20 set, 2019 - 18:06 • Redação
O primeiro-ministro homologou o parecer do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República (PGR) sobre incompatibilidades e impedimentos de titulares de cargos políticos.
O parecer, segundo o comunicado divulgado pelo gabinete de António Costa, recusa uma "interpretação estritamente literal" - e até inconstitucional - das normas jurídicas, dando razão à posição do Governo de António Costa
"As normas jurídicas não podem ser interpretadas de forma estritamente literal, devendo atender-se aos demais critérios de interpretação jurídica, entre os quais avulta a determinação da vontade do legislador", refere a nota.
"O primeiro-ministro decidiu homologar o parecer em questão, que assim passa a valer como interpretação oficial por parte dos serviços da administração pública", adianta o Governo.
Em relação à lei das incompatibilidades, o executivo considera que é importante distinguir quando está em causa o próprio titular de cargo político ou a empresa que detém em percentagem superior a 10%, e quando se trata de negócios de uma familiar deste.
"Na primeira situação, relativa a contratos celebrados com o próprio titular de cargo político ou com empresa por si participada, o impedimento deve ser interpretado e aplicado nos termos que constam da letra da lei", sublinha o gabinete do primeiro-ministro.
Relativamente aos contratos de celebrados com familiares do titular de cargo político ou com empresas por eles participadas, "deve entender-se que o impedimento não abrange os contratos celebrados com toda e qualquer entidade pública, mas apenas os contratos celebrados com entidades que estão sob algum tipo de dependência face ao titular de cargo político".
De acordo com o parecer citado pelo Governo, "uma interpretação meramente literal da norma seria, aliás, inconstitucional, por violação do princípio da proporcionalidade, designadamente nas vertentes da necessidade e do equilíbrio".
O Conselho Consultivo da PGR, adianta o executivo, considera que, “ao onerar os familiares do titular e as empresas por aqueles constituídas com o pesado fardo desses impedimentos, o legislador não curou de assegurar, de modo direto e cabal, mas apenas por modo ínvio e desnecessário, os fins que pretendia atingir".
O parecer refere, ainda, que "a sanção prevista na lei para este tipo de casos (demissão) é política e objetiva, mas não é de aplicação automática, carecendo a sua aplicação de um procedimento que assegure, pelo menos, os direitos de audiência e de contraditório".
Sendo assim não são abrangidos por incompatibilidades ou impedimentos, ou seja, não há motivo para demissão, relativamente aos casos que envolvem a empresa do filho do ex-secretário de Estado da Proteção Civil ou a do pai do ministro das infraestruturas, Pedro Nuno Santos, que estiveram na base do pedido de parecer à Procuradoria. Isto porque os concursos públicos em causa foram abertos e passaram para outros órgãos do Estado situadas fora da esfera de ação de ambos os governantes e foram cumpridas escrupulosamente todas as formalidades.
Transparência e Integridade exige divulgação do parecer na íntegra
Numa primeira reação, a associação Transparência e Integridade (TI-PT) pede ao primeiro-ministro que divulgue, na íntegra, o parecer no Conselho Consultivo da PGR.
A TI-PT anuncia, em comunicado, escreveu uma carta a António Costa pedindo-lhe que “de imediato, publique na íntegra, na página web do Governo, o parecer do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República” sobre as incompatibilidades de vários membros do Governo face aos negócios feitos com o Estado por familiares desses governantes.
“Ao pedir o parecer à Procuradoria, o primeiro-ministro acabou por interromper uma discussão pública que estava em curso sobre as regras de incompatibilidades e, mais importante, sobre a eficácia com que são aplicados os mecanismos de controlo aos titulares de cargos públicos. Agora que o parecer já chegou é imprescindível e urgente que seja publicado, para que o país possa retomar esta discussão pública essencial para a nossa democracia”, refere o presidente da Transparência e Integridade, João Paulo Batalha.
O parecer foi pedido em 30 de julho por António Costa ao Conselho Consultivo da PGR, após a polémica sobre negócios entre governantes e empresas de familiares, que ficou conhecida como 'family gate'.
O primeiro-ministro pediu então uma opinião ao Conselho Consultivo da PGR para "completo esclarecimento" sobre os impedimentos de empresas em que familiares de titulares de cargos políticos tenham participação superior a 10% do capital.
[notícia atualizada às 19h22]