02 nov, 2021 - 23:21 • Lusa
O Sindicato dos Magistrados do Ministério Público (SMMP) defendeu esta terça-feira que os grupos parlamentares deverão "resistir à tentação de tentar aprovar à pressa" um conjunto de soluções legislativas anticorrupção "apenas com propósitos eleitoralistas e populistas".
"O SMMP entende que o pacote legislativo inserido no quadro da estratégia apresentada pelo Governo de combate à corrupção e as várias propostas legislativas já apresentadas pelos vários grupos parlamentares nesse âmbito é importante, mas, contudo, num quadro de dissolução da Assembleia da República iminente, os grupos parlamentares deverão resistir à tentação de tentar aprovar à pressa um conjunto de soluções legislativas apenas com propósitos eleitoralistas e populistas", referiu, à Lusa, o sindicato.
Reagindo ao anúncio do PS de que, relativamente ao pacote legislativo anticorrupção, deixa cair os acordos de sentença, em nome do consenso parlamentar com o PSD, que também quer ver aprovado o diploma, o SMMP lembra que "a pressa é inimiga da virtude" e que "uma legislatura termina, mas seguir-se-á outra".
Segundo o SMMP, presidido por Adão Carvalho, importa encontrar "um quadro legislativo adequado, harmonizador das várias soluções legislativas já existentes, que permita ao sistema de justiça responder de forma mais eficaz a este fenómeno criminoso (corrupção) com total respeito pelas garantias de defesa dos arguidos e que potencie o combate ao enriquecimento ilicitamente obtido através do exercício de funções públicas".
Considera assim o SMMP que, "se os partidos estão de acordo na necessidade de combater a corrupção, também manterão essa vontade numa nova legislatura".
Por seu lado, a Ordem dos Advogados (OA) congratulou-se com o anúncio do grupo parlamentar do PS que aceita retirar os acordos sobre sentenças do pacote legislativo anticorrupção em discussão na especialidade na AR.
"A OA congratula-se com o abandono da solução sobre os acordos sobre a pena aplicável, que previa a possibilidade de os tribunais passarem a negociar com os arguidos, não só as penas a que eles poderiam ser sujeitos, mas inclusivamente as condições do seu cumprimento, garantindo-lhes que ficavam fora da prisão", comentou à Lusa o bastonário da OA, Luís Menezes Leitão.
Luís Menezes Leitão salientou que a OA sempre considerou que a previsão dos acordos de sentença não era "a melhor forma de se garantir o respeito pelas leis e a punição dos infratores".
Nas palavras do bastonário, tal solução legislativa apresentava-se "até como violadora dos direitos dos arguidos", uma vez que estes podiam "ser coagidos a confessar crimes com a promessa de uma concreta pena, que até pode ser não privativa da liberdade, e com a ameaça de uma pena maior, que pode ser de prisão efetiva, se não confessarem".
Menezes Leitão alertou ainda que, se a "proposta vingasse, o processo penal português deixaria de assentar em julgamentos para passar a assentar em acordos, à semelhança do sistema norte-americano".
Por esse motivo - adiantou o bastonário - a OA considera que o combate à corrupção passa antes por um reforço dos meios de investigação criminal, e não por alterações da lei a subverter o processo penal português, transformando a punição criminal numa negociação de penas.
"Esta proposta absurda nunca deveria ter visto a luz do dia, e espera-se que o seu abandono permita que o combate à corrupção passe a focar-se no que é verdadeiramente relevante para que este grave crime seja eficazmente combatido", concluiu.