22 mai, 2021 - 22:18 • Paula Caeiro Varela
Ser ou não ser. A questão coloca-se talvez desde sempre ao Bloco de Esquerda, mas há uma linha que divide partidos como nenhuma outra: querem ou não alcandorar-se no galho mais alto do poder? Ser ou não ser oposição apenas, crítica e feroz, oposição ao governo, ser ou não ser parte da solução, ser ou não ser parte do governo?
O Bloco quer e sabe, mesmo que se parta todo nesse caminho, porque o Bloco sabe que quer, mas tem vergonha, sabe que quer, mas não sabe ainda muito bem como vai fazer.
Por isso, Catarina Martins veio prestar contas atirando pedras: a coordenadora nacional chegou debaixo de críticas sobre falta de democracia interna, mas nem perdeu dois minutos a responder, desviou para "o Bloco é um dos partidos mais democráticos, mas claro que podemos fazer melhor". Próximo!
O discurso de abertura da 12ª convenção não foi bem sobre o Bloco, foi sobre o PS: o que o Partido Socialista fez em 2019 quando rejeitou acordos para uma legislatura, o que não fez com o Orçamento de 2020, o que não fez com as propostas do Bloco.
Se o Bloco não aprovou o orçamento seguinte, a culpa foi do PS, se faltaram milhões às medidas contra a crise, a culpa é do PS. Ah! e se o PS fecha a porta, o Bloco não se importa e até promete que vai abrir outra. No fundo, não escancara, mas avisa que está aqui, pronto para receber o abraço amigo, se o amigo quiser voltar para estes braços: "Não temos estados de alma, não ficamos zangados pelo facto de o PS ter fechado a porta uma solução de estabilidade para quatro anos. É a sua escolha, nós abriremos outra porta". Toma lá colchetes d`oiro.
Num pavilhão com delegados de lugares marcados no chão, de máscaras e regras sanitárias, os que se distanciam não se calaram. A moção E subiu ao palco de Matosinhos para contestar as regras da tomada de decisão interna e tocando com o dedo na ferida que mais arde à atual direção: o estilo de negociação no Orçamento do Estado do ano passado "só serviu o PS". Ouch.
Foram mesmo muitas críticas e só podem ter doído: houve quem subisse ao palco atacando a direção porque luta no Parlamento pelas 35 horas de trabalho, mas promove "em casa" a jornada de 40 horas semanais, houve pedidos de inversão de caminho na estratégia local sob pena de perderem o lugar de terceira força política, condição que foi várias vezes invocada. E até houve acusações de estalinismo. Pumba!
Enfim veio Francisco Louçã falar sobre o sonho, que acalenta há anos: "quando a Mariana for ministra das Finanças...", disse ele, "as finanças deixam de ser o porquinho mealheiro do Novo Banco". ALERTA DE SOUNDBITE! Mas igualmente importante: enquanto for esta a força do Bloco, já sabemos que a direita não volta ao poder. É a Catarina Martins que o devem, disse.
O Bloco já não é só protesto, nem quer ser. Pode nem sempre assumir isso, pode não saber como se faz, ainda. Essa será a luta toda que tem pela frente.