31 mar, 2021 - 15:49 • Redação
As três leis aprovadas na Assembleia da República sobre novos apoios sociais extraordinários "violam a Constituição" porque aumentam a despesa fixada no Orçamento do Estado, afirma o primeiro-ministro.
Numa declaração ao país, António Costa anunciou que vai enviar para o Tribunal Constitucional e pedir a fiscalização sucessiva dos diplomas com novos apoios sociais que a oposição aprovou no Parlamento e o Presidente da República promulgou.
O primeiro-ministro desdramatiza a decisão e considera que "não há nenhum conflito" com Marcelo Rebelo de Sousa ou com a Assembleia da República, mas defende que é preciso travar um "precedente" que poderia ser grave para as finanças públicas.
"A nossa Constituição é muito clara na repartição de poderes: o Parlamento é soberano na aprovação do Orçamento do Estado e o Governo é totalmente responsável pela implementação do Orçamento”, declarou o chefe do Governo.
"A Assembleia da República não pode aumentar despesa e diminuir receita prevista no Orçamento que aprovou", afirma António Costa, numa referência à "lei travão".
O primeiro-ministro coloca fora de causa que os beneficiários tenham de devolver qualquer apoio se a decisão dos juízes for a de declarar inconstitucionais os diplomas. António Costa refere que a prática do Tribunal Constitucional é a de restringir os efeitos da declaração de inconstitucionalidade.
Questionado se esta decisão de pedir a constitucionalidade dos três diplomas inibe futuras negociações à esquerda, o chefe do Governo garante que não.
Nesta declaração ao país a partir dos jardins da residência oficial, o primeiro-ministro utilizou palavras de Marcelo Rebelo de Sousa para justificar a decisão de remeter os apoios sociais para o Tribunal Constitucional.
“O senhor Presidente da República procurou limitar os danos constitucionais destas leis, ao propor uma interpretação que esvazia o seu efeito prático e até reforçar os poderes do Governo ao entender, e cito: ‘que os diplomas podem ser aplicados na medida em que respeitem os limites resultados do Orçamento do Estado vigente’. Ainda assim, e apesar do esforço do senhor Presidente da República, subsistem questões para resolver”, afirmou.
"Primeiro, o Governo não pode deixar de cumprir uma lei da Assembleia da República enquanto esta vigorar, mesmo que a entenda inconstitucional e só o Tribunal Constitucional pode declarar, com força obrigatória geral, a inconstitucionalidade de uma lei."
Apoios Sociais
Executivo diz que leis aprovadas no Parlamento vio(...)
"Segundo, os cidadãos beneficiários têm o direito de saber com o que podem contar. Se com o que a Assembleia da República aprovou, se com o que o Governo viesse a limitar na sua interpretação."
"Terceiro, não se alcança forma justa de reconduzir estas leis parlamentares aos limites orçamentais. Como iriamos aplicar esse limite? Dando apoios a uns e negando a outros? Dando apoios apenas aos que fossem mais rápidos a pedir, até se esgotar o plafond previsto no Orçamento e recusando todos os pedidos posteriores? Ou reduzindo o montante do apoio pago a todos, violando assim o disposto na lei da Assembleia da República."
"Quarto, é perigoso que se forme um precedente que abra a porta para o receio expresso pelo senhor Presidente da República e que volto a citar: ‘de a prática parlamentar passar a ser de constante desfiguração do Orçamento do Estado’”, frisou António Costa.
O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, decidiu promulgar três leis aprovadas pela oposição, no Parlamento, que o Governo queria que Marcelo Rebelo de Sousa vetasse ou enviasse para o Tribunal Constitucional. Em causa estão alargamentos de apoios sociais para famílias e trabalhadores independentes.
A decisão do Presidente foi anunciada no domingo à tarde, através do site da Presidência da República, onde Marcelo publicou uma extensa justificação para a sua decisão, que contraria a vontade do Governo. E que aproveita para também enviar recados políticos sobre a necessidade de cumprimento da legislatura e de diálogo e consenso perante a crise pandémica.
Depois da promulgação dos diplomas, o ministro das Finanças, João Leão, afirmou, na terça-feira, que a decisão do Presidente da República de promulgar as medidas de apoios sociais urgentes é inconstitucional e abre um precedente "muito grave".
Em declarações à RTP3, João Leão reiterou que a decisão de Marcelo Rebelo de Sousa aumenta a despesa do Estado em 40 milhões de euros por mês e sublinhou que "o que está em causa neste alargamento não é a bondade da medida em concreto, mas o princípio do que foi seguido".