24 set, 2021 - 16:10 • Rosário Silva
Aos 37 anos, Ana Moisão assume que está a viver um dos maiores desafios da sua vida. É candidata pelo Chega à presidência da Câmara de Serpa, o maior “bastião” comunista do distrito de Beja.
“Não tem sido tarefa nada fácil, mas a grande vitória foi termos conseguido fechar seis listas, com pessoas e projetos válidos, num concelho onde há 47 anos o PCP ganha com maioria, por isso, foi uma grande vitória, para nós, um partido jovem”, confessa à Renascença a também vice-presidente da distrital de Beja do Chega, que concorre, nestas autárquicas, a oito dos 14 municípios do baixo Alentejo.
Natural de Pias, no concelho de Serpa, viveu seis anos na Suíça, tendo regressado à terra para abraçar, na área profissional, a tarefa de relações públicas na adega de um produtor local de vinhos.
A falta de emprego é, de resto, um dos problemas que elege, numa região onde a perda de população, sobretudo jovem, afigura um futuro incerto.
“Cada concelho tem a sua realidade, a de Odemira é diferente, por exemplo, da de Serpa, mas há um problema comum a todos os concelhos do distrito de Beja, que é a perda da nossa população”, afirma Ana Moisão, considerando “urgente estancar esta situação”.
“É inadmissível, por exemplo, termos nos nossos dias, em aldeias ou freguesias, centros de saúde a funcionarem dentro de cafés e centros de saúde a funcionar uma vez por semana. Nós não podemos aceitar ser este país real de terceiro mundo, pois nós não somos um país de terceiro mundo”, refere, segura.
É para contrariar esta e outras situações “degradantes”, que concorre ao município alentejano, comandado pelo Partido Comunista há mais de 40 anos. “Sabemos que somos um partido jovem, de direita, num distrito marcadamente de esquerda, mas queremos que as pessoas conheçam as nossas propostas e saibam que temos soluções e que não vamos largar o Governo central”, assegura.
Licenciada em Geografia e Planeamento Regional, acredita que as eleições de domingo “vão trazer, no Alentejo, excelentes resultados para o Chega.”
A esta convicção não são alheios os resultados das eleições presidenciais de janeiro último, com o partido a registar uma subida exponencial, comparativamente com as legislativas de 2019. O Alentejo foi a região que melhores resultados deu a André Ventura, com quatro freguesias nos distritos de Beja (2), Portalegre (1) e Évora (1) a darem-lhe, inclusive, a vitória.
Um voto na estratégia do partido ou de protesto e desencanto numa região esquecida pelos governantes? “Acho que pelas duas situações. Nas presidenciais, penso que foi o voto de protesto para dizer que estamos aqui, no Alentejo, e não nos podem esquecer. Nas autárquicas é diferente, funciona muito a pessoa que está, que é conhecida”, adianta a candidata, admitindo que ela própria, em eleições anteriores, votou “em pessoas que estão no Partido Comunista" porque acreditou "nos seus projetos”.
E nestas eleições? “Para estas eleições, acredito que não será apenas um voto de protesto, mas sim a vontade de votar noutras pessoas, com projetos diferentes, novas ideias, dar lugar a gente nova. É hora de dizer ‘basta’ à CDU”, diz Ana Moisão, uma das muitas mulheres que assumem, abertamente, o seu apoio ao Chega.
“Nós somos mais corajosas, lutadoras, penso que é um grito de revolta de nós mulheres, o que até contradiz um dos rótulos do partido que é o de ser um partido machista. É mais um desafio, além dos que já temos na vida privada”. A candidata é casada e tem um filho de seis anos.
Mas dizer ‘basta’ à CDU pode não ser assim tão fácil. Os militantes e apoiantes do Chega falam em “receio” e “represálias”, caso manifestem publicamente o seu apoio ao partido.
“Não é uma conversa de vitimização, estas ameaças existem mesmo”, garante a candidata à Renascença. “A maioria das pessoas no concelho de Serpa trabalha na autarquia, mesmo os que não trabalham têm alguém que lá está. Dizem-nos que estão connosco, mas não querem dar a cara por medo, daí a dificuldade em constituirmos as listas”.
À pergunta sobre a força deste partido quando não se quer dar a cara, André Ventura, na sua recente passagem pelo distrito de Beja, respondeu com “o voto silencioso”, de pessoas que dão apoio no privado, mas não em público.
“Não é vergonha”, garantiu o líder do Chega. As pessoas são ameaçadas e condicionadas. Aqui, especificamente no distrito de Beja, há pessoas ameaçadas e perseguidas por serem do Chega, há muitos candidatos e as famílias que são ameaçados e, por isso, percebo o seu receio”.
Apesar de tudo, o partido aposta no Alentejo, com o próprio Ventura a encabeçar a lista à Assembleia Municipal do concelho de Moura. “Queremos que as pessoas percebam que só há uma força de mudança. A CDU é o passado, e acreditamos que lhe vamos retirar votos, o PS é o mesmo e o Chega é o futuro. Não é um caminho de racismo, nem de extremismo, é um caminho para pôr as coisas no lugar”, referiu.