29 fev, 2020 - 20:00 • Redação
A coordenadora do Bloco de Esquerda (BE), Catarina Martins, defendeu este sábado que a preparação para um surto como o do Covid-19 “é uma prova” de que Portugal precisa de um Serviço Nacional de Saúde (SNS) “público e forte”.
No encerramento do Encontro Nacional de Saúde do partido, em Lisboa, Catarina Martins disse ter ouvido “vezes de mais” quem defenda que “não interessa” se a gestão da saúde “é pública ou privada”. “No momento em que o país se prepara, como o resto do mundo, para uma epidemia, aqueles que andaram a atacar sempre os hospitais públicos e que até defenderam que deviam ser privatizados, esses mesmo não vão exigir nada aos hospitais privados, vão exigir tudo aos hospitais públicos”, afirmou.
“Se alguém precisava de uma prova de que precisamos, sim, de um SNS público forte, ela aqui está, porque é de quem dependemos”, acrescentou.
A coordenadora do BE alertou que nem os seguros privados cobrirão despesas relacionadas com novos vírus nem as contratualizações dos hospitais privados com o Estado preveem situações como as do Covid-19. “Quem é que estará sempre e terá de estar sempre preparado para todas as circunstâncias? O SNS público forte, se não for forte vamos dizer que contratualizamos com privados, mas nada acontece, ou deixaremos a população sozinha, indefesa à espera que seguros e hospitais privados resolvam o que nunca vão resolver”, criticou.
A coordenadora do BE aproveitou para elogiar a atuação dos profissionais de saúde e da Direção-Geral da Saúde durante este surto, considerando que tem existido “uma enorme serenidade e informação importante à população”. “Significa que temos um SNS para responder às necessidades das pessoas, tenhamos também exigência de lhe dar todos os meios de que ele precisa para responder da melhor forma”, apelou.
Catarina Martins admitiu que o SNS “pode estar fragilizado, pode estar sob fortes ataques”, mas continua a ser reconhecido pela população “como um dos serviços em que deposita a maior confiança”.
Melo ignora apelos da DGS e diz que "aos que regressam de zonas de risco é dito para irem direto" para o hospital
Também este sábado, mas via Twitter, o eurodeputado do CDS Nuno Melo apostou, por sua vez, em criticar o Serviço Nacional de Saúde, referindo que “os profissionais não têm máscaras disponíveis nos hospitais, não lhes é dada qualquer formação específica, não têm materiais de desinfeção para si e de superfícies”.
E acrescenta, na publicação: “Aos que regressam de zonas de risco é dito para irem direto para os hospitais”.
A informação avançada pelo eurodeputado centrista é, porém, falsa. Na sexta-feira, por exemplo, a diretora-geral da Saúde, Graça Freitas, apelou publicamente a quem regressasse de Itália ou restantes áreas afetadas pelo novo coronavírus, e que não apresentem sintomas de infeção, para não se deslocar aos serviços de urgência.
Em caso de início súbito de tosse, febre ou dificuldade respiratória, devem ligar para o SNS 24 e evitar permanecer em espaços confinados e com muitas pessoas, disse ainda Graça Freitas.
Também na sexta-feira, a ministra da Saúde, Marta Temido, garantiu que os hospitais se encontram a reforçar em 20% as reservas de medicamentos e de outro material clínico de proteção individual considerado essencial para travar o novo coronavírus.
Ao mesmo tempo, o Governo também já aumentou o número de hospitais preparados para lidar com o Covid-19. "Temos já 10 hospitais preparados para entrar, se for necessário, em modo de acolhimento de doentes, e temos mais capacidade laboratorial para responder àquilo que neste momento é a situação que já temos: o maior número de casos a surgir de hora a hora, para serem validados”, referiu Marta Temido.
Acusado por outros utilizadores no Twitter de mentir, Nuno Melo contra-atacou: “É exatamente como digo. Sei exatamente o que digo. E quem diga o contrário deve viver noutro mundo.” No entanto, quando instado a divulgar as suas fontes, Nuno Melo respondeu vagamente. “Fonte: médicos e outros profissionais de saúde. Hospitais: vários. Sector: público.”
Em Portugal, os 59 casos suspeitos que fizeram testes nos hospitais deram todos negativos de coronavírus, que dá origem à doença Covid-19. A DGS manteve na sexta-feira o risco da epidemia para a saúde pública em “moderado a elevado”. A diretora-geral da Saúde admite, este sábado, em entrevista ao Expresso, que Portugal pode vir a ter um milhão de infetados.
Federação dos Médicos reconhece competência à DGS, mas denuncia algumas carências
A Federação Nacional dos Médicos (FNAM) exigiu hoje “medidas sérias” para proteger profissionais de saúde e utentes face à epidemia de coronavírus que teve origem na China e já matou três mil pessoas em todo o mundo. A FNAM acrescenta, em comunicado, que este tem sido um assunto de “grande preocupação” que tem acompanhado de perto e denuncia algumas carências no Serviço Nacional de Saúde.
A federação afirma ter conhecimento de “situações preocupantes”, como várias unidades de saúde com insuficiência de equipamentos de proteção, quer para utentes, quer para profissionais, bem como falta de salas de isolamento onde os doentes possam ser acomodados e observados com segurança. Segundo a FNAM, a linha de apoio médico “tem um longo tempo de espera para atendimento” e “as unidades de saúde que têm um Plano de Contingência adaptado a este novo agente infecioso são a exceção”.
“Este é o tipo de problema para o qual a FNAM dispensa o aproveitamento político e alarme social”, afirma, reconhecendo a competência técnica da Direção-Geral de Saúde (DGS) e a sua função de Autoridade de Saúde Nacional. “É de primordial importância reconhecer que o cumprimento dos pressupostos estabelecidos nas Orientações Técnicas da DGS tem que ser aplicado por recursos técnicos e humanos em número adequado”, afirma, sublinhando, contudo, que, “como é do conhecimento geral, os serviços de saúde funcionam no limiar da sua capacidade”.
Para os médicos, que trabalham diariamente num Serviço Nacional de Saúde “com graves carências, coloca-se a dúvida sobre a capacidade instalada para lidar com um eventual aumento extraordinário da procura de cuidados e que envolve particulares condições de segurança”, adverte a federação.
Face à exposição que os médicos têm na linha da frente no combate à epidemia, a FNAM “exige que sejam tomadas todas as medidas de segurança necessárias para proteger a saúde dos médicos, dos restantes profissionais de saúde e das suas famílias”.