair Bolsonaro não é bem-vindo a Portugal e o Ministério dos Negócios Estrangeiros deve cancelar a visita o quanto antes".
Em 19 de julho, em entrevista à Lusa, na cidade cabo-verdiana do Mindelo, o ministro das Relações Exteriores do Brasil, Ernesto Araújo, disse que o presidente brasileiro deverá visitar Portugal no início de 2020.
No comunicado enviado à Lusa o Bloco lembra: "Interpelando diretamente o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz, filho de Fernando Santa Cruz, Bolsonaro usou de ironia para dizer que 'um dia' contará ao presidente da OAB como o pai desapareceu 'no período militar', adiantando que Felipe Santa Cruz 'não vai querer saber a verdade'".
Depois, numa rede social, Bolsonaro afirmou que Fernando Santa Cruz não foi morto pelos militares, mas, sim, pela sua própria organização, a Ação Popular.
"As afirmações de Jair Bolsonaro causaram uma onda de indignação generalizada, até partilhada por muitos que o têm defendido e apoiado em outras ocasiões", apontam os bloquistas.
Perante estes factos, na perspetiva dos bloquistas, "os portugueses e o Governo não podem ficar indiferentes face a um presidente que, como diz nota da OAB, parece ignorar os fundamentos do Estado Democrático de Direito, entre eles 'a dignidade da pessoa humana, na qual se inclui o direito ao respeito da memória dos mortos'".
"O Bloco de Esquerda recorda ainda que este é apenas o episódio mais recente envolvendo um governo que tem sido marcado pelo desrespeito às comunidades indígenas, pelo aumento descomunal do desmatamento da Amazónia, pelos ataques à Educação e aos direitos dos trabalhadores", elenca ainda.
Santos Silva desvaloriza
Questionado esta tarde, à saída do Conselho de Ministros, sobre esta posição do Bloco de Esquerda, Augusto Santos Silva preferiu desvalorizar, dizendo que não é possível cancelar uma coisa que ainda não foi programada. Em todo o caso, Santos Silva deixou claro que, a confirmar-se a vinda de Bolsonaro a Portugal em 2020, o Governo não pretende levantar qualquer obstáculo.
"O meu comentário é muito simples. Não consigo cancelar viagens que não estão programadas", disse o Ministro, explicando depois que "Portugal e o Brasil têm cimeiras, que são lideradas pelos respetivos chefes de Executivo, o que no caso português é o primeiro-ministro e no caso brasileiro, sendo um regime presidencialista, é o Presidente da República. Essas cimeiras deviam anuais. Por uma sucessão de desencontros, por razões de calendário eleitoral, só conseguimos realizar neste mandato uma cimeira, que se realizou em Brasília, entre os dois chefes de executivo e as suas delegações."
Os dois países estão agora a trabalhar para que o próximo encontro se realize em Portugal em 2020. "Daí a poder dizer-se que está a ser programada uma viagem do Presidente Bolsonaro a Portugal, e que o Governo português já, passando ao lado da questão se o podia fazer, dever cancelar uma visita que não está ainda em preparação, vai uma grande distância", disse Santos Silva.
Questionado diretamente sobre se será bem-vindo, caso a viagem se realize de facto, o ministro foi claro. "Todos os chefes de Estado e de Governo com quem Portugal tem relações diplomáticas sabem que serão tratados em Portugal, e que Portugal os trata nos seguintes países, de acordo com o que é determinado pelas leis internacionais e pelos códigos diplomáticos".