06 abr, 2021 - 17:04 • Lusa
O Bloco de Esquerda desafia o Governo a fazer refletir no contrato da venda do Novo Banco as novas regras do Banco Central Europeu (BCE) sobre rácios de capital e recusar qualquer injeção na instituição este ano.
Em conferência de imprensa no parlamento, a dirigente e deputada do BE Mariana Mortágua explicou que, em 2020, devido à pandemia de covid-19 o BCE "alterou as regras prudenciais aplicadas a todos os bancos da União Bancária".
"De acordo com as nossas estimativas, o rácio regulamentar exigível ao Novo Banco é neste momento de 8,25%, ao contrário de anos anteriores em que o BCE exigia valores próximos de 12%", apontou.
Segundo Mariana Mortágua, à luz destas novas regras, o Novo Banco "já cumpre os rácios de capital e ainda fica com uma almofada de quase 500 milhões de euros", sem qualquer injeção por parte do Estado.
No entanto, o contrato de venda do Novo Banco à Lone Star pelo Fundo de Resolução diz que o Estado tem de assegurar rácios de 12%, o que implicaria uma injeção de quase 600 milhões de euros, explicou.
"O que entendemos é que o Governo deve impor à Lone Sstar que as novas regras do BCE em termos de capital sejam refletidas no contrato do Novo Banco e não exista qualquer injeção de capital em 2020", defendeu.
Instituição refere que os resultados foram agravad(...)
A deputada reiterou que, devido à alteração das regras pelo BCE, a instituição já tem uma almofada de 500 milhões de euros, "que subiria para mil milhões de euros se uma nova injeção fosse feita nos termos exigidos pelo Novo Banco".
"Não achamos que se justifique que os contribuintes continuem a suportar exigências de 12%, sobrecapitalizando o Novo Banco acima do necessário", defendeu.
Questionada se o Governo pode fazer essa alteração de forma unilateral, a deputada do BE defendeu que "o Estado deve comunicar essa decisão à Lonestar, tem o poder para o fazer", salientando que a pandemia de covid-19 alterou vários tipos de contrato.
"Entendemos que o Governo deve comunicar a Lone Star que as novas regras devem refletir-se imediatamente no contrato e que esta injeção não faz qualquer sentido à luz das regras atualmente existentes", defendeu.
Em 26 de março, o Novo Banco anunciou que iria pedir mais 598,3 milhões de euros ao Fundo de Resolução ao abrigo do Mecanismo de Capital Contingente (MCC), para fazer face aos prejuízos de 1.329,3 milhões de euros reportados, relativos a 2020.
No entanto, quer o Ministério das Finanças quer o primeiro-ministro, António Costa, consideraram na altura que o pedido de capital do Novo Banco ao Fundo de Resolução "manifestamente ultrapassa" aquilo que se avalia ser devido.
Na conferência de imprensa de hoje, Mariana Mortágua reiterou que o BE "sempre denunciou o caráter ruinoso" do contrato de venda do Novo Banco, mas salvaguardou que, no problema hoje levantado, "não estão em causa questões técnicas nem a administração do Novo Banco", matérias que estão a ser tratadas numa auditoria independente e na comissão parlamentar de inquérito.
"O que está em causa é que o Estado pode vir a sobrecapitalizar o Novo Banco em 598 milhões de euros, dinheiro de que o banco já não precisa para cumprir rácios de capital (...) e quando temos notícias de que o Novo Banco se prepara para adquirir o banco Eurobic numa operação de mercado", acrescentou.
Para a deputada, seria "uma ironia" o Estado estar a recapitalizar uma instituição bancária para que esta pudesse comprar outra.
De acordo com o Jornal de Negócios, o interesse do Novo Banco no EuroBic - terá sido um dos cinco concorrentes que levantaram o caderno de encargos para a compra - está a gerar desconforto na banca, numa altura em que o Governo está a negociar com o setor um financiamento ao Fundo de Resolução para injetar no banco liderado por António Ramalho.
Desde 2017, o Fundo de Resolução já meteu 2.976 milhões de euros no Novo Banco, dos quais 2.130 milhões vindos de empréstimos do Tesouro (como o fundo não tem dinheiro suficiente, todos os anos pede dinheiro ao Estado, que devolverá em 30 anos).
No total, até ao momento, os custos do Fundo de Resolução com o Novo Banco já totalizam 7.876 milhões de euros (4.900 milhões de euros da capitalização inicial, em 2014, e 2.976 milhões ao abrigo do mecanismo contingente desde 2017) e mais encargos se poderão somar quer para o fundo quer diretamente para o Estado, muitos dos quais impossíveis de quantificar (indemnizações por processos em tribunal, pagamentos a credores do BES, garantias a lesados, entre outros).